Art. 1º Fica permitida a reconversão de edificações tombadas ou preservadas, por meio da transformação de uso e/ou pelo desdobramento em unidades independentes, em condições especiais estabelecidas nesta Lei Complementar, desde que garantidas as condições de proteção e integridade do patrimônio cultural e aprovado pelo órgão de tutela e pelos demais órgãos competentes.
§ 1º Entende-se por reconversão de um imóvel tombado ou preservado o conjunto de intervenções arquitetônicas que vise a assegurar a manutenção de suas estruturas e elementos construtivos, assim como sua permanência na paisagem urbana e no ambiente cultural, por meio de uma nova função ou uso apropriado, de forma a promover sua reintegração à realidade social, cultural e econômica.
§ 2º A reconversão das edificações tombadas ou preservadas para o uso não residencial ou misto atenderá aos usos e atividades permitidas para a zona onde se encontra o imóvel, conforme o disposto na legislação de uso e ocupação do solo, observado o disposto no artigo 5º desta Lei Complementar.
Art. 2º Todas as obras de reconversão a serem realizadas em imóveis tombados ou preservados, para o uso residencial, permanente ou transitório, ou para atividades não residenciais, devem ser previamente aprovadas pelo órgão municipal responsável pela proteção do patrimônio cultural e pelos demais órgãos competentes.
§1º Para o licenciamento das obras de reconversão, de que trata o caput deste artigo, o requerente deverá obter o Certificado de Adequação de Transformação de Uso, a ser emitido pelo órgão municipal responsável pela proteção do patrimônio cultural.
§2º O Poder Executivo regulamentará os procedimentos para obtenção do Certificado de Adequação de Transformação de Uso.
CAPÍTULO I
Do Uso Residencial
Art. 3º Na reconversão de edificações tombadas ou preservadas, as transformações para o uso residencial permanente, uni ou multifamiliar, ou para o uso residencial transitório destinado a hospedagem, creche, orfanato, colônia de férias ou casa de repouso, sem serviços hospitalares, poderão ocorrer em qualquer tipo de edificação e em qualquer zona.
Parágrafo único. O uso residencial transitório destinado a hospedagem deverá ter seu porte compatível com a edificação tombada ou preservada, segundo os critérios de manutenção de volumetria definidos pelo órgão de tutela, respeitados os parâmetros da legislação em vigor, e não poderá ter os seguintes serviços quando não previstos pela legislação de uso e ocupação do solo local ou específica:
I - bar e restaurante aberto ao público externo;
II - festas e promoção de eventos.
CAPÍTULO II
Do Uso Não Residencial
Art. 4º As reconversões das edificações tombadas ou preservadas para o uso não residencial ou misto ficam dispensadas de restrição quanto à tipologia da edificação.
Art. 5º Em imóveis tombados e preservados poderão ser admitidas as atividades relacionadas abaixo, além das permitidas para a zona onde se encontra o imóvel:
I - atividades artísticas e atelieres;
II - biblioteca;
III - instituto de beleza, sem cirurgia;
IV - escritório de profissional liberal autônomo;
V - editora, sem gráfica industrial;
VI - organismos internacionais;
VII - instituto de pesquisa;
VIII - centro cultural e institutos culturais;
IX - galeria de arte, antiguidades, antiquário e leiloeiro;
X - consultório médico e dentário de profissional liberal autônomo;
XI - venda de artigos de decoração, livraria, artesanato, perfumaria, plantas, flores e arranjos;
XII - museu;
XIII - produção cultural;
XIV - desenvolvimento de Software e Games;
XV - serviços de Tecnologia da Informação - TI;
XVI - agência de publicidade;
XVII - sedes de empresas de engenharia, arquitetura, design e moda;
XVIII - cafés e bistrôs;
XIX - ensino de artes.
Parágrafo único. Os Planos de Gestão, a serem elaborados para Áreas de Proteção do Ambiente Cultural – APAC poderão indicar outras atividades a serem permitidas para a área, além das relacionadas acima.
Art. 6º As obras de reconversão para usos residenciais transitórios e usos não residenciais em imóveis tombados ou preservados ficam condicionadas à aprovação prévia do órgão municipal responsável pela proteção do patrimônio cultural, ouvidos ainda os demais órgãos municipais competentes.
Parágrafo único. Os órgãos mencionados no caput deste artigo poderão estabelecer restrições ou indeferir o pedido se avaliado que a atividade a ser exercida poderá causar dano ou prejuízo ao meio ambiente, às condições de mobilidade urbana, à proteção do patrimônio cultural ou ao ambiente construído.
Art. 7º O não atendimento às condições estabelecidas no art. 6º sujeitará o infrator às penas de multa, interdição ou cassação da licença, nos termos das leis ou regulamentos específicos.
Art. 8º Em se tratando de imóvel tombado ou preservado, sempre que, após a aprovação da transformação de uso, o órgão responsável pela concessão de alvará de licença para estabelecimento receba pedido de alteração da atividade, deverá exigir do requerente, novamente, o atendimento de todas as exigências estabelecidas na presente Lei Complementar.
CAPÍTULO III
Dos Parâmetros Construtivos
Art. 9º Os bens tombados e preservados deverão ter suas principais características arquitetônicas protegidas, sendo permitidas modificações internas e acréscimos, desde que aprovadas pelos órgãos de tutela do patrimônio cultural.
Parágrafo único. No caso de alteração ilegal, demolição ou sinistro nas edificações tombadas ou preservadas, o órgão de tutela poderá estabelecer a obrigatoriedade de sua recomposição ou reconstrução, com a reprodução das características originais.
Art. 10. Nos casos de reconversão de imóveis tombados ou preservados, poderão ser dispensadas as seguintes exigências:
I - afastamento frontal e/ou recuos em casos de criação de pisos, quando em edificações originalmente construídas no alinhamento do lote;
II - circulações e escadas de uso comum, podendo os acessos às unidades serem feitos de forma independente;
III - dimensões mínimas das circulações em mesmo nível e entre níveis;
IV – patamar intermediário nas escadas de uso comum, vedadas, em qualquer caso, para uso comum, as escadas dos tipos marinheiro e caracol;
V – portarias, local para administração, área de recreação, salão de festas e de reuniões e dimensões mínimas para instalações sanitárias para empregados do edifício;
VI – apartamento do zelador e demais compartimentos de uso comum exigidos pela legislação em vigor.
§ 1º Os banheiros e instalações sanitárias poderão ter comunicação direta com salas e cozinhas.
§ 2º As unidades residenciais em edificação mista deverão, obrigatoriamente, possuir acesso ao logradouro público para o qual a edificação possui testada, independente do acesso das unidades comerciais.
§ 3º. Poderão ser dispensados outras disposições e parâmetros relativos às áreas internas da edificação a critério do órgão municipal responsável pelo patrimônio cultural, ouvidos os demais órgãos municipais competentes.
Art. 11. Os prismas de iluminação e ventilação existentes na edificação tombada ou preservada poderão ser aproveitados para a iluminação e ventilação das novas unidades a serem criadas na transformação de uso do imóvel, ainda que não possuam as dimensões previstas para novas construções, a critério do órgão de tutela do patrimônio cultural, ouvidos os demais órgãos competentes.
§ 1º Os compartimentos habitáveis poderão ser ventilados e iluminados por claraboias.
§ 2º Nos prismas de ventilação e iluminação, as aberturas de vão para iluminação e ventilação de um compartimento poderão ser abertas em qualquer de seus lados.
Art.12. A critério do órgão de tutela do imóvel e ouvidos os demais órgãos municipais competentes, os vãos de iluminação e ventilação existentes nas edificações tombadas ou preservadas poderão ser aproveitados para a iluminação e ventilação das novas unidades a serem criadas na transformação de uso do imóvel, mesmo quando sua área não atenda integralmente à legislação edilícia vigente.
Parágrafo único. No caso do não atendimento integral à legislação edilícia vigente, mecanismos adicionais de iluminação e ventilação deverão ser criados.
Art. 13. Será permitida a criação de mezaninos em unidades residenciais ou comerciais de imóveis tombados ou preservados, desde que satisfaçam as exigências dos órgãos de tutela do imóvel e as seguintes condições:
I - tenham altura mínima de dois metros e dez centímetros livres de elementos estruturais e mecânicos, deixando com esta mesma altura o espaço que ficar sob sua projeção no piso do compartimento em que for construído, desde que sejam garantidos o acesso e a utilização dos vãos da fachada;
II - não prejudiquem as condições de iluminação e ventilação do compartimento onde for construído;
III - ocupem área equivalente a, no máximo, cinquenta por cento da área do compartimento onde for construído.
Art. 14. As alterações internas poderão incluir a criação de novos pisos desde que seja garantido o acesso e a utilização dos vãos da fachada, respeitada a altura original do telhado e pé direito mínimo estabelecido pela legislação em vigor.
§1º Na criação de novos pisos localizados sob telhados, o caimento poderá ser aproveitado, garantidas as condições mínimas de iluminação e ventilação.
§2º O aproveitamento de sótão e a criação de novos pisos no interior da edificação tombada ou preservada, desde que respeitada a altura original do telhado, não configurarão aumento de gabarito, nem serão computados no cálculo da Área Total Edificável - ATE.
Art. 15. A obra de reforma e adaptação para transformação de uso de imóveis tombados ou preservados deverá garantir boas condições de segurança, higiene, uso e habitabilidade da edificação.
Art. 16. Na transformação de uso dos imóveis de que trata esta Lei Complementar, poderá ser dispensado o número mínimo de vagas para estacionamento de veículos previsto na legislação em vigor e não será exigido acesso direto às vagas.
Parágrafo único. As áreas de afastamento frontal e das divisas poderão ser utilizadas para estacionamento, desde que não sejam cobertas, a critério dos órgãos de tutela, ouvidos os demais órgãos municipais competentes.
Art. 17. Esta Lei Complementar entra em vigor na data de sua publicação.
MENSAGEM N.º 198 De 29 de maio DE 2012.
Excelentíssimo Senhor Vereador Presidente
Excelentíssimos Senhores Vereadores da Câmara Municipal do Rio de Janeiro,
Dirijo-me a Vossas Excelências para encaminhar o presente Projeto de Lei Complementar que “Cria condições de incentivo ao aproveitamento e à conservação de edificações tombadas ou preservadas e dá outras providências” com o seguinte pronunciamento.
O Município do Rio de Janeiro conta com considerável acervo de prédios de relevante interesse cultural, cuja ocupação e renovação devem ser compatíveis com a proteção e a conservação da ambiência urbana da área onde estão localizados e com sua tipologia e elementos construtivos.
No entanto, muitos imóveis que compõem este acervo encontram-se atualmente vazios, subutilizados e/ou em péssimo estado de conservação, comprometendo não apenas o patrimônio arquitetônico da Cidade, como também a segurança dos cidadãos. Paralelamente a isso, o alto custo de manutenção desestimula ou, em alguns casos, até inviabiliza a conservação de tais imóveis.
Não se pode desconsiderar, ademais, que parte significativa dos imóveis preservados na Cidade possuem, em alguns casos, usos desprovidos de sustentabilidade e, em outros, utilização incompatível com o uso residencial unifamiliar.
Agravando este quadro, um expressivo contingente de imóveis tombados ou preservados na Cidade do Rio de Janeiro se encontra em áreas de baixa renda, onde a reabilitação do ambiente urbano dificilmente dar-se-á sem que haja algum novo tipo de incentivo por parte do Poder Público.
A adequada utilização dos imóveis é fator determinante para sua recuperação e conservação. Mais do que isso, a reabilitação e requalificação urbana de determinadas regiões da Cidade passa pela necessidade de se adaptar grande número de imóveis preservados para novos usos e novas destinações.
A legislação urbanística e edilícia em vigor tem se mostrado inadequada à adaptação de edificações de valor histórico a novos usos, compatíveis com a nova realidade que se apresenta. Daí, a necessidade de se criar um regime especial para as edificações tombadas e preservadas, sem descuidar de questões de conforto e segurança.
O presente Projeto de Lei Complementar propõe-se a criar mecanismos de estímulo para a utilização e recuperação de imóveis tombados ou preservados, de valor histórico e arquitetônico, protegidos pelos órgãos de tutela do patrimônio, com o intuito de facilitar sua utilização de forma sustentável, tendo como resultado a conservação e segurança da edificação. A ideia é dar tratamento diferenciado a estes prédios, adaptando as exigências edilícias às suas estruturas originais, sem colocar em risco a segurança, conforto e harmonia do ambiente urbano. Para isso, os órgãos de tutela deverão ter a atribuição de julgar os projetos de transformação de uso em seus diversos aspectos.
A proposta aqui contida prioriza a transformação de imóveis residenciais unifamiliares em residências multifamiliares ou em hospedagem turística. Também, possibilita a transformação do imóvel tombado ou preservado para outros usos, quando essa for a opção mais viável e sustentável para a reabilitação da edificação.
Em resumo, a proposta aqui apresentada visa a dar melhores condições para a recuperação do patrimônio histórico e arquitetônico das edificações existentes na Cidade, preservando suas características originais e, ainda, garantindo a segurança e estabilidade das construções.
Ao enviar a presente Mensagem, aproveito para renovar expressões de mais alta estima e apreço.
EDUARDO PAES