OFÍCIO GP n.º 528/CMRJ Em 11 de junho de 2012.
Senhor Presidente,
Dirijo-me a Vossa Excelência para comunicar o recebimento do Ofício M-A/n.º 132, de 17 de maio de 2012, que encaminha o autógrafo do Projeto de Lei n.º 72, de 2009, de autoria do Ilustre Senhor Vereador Bencardino, que “Dispõe sobre a proibição de cobrança antecipada em bares, restaurantes e similares”, cuja segunda via restituo-lhe com o seguinte pronunciamento.
Ainda que nobre e louvável o seu escopo, o projeto apresentado por essa egrégia Casa de Leis não poderá lograr êxito, em razão dos vícios de inconstitucionalidade que o atingem.
A proposta em tela pretende proibir a cobrança antecipada nos bares, restaurantes e estabelecimentos comerciais similares localizados no Município do Rio de Janeiro, prevendo, inclusive, a aplicação de penalidades para o caso de descumprimento.
As determinações da proposta, ao estabelecer vedação aos estabelecimentos comerciais que menciona, se referem à relação de consumo estabelecida entre tais instituições e seus respectivos clientes.
Na repartição constitucional de competência, o constituinte originário estabeleceu, no que concerne à relação de consumo, a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre a matéria, conforme previsto no artigo 24, incisos V e VIII, da Constituição da República Federativa do Brasil.
No caso vertente, sequer pode-se cogitar da competência suplementar do Município para tratamento da matéria, com fulcro no artigo 30, inciso II, da C.R.F.B., vez que, para isso, imprescindível a existência de norma legislativa federal ou estadual abordando o assunto e possibilitando o ajustamento de sua execução às peculiaridades locais.
Ademais, no Projeto de Lei em apreço, não se vislumbra nenhuma peculiaridade vinculada à relevante interesse local que justifique a atitude do legislador municipal de dispor sobre direito do consumidor.
Além disso, a Lei n.º 8078, de 1990, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor, já prevê, em seu artigo 39, as práticas que considera abusivas, não abrangendo a hipótese de que trata este Projeto de Lei.
Destaca-se, ainda, que o Poder Legislativo, ao estabelecer, no artigo 3º do Projeto em tela, a aplicação de penalidades pelo descumprimento das disposições propostas violou, expressamente, o disposto no artigo 71, inciso II, alínea b, da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro, o qual prevê a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para as leis que disponham sobre criação, extinção e definição de estrutura e atribuições das Secretarias e dos órgãos da Administração Direta, Indireta e Fundacional.
Com efeito, o mister de fiscalizar os bares, restaurantes e estabelecimentos comerciais similares localizados no Município acarreta, como consequência lógica, a criação de novas atribuições para a Administração Pública, bem como a contratação de pessoal e a criação de infraestrutura suficiente para tal desempenho.
Para tanto, haveria a necessidade de disponibilizar investimentos específicos que certamente acarretariam aumento de despesa, razão pela qual o projeto em análise se traduz, ainda, em afronta ao estabelecido pelo artigo 71, inciso II, alínea c, da LOMRJ, que também estabelece a iniciativa do Prefeito para aqueles casos nos quais haja aumento de despesa pública. Aliás, o dispêndio de recursos, sem prévio estudo de seu impacto, pode acarretar sérios riscos para a atividade da Administração.
Note-se, ainda, que a geração de despesa pública sem a correspondente previsão de fonte de custeio representa expressa violação ao artigo 167, I e II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, além de ferir o artigo 16 da Lei Complementar n.º 101, de 2000 — Lei de Responsabilidade Fiscal, na medida em que, conforme determina o referido diploma, toda geração de despesa deve estar acompanhada da estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes, assim como da declaração do ordenador de despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a lei orçamentária anual e compatibilidade com o plano plurianual e com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, pressupostos que não foram observados.
Em suma, a ingerência do Legislativo em seara que não lhe é própria torna cristalina a violação ao princípio da separação entre os Poderes, fixado no artigo 2.º, da CRFB de 1988, e repetido, com arrimo no princípio da simetria, respectivamente, nos artigos 7.º e 39 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e da LOMRJ.
Destarte, sou obrigado a vetar integralmente o Projeto de Lei n.º 72, de 2009, em razão dos vícios de inconstitucionalidade que o atingem.
Aproveito o ensejo para reiterar a Vossa Excelência meus protestos de alta estima e distinta consideração
EDUARDO PAES
Exmo. Sr.
Vereador JORGE FELIPPE
Presidente da Câmara Municipal do Rio de Janeiro