Senhor Presidente,
Dirijo-me a Vossa Excelência para comunicar o recebimento do Ofício M-A/nº 198, de 2 de setembro de 2015, que encaminha o autógrafo do Projeto de Lei nº 986, de 2014, de autoria do Ilustre Senhor Edson Zanata, que “Dispõe sobre sanções a serem aplicadas à empresa em que for constatada a existência de trabalho escravo ou infantil”, cuja segunda via restituo-lhe com o seguinte pronunciamento. Embora de louvável meta, o Projeto apresentado por essa egrégia Casa de Leis não poderá ter sucesso, por força dos vícios de ilegalidade e inconstitucionalidade que o acometem. A proposta em tela pretende, em síntese, aplicar sanções a empresas em que forem constatadas a existência de trabalho escravo ou infantil. Inicialmente, devo destacar que o Estado Federal é modelo de organização do poder que enseja conflitos dos mais variados. Implica em uma repartição delicada de competências entre o ente representativo dos diversos poderes centrais e aqueles que se traduzem em organizações regionais ou locais. Esta partilha, no caso brasileiro, foi feita de forma bastante rígida, visto que se encontra insculpida em nossa Constituição Federal e só pode ser alterada através de Emenda Constitucional. Com efeito, compete privativamente à União Federal legislar sobre direito do trabalho, conforme previsto no inciso I do art. 22 da Constituição da República Federativa do Brasil – CRFB. E, no que concerne à fiscalização e inspeção das condições de trabalho, o Projeto viola o disposto no art. 21, XXIV, da CRFB. Neste prisma, ressalta-se a existência da Lei Federal n° 10.593, de 6 de dezembro de 2002, que, em seu art. 11, inciso I, determina ser atribuição dos ocupantes do cargo de Auditor-Fiscal do Trabalho assegurar o cumprimento de disposições legais e regulamentares, inclusive as relacionadas à segurança e à medicina do trabalho, no âmbito das relações de trabalho e emprego. Destaca-se, ainda, o disposto no art. 18, XIII, do Decreto Federal n° 4.555, de 27 de dezembro de 2002, segundo o qual é competência dos Auditores-Fiscais do Trabalho, em todo o território nacional, a propositura de interdição de estabelecimento, setor de serviço, máquina ou equipamento, ou o embargo de obra, total ou parcial, quando constatar situação de grave e iminente risco à saúde ou à integridade física do trabalhador, por meio de emissão de laudo técnico que indique a situação de risco verificada e especifique as medidas corretivas que deverão ser adotadas pelas pessoas sujeitas à inspeção do trabalho, comunicando o fato de imediato à autoridade competente. O Projeto, em seu art. 4º, determina que o Poder Executivo celebrará convênios de Cooperação Técnica com as Administrações Públicas Estadual e Federal, concernente ao intercâmbio de informações sobre a constatação de existência de trabalho escravo ou infantil nas empresas em funcionamento no território do Município. Não obstante a nobre intenção do ilustre Sr. Vereador, tal disposição, contudo, denota notória interferência, não autorizada pela Constituição, do Legislativo em atividade típica do Executivo, pois aquele ultrapassa os limites de sua competência, e pretende ditar o conteúdo e impor ao Executivo o exercício de prerrogativas de natureza discricionária, ou seja, condicionada ao seu juízo privativo de oportunidade e conveniência. Além disso, a redação contida no art. 5º do Projeto, ao dispor que caberá ao órgão da Administração Pública Direta Municipal responsável pela execução das políticas públicas de geração de emprego, trabalho e renda o exercício da fiscalização do cumprimento da norma, afronta o disposto no art. 71, inciso II, alínea “b”, da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro - LOMRJ, eis que a iniciativa dos projetos de lei que disponham sobre a criação, extinção e definição de estrutura e atribuições das Secretarias e dos Órgãos da Administração Direta, Indireta e Fundacional é de competência privativa do Chefe do Poder Executivo Municipal. Ao imiscuir-se, assim, em seara que não lhe é própria, o Poder Legislativo feriu o princípio da separação entre os Poderes, estabelecido no art. 2º da CRFB e repetido, com arrimo no princípio da simetria, respectivamente, nos arts. 7º e 39 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e da LOMRJ. Destarte, sou obrigado a vetar integralmente o Projeto de Lei nº 986, de 2014, em razão dos vícios de inconstitucionalidade e ilegalidade que o atingem. Aproveito o ensejo para reiterar a Vossa Excelência meus protestos de alta estima e distinta consideração.
Pág. 4 do DORio de 16/09/2015
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