Ainda que nobre e louvável o seu escopo, o Projeto apresentado por essa egrégia Casa de Leis não poderá lograr êxito, em razão dos vícios de inconstitucionalidade que o atingem.
As determinações da proposta se referem à relação de consumo, como se extrai da leitura do art. 2º.
Na repartição constitucional de competência, o constituinte originário estabeleceu, no que concerne à relação de consumo, a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre a matéria, conforme previsto no art. 24, incisos V e VIII da Constituição da República Federativa do Brasil – C.R.F.B.
No caso vertente, sequer pode-se cogitar da competência suplementar do Município para tratamento da matéria, com fulcro no art. 30, inciso II, da C.R.F.B., vez que, para isso, imprescindível a existência de norma legislativa federal ou estadual abordando o assunto e possibilitando o ajustamento de sua execução às peculiaridades locais.
Ademais, no Projeto de Lei em apreço, não se vislumbra nenhuma peculiaridade vinculada ao interesse local, a justificar a incidência do art. 30, inciso I, da C.R.F.B., que justifique a atitude do legislador municipal de dispor sobre direito do consumidor.
Destaca-se, ainda, que o Poder Legislativo, ao estabelecer, no art. 3º do Projeto em tela, a aplicação de penalidades pelo descumprimento das disposições propostas violou, expressamente, o disposto no art. 71, inciso II, alínea “b”, da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro - LOMRJ, o qual prevê a iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para as leis que disponham sobre criação, extinção e definição de estrutura e atribuições das Secretarias e dos Órgãos da Administração Direta, Indireta e Fundacional.
Com efeito, o mister de fiscalizar os estacionamentos privados em geral, localizados no Município, acarreta, como consequência lógica, a criação de novas atribuições para a Administração Pública, bem como a contratação de pessoal e a criação de infraestrutura suficiente para tal desempenho.
Para tanto, haverá a necessidade de disponibilizar investimentos específicos que certamente acarretarão aumento de despesa, afrontando o estabelecido no art. 71, inciso II, alínea “c”, da LOMRJ, que estabelece a iniciativa do Prefeito para os casos nos quais haja aumento de despesa pública. Aliás, o dispêndio de recursos, sem prévio estudo de seu impacto, pode acarretar sérios riscos para a atividade da Administração.
Note-se, ainda, que a geração de despesa pública sem a correspondente previsão de fonte de custeio representa expressa violação ao art. 167, incisos I e II, da C.R.F.B., além de ferir o art. 16 da Lei Complementar nº 101, de 4 de dezembro de 2000 — Lei de Responsabilidade Fiscal, na medida em que, conforme determina o referido diploma, toda geração de despesa deve estar acompanhada da estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subseqüentes, assim como da declaração do ordenador de despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a Lei Orçamentária Anual e compatibilidade com o Plano Plurianual e com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, pressupostos que não foram observados.
Em suma, a ingerência do Legislativo em seara que não lhe é própria torna cristalina a violação ao princípio da separação entre os Poderes, fixado no art. 2º da C.R.F.B. e repetido, com arrimo no princípio da simetria, respectivamente, nos arts. 7º e 39 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e da LOMRJ.
Destarte, sou obrigado a vetar integralmente o Projeto de Lei nº 1045, de 2014, em razão dos vícios de inconstitucionalidade que o atingem.
Aproveito o ensejo para reiterar a Vossa Excelência meus protestos de alta estima e distinta consideração.
Publicado no DORio de 8 de janeiro de 2016, pág. 3
Atalho para outros documentos