OFÍCIO GP nº 349/CMRJ Em 11 de junho de 2015.
Senhor Presidente,
Dirijo-me a Vossa Excelência para comunicar o recebimento do Ofício M-A/nº 61, de 21 de maio de 2015, que encaminha o autógrafo do Projeto de Lei nº 803, de 2014, de autoria do Ilustre Senhor Vereador Reimont, que “Estabelece o prazo de cinco anos para justificar a desapropriação de bens imóveis por interesse social no Município do Rio de Janeiro”, cuja segunda via restituo-lhe com o seguinte pronunciamento.
Muito embora o Projeto apresentado por essa egrégia Casa de Leis seja de elevado espírito público, o mesmo não poderá lograr êxito, em virtude dos vícios de ilegalidade e de inconstitucionalidade que o acometem.
Como é cediço, a desapropriação constitui o mais grave instrumento de que dispõe o Estado para intervir no direito de propriedade privada, porquanto atinge seu caráter perpétuo e irrevogável.
Sendo uma atividade típica do Poder Executivo a escolha da localização que se revele mais conveniente e oportuna para a construção de um espaço público, incumbe à Administração aferir a efetiva existência de necessidade ou interesse social que autorize o sacrifício de despojar alguém de um imóvel particular para a implementação da norma sob análise.
Sem embargo, a primeira fase do procedimento de desapropriação, qual seja, a declaração expropriatória, é ato administrativo discricionário, mediante o qual o Poder Público manifesta sua intenção de adquirir certo bem compulsoriamente, sendo, normalmente, veiculada por Decreto, na forma prevista no art. 6º da Lei nº 3.365, de 21 de junho de 1941 - Lei Geral das Desapropriações.
Portanto, o legislador usurpa função administrativa típica, ditando previamente a prática de atos cuja competência é reservada à esfera discricionária da Administração Pública. Trata-se de reserva material inerente ao poder de gestão, não cabendo, pois, ao Poder Legislativo traçar peremptoriamente os atos da Administração de forma a alijar por completo o mérito da decisão política, restando ao Executivo apenas aquiescer.
Nesse diapasão é que o legislador carioca atribuiu, no art. 107, inciso XXIII, da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro - LOMRJ, competência privativa ao Prefeito para decretar a desapropriação por interesse social e utilidade pública.
Além disso, o imprescindível pagamento de prévia e justa indenização em dinheiro para a concretização da almejada desapropriação redundaria em inevitável aumento de despesa pública, premissa essa que denota insanável vício de iniciativa com fulcro no art. 71, inciso II, alínea “c”, da LOMRJ.
A geração de despesa pública sem a correspondente previsão de fonte de custeio representa expressa violação ao art. 167, incisos I e II, da Constituição Federal, além de ferir o art. 16 da Lei de Responsabilidade Fiscal, na medida em que, conforme determina o referido Diploma, toda geração de despesa deve estar acompanhada da estimativa do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva entrar em vigor e nos dois subsequentes, assim como da declaração do ordenador de despesa de que o aumento tem adequação orçamentária e financeira com a Lei Orçamentária Anual e compatibilidade com o Plano Plurianual e com a Lei de Diretrizes Orçamentárias, pressupostos que não foram observados.
Desta forma, tampouco compete ao Poder Legislativo conferir ao Poder Executivo prazo para justificar, desapropriar ou constatar as condições de desapropriação de imóveis por interesse social.
Ao imiscuir-se, destarte, em seara que não lhe é própria, o Legislativo Municipal violou o princípio da separação entre os Poderes, estabelecido no art. 2º da Constituição da República Federativa do Brasil e repetido, com arrimo no princípio da simetria, nos arts. 7º e 39 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e da LOMRJ, respectivamente.
Ante o exposto, vejo-me compelido a vetar integralmente o Projeto de Lei nº 803, de 2014, em razão dos vícios de inconstitucionalidade e de ilegalidade que o maculam.
Aproveito o ensejo para reiterar a Vossa Excelência meus protestos de alta estima e distinta consideração.
EDUARDO PAES