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DECISÃO DO PRESIDENTE
Trata-se de recurso interposto pela Senhora Vereadora Teresa Bergher e do Senhor Vereador Reimont de contradita à resposta desta Presidência à questão de ordem levantada pelo Vereador Reimont no decurso da 17ª Sessão Ordinária, realizada terça-feira próxima passada, na qual S.Exa. interrogou que o Vereador Paulo Messina não poderia ter participado do sorteio de escolha dos membros da Comissão Processante que vai apurar a denúncia de infração político-administrativa contra o Chefe do Poder Executivo.
Feita a indagação, prontamente, esta Presidência esclareceu que todos os Senhores Vereadores estavam habilitados ao certame, visto que nenhum edil subscreveu a autoria da peça acusatória, e, em seguida, colocou na urna os nomes daqueles que tacitamente não se opuseram ou não se declararam impedidos.
Não obstante a elucidação naquela Sessão, a nobre recorrente insiste que o Vereador Paulo Messina estava impedido, esposando-se na tese de suspeição de
S. Exa. por aplicação subsidiária do Código de Processo Civil, em fase da omissão (sic ) do Decreto-Lei nº 201/67 e do Regimento Interno desta Casa de Leis.
Vejamos, então, pontos duais a serem brevemente explanados para dirimir a cizânia em tela.
I. Da aplicação do Decreto-Lei nº 201/67
Não resta dúvida quanto ao escorreito procedimento adotado na Sessão Ordinária da pretérita terça-feira, que considerou que todos os Senhores Vereadores estavam aptos ao sorteio dos nomes para a constituição da Comissão Processante. A vedação à participação decorre única e exclusivamente da circunstância de subscrição da denúncia.
A legislação é cristalina e taxativa, nestes termos:
“Art. 5º O processo de cassação do mandato do Prefeito pela Câmara, por infrações definidas no artigo anterior, obedecerá ao seguinte rito, se outro não for estabelecido pela legislação do Estado respectivo:
I – a denúncia escrita da infração poderá ser feita por qualquer eleitor com a exposição dos fatos e a indicação das provas. Se o denunciante for Vereador, ficará impedido de votar sobre a denúncia e de integrar a Comissão Processante, podendo, praticar todos os atos de acusação. Se o denunciante for o Presidente da Câmara, passará a Presidência ao substituto legal, para os atos do processo e só votará se necessário para completar o quórum de julgamento. Será convocado o suplente do vereador impedido de votar, o qual não poderá integrar a Comissão Processante.
II – de posse da denúncia, o Presidente da Câmara, na primeira sessão, determinará sua leitura e consultará a Câmara logo sobre o seu recebimento. Decidido o recebimento, pelo voto da maioria dos presentes, na mesma sessão será constituída a Comissão Processante, com três Vereadores sorteados entre os desimpedidos, os quais elegerão, desde logo, o Presidente e o Relator.”
(grifos para realce da redação)
Pela transcrição, nota-se que não há outra previsibilidade de impedimento. Por corolário, depreende-se que o ato de ser contemplado no sorteio é condição universal para os membros da Corporação Legislativa, à exceção, quando forem idealizadores da malsinação, tão-somente.
Nem mesmo o Presidente da Câmara Municipal incorre em impedimento. A esse respeito, excerto da obra do Professor José Nilo de Castro, in A Defesa dos Prefeitos e Vereadores em face do Decreto-Lei nº 201/67, assim leciona:
“A Comissão Processante será constituída por três vereadores sorteados (...) e desimpedidos (...) E o Presidente da Câmara? Decidiu o Superior Tribunal de Justiça que o Decreto-Lei nº 201/67 não veda a possibilidade de o Presidente da Câmara acumular as funções de Presidente da Comissão Processante.”
Em síntese, não sendo autor da denúncia, todos os Senhores Vereadores têm o direito subjetivo de ser sorteado para membro da Comissão Processante. Ainda que com todo esse arrazoado, esta Presidência declinou desse direito e consultou o excelso Plenário sobre essa faculdade, antes da realização do sorteio, conforme se extrai da publicação da Ata da 17ª Sessão Ordinária, nestes trechos:
“O SR. PRESIDENTE (JORGE FELIPPE)
(...)
Com base no art. 103 da Lei Orgânica do Município (linha sucessória no caso de vacância do cargo de Prefeito), eu me declaro impedido de participar da Comissão Processante.
Consulto a Senhora Vereadora Tânia Bastos, que está na mesma situação que eu, se V.Exa vai se declarar impedida ou vai desejar participar, caso seja sorteada.
A SRA. TÂNIA BASTOS – Presidente, estou à disposição para participar.”
Logo após, mais quatro Senhores Vereadores abriram mão do direito de participação na Comissão Processante. Imediatamente à realização do sorteio, o Vereador Reimont formulou a questão de ordem e o Vereador Paulo Messina assim se pronunciou:
“O SR. PAULO MESSINA – Olha, eu compreendo as razões do Vereador Reimont, respeito o seu posicionamento. (...) , eu me sinto à vontade como defensor do Governo, de fazer parte da votação. Portanto, não me sinto impedido.”
Nota-se, dessarte, que esta Presidência assegurou amplamente aos Senhores Vereadores o direito discricionário de não participar do sorteio e, dessa forma, não integrar a Comissão Processante. Contudo, jamais poderia denegar o legítimo direito de qualquer Vereador de ser sorteado, de desejar participar dos trabalhos de investigação, pois, se assim o fizesse, estaria afrontando a norma superior do Decreto-Lei nº 201/67.
II. Da anomalia recursal da evocação da aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.
Diz textualmente a querelante: “Na verdade, trata-se de arguição (a questão de ordem do Senhor Vereador Reimont) de suspeição, que se encontra regulado no art. 145 do Código de Processo Civil, de aplicação subsidiária por força do art. 15 do referido diploma legal, em razão da omissão (grifei) do Decreto-Lei nº 201/67 e do Regimento Interno desta Casa de Leis.”
Ora, reportando-se ao item anterior, verifica-se que inexiste omissão, não há nenhum hiato, na redação normativa. Ao contrário, a legislação se expressa de forma determinante, peremptória, recaindo o impedimento apenas e somente, como reiteradamente se afirmou aqui, quando se tratar de Vereador denunciante. E sendo assim, não há que se falar em aplicação subsidiária do Código de Processo Civil. Mais uma vez, recorre-se ao magistério de José Nilo de Castro, in opus citatum, que ensina:
“O processo de julgamento das infrações político-administrativas é vinculado às normas do Decreto-Lei nº 201/67 e não às do Código de Processo Civil ou do Código de Processo Penal. E a indução da indisponibilidade de certos atos, (...), não traduz nem impõe que sejam os prazos e formas judiciais aplicados, com seus rigores, a processos político-administrativos de cassação de mandatos eletivos municipais.”
(grifei)
É óbvio que aqui não se fala da absoluta inaplicabilidade de ambos os Códigos (CPC e CPP) ao processo de denunciação. O que não se admite é transpô-los por analogia ou por extensão interpretativa, quando o Decreto-Lei nº 201/67 não for omisso. É inaceitável nesse caso a aplicação subsidiária, pois somente se encontra impossibilitado de votar o recebimento ou não da denúncia e integrar a Comissão Processante o Vereador que oferecer a peça acusatória. Sobre isso, o Decreto-Lei nº 201/67 indica expressamente o impedimento, sinalizando a hipótese possível. Não existe lacuna in casu, nenhuma vacuidade.
III. Da conclusão
Compactuando com esse entendimento, registre-se o Parecer nº 3/2019-JLGMB, em anexo, da douta Procuradoria-Geral da Câmara Municipal, que também incompatibiliza a aplicação subsidiária da suspeição e do impedimento ao processo de denúncia de infração político administrativo contra o Chefe do Poder Executivo de que trata o Decreto-Lei nº 201/67.
Por epílogo, após feitas essas considerações, a Presidência DENEGA provimento ao recurso impetrado pela Senhora Vereadora Teresa Bergher e pelo Senhor Vereador Reimont.
Nos termos do art. 289, § 1º, do Regimento Interno, dê-se prossecução ao expediente recursal ora apresentado, encaminhando-o à douta Comissão de Justiça e Redação para parecer e deliberação do egrégio Plenário.
Gabinete da Presidência, 4 de abril de 2019
Vereador JORGE FELIPPE
Presidente
Parecer n. 03/2019 – JLGMB
Ementa: Processo de impeachment de prefeito municipal. Natureza jurídica: Processo preponderantemente político, com reflexos penais quanto aos seus efeitos. Decreto-Lei nº 201/1967 prevê uma única hipótese de impedimento: ter sido o vereador o autor da denúncia. Inaplicabilidade das causas de suspeição e impedimento tanto do Código de Processo Penal, quanto do Código de Processo Civil. Precedentes: ADPF nº 378-DF no Supremo Tribunal Federal. Possibilidade de recusa do parlamentar em participar da Comissão Processante por questão de foro íntimo. Desprovimento do Recurso.
Senhor Vereador Presidente,
Trata-se de consulta formulada por Vossa Excelência a esta Procuradoria-Geral acerca da juridicidade de recurso interposto pela Vereadora Teresa Bergher em face de decisão da Presidência que indeferiu questão de ordem formulada pelo Vereador Reimont, por meio da qual se postulava o impedimento do Vereador Paulo Messina para integrar a comissão processante, prevista no art. 5º do Decreto-Lei nº 201/1967, no processo de impeachment ora em curso nesta Casa.
Cabe, ab initio, melhor detalhar a sucessão de eventos que precederam o recurso em questão.
Por ocasião da abertura da Sessão Ordinária do dia 02/04/2019, antes do início das etapas de discussão e votação da admissibilidade da denúncia por infração político-administrativa, prevista no Decreto-Lei nº 201/1967, imputada ao Prefeito Marcelo Crivella (e já objeto do Parecer nº4/2018 – JLGMB, desta Procuradoria-Geral), a Presidência desta Casa detalhou como se daria todo o rito do processo de impeachment. Especialmente em relação às hipóteses de impedimento assim foi dito:
“(...)II – Da Apresentação e do Recebimento da Denúncia
Apresentada a denúncia por eleitor do Município (cidadão comum ou Vereador), o Presidente da Câmara Municipal se pronunciará acerca da admissibilidade, com análise inicial da fundamentação normativa e dos requisitos formais necessários ao seu recebimento.
Sendo o autor vereador, este ficará impedido de votar, convocando-se o respectivo suplente para esse fim.
(...)
III – Da Comissão Processante
Aprovado o recebimento da denúncia pelo Plenário, logo após, constituir-se-á uma Comissão Processante composta por três Senhores Vereadores sorteados na mesma sessão, ficando impedido dela participar o Vereador autor da denúncia.
Poderão se declarar impedidos de participar do sorteio o Presidente e o 1° Vice-Presidente da Câmara Municipal em decorrência do art. 103 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro.
Outros Senhores Vereadores poderão manifestar o desejo de não participar do referido sorteio, desde que anunciados antes da realização do certame. Neste caso, o Presidente da Câmara retirará as respectivas cédulas nominais do procedimento.”
Em sequência, o Plenário recebeu a denúncia e – antes da etapa de eleição dos membros da Comissão Processante, que se deu por sorteio – o Vereador Reimont formulou questão de ordem suscitando o impedimento do Vereador Paulo Messina, por conta de sua posição anterior de Chefe da Casa Civil no governo do Prefeito Marcelo Crivella, circunstância que, supostamente, comprometeria a sua imparcialidade para compor a referida Comissão.
A aludida questão de ordem foi rejeitada pela Presidência com base nas disposições insertas no art. 5º, I, do Decreto-Lei nº 201/1967, já que a única hipótese de impedimento prevista naquele diploma é a de vereador que seja denunciante.
Pois bem, a eleição dos membros da Comissão Processante transcorreu normalmente, tendo sido sorteados os vereadores William Coelho, Luis Carlos Ramos e Paulo Messina para a integrarem.
Irresignada, a Vereadora Teresa Bergher interpôs recurso em que sustenta, com base nos arts. 15 e 145 do Código de Processo Civil, a suspeição do Vereador Messina pelas seguintes razões:
i) Caberia a aplicação das causas de suspeição previstas no art. 145 do CPC, ante a omissão do Decreto-Lei nº 201/1967; ii) a suspeição estaria configurada em vista da possibilidade do Vereador Paulo Messina, enquanto ocupava a chefia da Casa Civil, “ter sido partícipe dos atos supostamente praticados pelo Prefeito”; iiii) a suspeição seria reforçada, ainda, segundo afirma a Recorrente, por ter o Processo Administrativo nº 04/551.334/2018¹ , no bojo do qual constaria a realização dos contratos supostamente irregulares que fundamentam o pedido de impeachment do Alcaide, passado pelo crivo do então Chefe da Casa Civil, e hoje Vereador, Paulo Messina.
É este o relatório. Opino.
Apesar de tratarmos de leis vigentes desde o século passado, ainda hoje, nos deparamos com considerável confusão terminológica sobre os conceitos de crime de responsabilidade e infração político-administrativa. Assim, o primeiro ponto que merece esclarecimento no que concerne à disciplina do Decreto-Lei nº 201/1967 é distinguir o impropriamente denominado i) crime de responsabilidade dos prefeitos previsto nos tipos insertos no art. 1º, cujo julgamento é realizado pelo Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores, das ii) infrações político-administrativas previstas no art. 4º do mesmo diploma².
Em breve síntese, podemos definir os primeiros como crimes comuns, na medida em que o seu julgamento é realizado pelo Poder Judiciário, como dispõe o art. 29, X, da Lei Maior³ , com base na dogmática jurídico-penal ordinária, de ação pública e cominados com penas de reclusão ou detenção; os segundos como infrações, em nossa visão, de matiz exclusivamente político-administrativa, tipificação aberta, e cujo julgamento é de competência exclusiva da Câmara Municipal e indene à sindicabilidade jurisdicional quanto ao mérito do que decidido pelo Parlamento.
É verdade que ainda há amplo dissenso doutrinário a respeito da natureza jurídica do gênero crime de responsabilidade de autoridades políticas 4 5 , (em que figura como espécie a infração político-administrativa do prefeito, prevista no art. 4º do DL. nº 201/1967).
No que pese ter sido reconhecida pela Suprema Corte a natureza penal do instituto quanto aos seus efeitos 6 – e aí reside a causa de atração da competência da União para legislar sobre a matéria (conforme deixei assentado no Parecer nº4/2018-JLGMB) – o processo de impeachment jamais deixou de ser compreendido, pelo próprio STF, como processo essencialmente político.
Por esta razão, entendeu a Suprema Corte, ao julgar a Medida Cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 378 - Distrito Federal, em que se debatia o rito do processo de impeachment da então Presidente Dilma Rousseff, pela impossibilidade de aplicação subsidiária das causas de suspeição e impedimento previstas no Código de Processo Penal ao referido processo, posto que já havia previsão expressa na lei especial. Transcreve-se, para maior clareza, o trecho pertinente do acórdão da lavra do eminente Ministro Luis Roberto Barroso:
“(...)III. MÉRITO: DELIBERAÇÕES UNÂNIMES 1. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DAS HIPÓTESES DE IMPEDIMENTO E SUSPEIÇÃO AO PRESIDENTE DA CÂMARA (ITEM K DO PEDIDO CAUTELAR): Embora o art. 38 da Lei nº 1.079/1950 preveja a aplicação subsidiária do Código de Processo Penal no processo e julgamento do Presidente da República por crime de responsabilidade, o art. 36 dessa Lei já cuida da matéria, conferindo tratamento especial, ainda que de maneira distinta do CPP. Portanto, não há lacuna legal acerca das hipóteses de impedimento e suspeição dos julgadores, que pudesse justificar a incidência subsidiária do Código. A diferença de disciplina se justifica, de todo modo, pela distinção entre magistrados, dos quais se deve exigir plena imparcialidade, e parlamentares, que podem exercer suas funções, inclusive de fiscalização e julgamento, com base em suas convicções político-partidárias, devendo buscar realizar a vontade dos representados. Improcedência do pedido.” (ADPF 378 MC / DF - DISTRITO FEDERAL - MEDIDA CAUTELAR NA ARGÜIÇÃO DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL
Relator(a): Min. EDSON FACHIN - Relator(a) p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO - Julgamento: 17/12/2015 - Órgão Julgador: Tribunal Pleno)
Nesse sentido, não cabe o argumento suscitado pela Vereadora Teresa Bergher, ora recorrente, que aponta a aplicação subsidiária das causas de suspeição previstas no Código de Processo Civil ao processo de impeachment de prefeito municipal7 . Isso porque, assim como faz o art. 36 da Lei nº 1.079/1950, o art.5, I, do Decreto-Lei nº 201/1967 já dispõe sobre a única hipótese de impedimento para vereador votar no processo de impeachment ou integrar a respectiva Comissão Processante: ser o denunciante vereador. E tal possibilidade, claramente, não se apresenta, in casu.
Esclareça-se, todavia, que não há óbice para a prévia autodeclaração de impedimento (rectius: suspeição) de vereador que, por questão de foro íntimo, sinta-se impossibilitado de integrar a Comissão Processante. Entendimento contrário poderia comprometer o correto desenvolvimento dos trabalhos da referida comissão, além de ser oposto à própria lógica do processo político, insuscetível de controle judicial de mérito.
E, como se necessário fosse, deve-se ressaltar que o simples fato de ter o vereador Paulo Messina ocupado posição de destaque no governo do denunciado, como Chefe da Casa Civil, não revela situação que, por si só, sob qualquer perspectiva ético-jurídica, desabone a sua capacidade de votar ou integrar a Comissão Processante.
Da mesma forma, também a própria Recorrente, até setembro de 2017, era a titular da Secretaria de Assistência Social e Diretos Humanos do Governo Crivella, e nem por isso seria legítimo sustentar o seu impedimento ou suspeição para votar no processo de impeachment em curso nesta Casa.
Ora, é inerente ao sistema de presidencialismo de coalizão8 , também instituído na formação dos governos estaduais e municipais do país, que a base de apoio ao governo seja composta por uma pluralidade de partidos políticos, inclusive, com orientações ideológicas distintas em alguns aspectos. Consequentemente a ocupação de cargos importantes na Administração, inerente ao compartilhamento do poder decisório de governo, pode se dar por membros desses partidos da base, sobretudo pelo do próprio Chefe do Executivo. Contudo, jamais seria correto afirmar que tal coalizão pudesse significar alinhamento automático com eventuais más práticas do Chefe de Poder.
Assim, a responsabilidade atribuída ao Prefeito é sobre fato determinado, imputado na denúncia. Trata-se de responsabilidade individual. Ora, não constando na denúncia qualquer alusão, por mais tênue que pudesse ser, de eventual participação, dolosa ou culposa, omissiva ou comissiva, do Vereador Paulo Messina – não sendo ele amigo íntimo, parente, ou advogado do denunciado, jamais seria possível arguir o seu impedimento ou suspeição, mesmo sob a ótica do Código de Processo Penal 9 , caso aplicável fosse.
Cabe, ainda, um simples registro deste parecerista: não consegui identificar nos documentos trazidos pela Recorrente a informação de que o Processo Administrativo nº 04/551.334/2018 tenha tramitado junto à Casa Civil, nem tampouco, que nele tenha havido a prática de ato pelo hoje Vereador Paulo Messina.
Ante o exposto, opino pelo desprovimento do recurso.
À consideração de Vossa Excelência.
Rio de Janeiro, 04 de abril de 2019.
JOSÉ LUIS GALAMBA MINC BAUMFELD
Procurador-Geral
mat. 10/812509-8
¹ A tramitação do aludido processo administrativo foi anexada pela Recorrente.
² “Art. 1º São crimes de responsabilidade dos Prefeitos Municipal, sujeitos ao julgamento do Poder Judiciário, independentemente do pronunciamento da Câmara dos Vereadores:
I - apropriar-se de bens ou rendas públicas, ou desviá-los em proveito próprio ou alheio;
Il - utilizar-se, indevidamente, em proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos;
Ill - desviar, ou aplicar indevidamente, rendas ou verbas públicas;
IV - empregar subvenções, auxílios, empréstimos ou recursos de qualquer natureza, em desacordo com os planos ou programas a que se destinam;
V - ordenar ou efetuar despesas não autorizadas por lei, ou realizá-Ias em desacordo com as normas financeiras pertinentes;
VI - deixar de prestar contas anuais da administração financeira do Município a Câmara de Vereadores, ou ao órgão que a Constituição do Estado indicar, nos prazos e condições estabelecidos;
VII - Deixar de prestar contas, no devido tempo, ao órgão competente, da aplicação de recursos, empréstimos subvenções ou auxílios internos ou externos, recebidos a qualquer titulo;
VIII - Contrair empréstimo, emitir apólices, ou obrigar o Município por títulos de crédito, sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei;
IX - Conceder empréstimo, auxílios ou subvenções sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei;
X - Alienar ou onerar bens imóveis, ou rendas municipais, sem autorização da Câmara, ou em desacordo com a lei;
XI - Adquirir bens, ou realizar serviços e obras, sem concorrência ou coleta de preços, nos casos exigidos em lei;
XII - Antecipar ou inverter a ordem de pagamento a credores do Município, sem vantagem para o erário;
XIII - Nomear, admitir ou designar servidor, contra expressa disposição de lei;
XIV - Negar execução a lei federal, estadual ou municipal, ou deixar de cumprir ordem judicial, sem dar o motivo da recusa ou da impossibilidade, por escrito, à autoridade competente;
XV - Deixar de fornecer certidões de atos ou contratos municipais, dentro do prazo estabelecido em lei.
XVI – deixar de ordenar a redução do montante da dívida consolidada, nos prazos estabelecidos em lei, quando o montante ultrapassar o valor resultante da aplicação do limite máximo fixado pelo Senado Federal; (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XVII – ordenar ou autorizar a abertura de crédito em desacordo com os limites estabelecidos pelo Senado Federal, sem fundamento na lei orçamentária ou na de crédito adicional ou com inobservância de prescrição legal;(Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XVIII – deixar de promover ou de ordenar, na forma da lei, o cancelamento, a amortização ou a constituição de reserva para anular os efeitos de operação de crédito realizada com inobservância de limite, condição ou montante estabelecido em lei; (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XIX – deixar de promover ou de ordenar a liquidação integral de operação de crédito por antecipação de receita orçamentária, inclusive os respectivos juros e demais encargos, até o encerramento do exercício financeiro; (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XX – ordenar ou autorizar, em desacordo com a lei, a realização de operação de crédito com qualquer um dos demais entes da Federação, inclusive suas entidades da administração indireta, ainda que na forma de novação, refinanciamento ou postergação de dívida contraída anteriormente; (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XXI – captar recursos a título de antecipação de receita de tributo ou contribuição cujo fato gerador ainda não tenha ocorrido; (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XXII – ordenar ou autorizar a destinação de recursos provenientes da emissão de títulos para finalidade diversa da prevista na lei que a autorizou; (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
XXIII – realizar ou receber transferência voluntária em desacordo com limite ou condição estabelecida em lei. (Incluído pela Lei 10.028, de 2000)
§1º Os crimes definidos neste artigo são de ação pública, punidos os dos itens I e II, com a pena de reclusão, de dois a doze anos, e os demais, com a pena de detenção, de três meses a três anos.
§ 2º A condenação definitiva em qualquer dos crimes definidos neste artigo, acarreta a perda de cargo e a inabilitação, pelo prazo de cinco anos, para o exercício de cargo ou função pública, eletivo ou de nomeação, sem prejuízo da reparação civil do dano causado ao patrimônio público ou particular.
(...)
Art. 4º São infrações político-administrativas dos Prefeitos Municipais sujeitas ao julgamento pela Câmara dos Vereadores e sancionadas com a cassação do mandato:
I - Impedir o funcionamento regular da Câmara;
II - Impedir o exame de livros, folhas de pagamento e demais documentos que devam constar dos arquivos da Prefeitura, bem como a verificação de obras e serviços municipais, por comissão de investigação da Câmara ou auditoria, regularmente instituída;
III - Desatender, sem motivo justo, as convocações ou os pedidos de informações da Câmara, quando feitos a tempo e em forma regular;
IV - Retardar a publicação ou deixar de publicar as leis e atos sujeitos a essa formalidade;
V - Deixar de apresentar à Câmara, no devido tempo, e em forma regular, a proposta orçamentária;
VI - Descumprir o orçamento aprovado para o exercício financeiro,
VII - Praticar, contra expressa disposição de lei, ato de sua competência ou omitir-se na sua prática;
VIII - Omitir-se ou negligenciar na defesa de bens, rendas, direitos ou interesses do Município sujeito à administração da Prefeitura;
IX - Ausentar-se do Município, por tempo superior ao permitido em lei, ou afastar-se da Prefeitura, sem autorização da Câmara dos Vereadores;
X - Proceder de modo incompatível com a dignidade e o decoro do cargo.”
3 “Art. 29. O Município reger-se-á por lei orgânica, votada em dois turnos, com o interstício mínimo de dez dias, e aprovada por dois terços dos membros da Câmara Municipal, que a promulgará, atendidos os princípios estabelecidos nesta Constituição, na Constituição do respectivo Estado e os seguintes preceitos:
(...)
X - julgamento do Prefeito perante o Tribunal de Justiça”
4 No sentido penal do instituto: "Crime de responsabilidade: definição: reserva de lei.
Entenda-se que a definição de crimes de responsabilidade, imputáveis embora a autoridades estaduais, é matéria de Direito Penal, da competência privativa da União - como tem prevalecido no Tribunal.” (RTJ 168/729, Rei. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE)
5 No sentido da natureza político-administrativa do instituto é a doutrina de ADILSON ABREU DALLARI "Portanto, não pode haver dúvida. Uma coisa é infração penal, comum, disciplinada pela legislação penal. O Código Penal está em vigor, cuidando dos crimes contra a administração publica, que podem ser cometidos, inclusive por Prefeitos. O Prefeito pode perfeitamente ser julgado, pelo Tribunal de Justiça, no caso de cometer peculato, emprego irregular de verbas públicas, concussão, prevaricação, tudo isso não é crime de responsabilidade; tudo isso é crime comum que o Prefeito pode cometer e ser julgado pelo Poder Judiciário.
Ao lado disso, existe o crime de responsabilidade, que e uma infração político-administrativa (...).
Na sistemática constitucional, (...) fica claro que crime de responsabilidade não é infração penal, mas infração político-administrativa (...).”("Crime de Responsabilidade do Prefeito", "in" "Revista do Tribunal de Contas do Estado de São Paulo", vol. 72/146-148)
6 A prevalência da jurisprudência da Suprema Corte pela natureza penal do instituto é assim explicada pelo eminente Min. CELSO DE MELO:
“Não desconheço, Senhor Presidente, na linha dos votos que proferi em diversos julgamentos (Pet 1.656/DF – Pet 1.954/DF – RE 367.297/SP – RE 411.414/MG), que se registra, na matéria em exame, amplo dissídio doutrinário em torno da qualificação jurídica do “crime de responsabilidade” e do processo a que dá origem, pois, para uns, o “impeachment” constitui processo eminentemente político, enquanto que, para outros , ele representa processo de índole criminal (como sucedeu sob a legislação imperial brasileira: Lei de 15/10/1827), havendo, ainda, os que nessa matéria identificam a existência de um processo de natureza mista , consoante revela o magistério de eminentes autores (PAULO BROSSARD DE SOUZA PINTO, “O Impeachment”, p. 75/87, 2ª ed., 1992, Saraiva; PINTO FERREIRA, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. 3/596-600, 1992, Saraiva; MANOEL GONÇALVES FERREIRA FILHO, “Comentários à Constituição Brasileira de 1988”, vol. 2/168-172, 1992, Saraiva; JOSÉ AFONSO DA SILVA, “Curso de Direito Constitucional Positivo”, p. 518-520, 10ª ed., 1995, Malheiros; JOSÉ CRETELLA JÚNIOR, “Comentários à Constituição de 1988”, vol. V/2931-2945, 1991, Forense Universitária; PONTES DE MIRANDA, “Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda nº 1 de 1969”, tomo III/351-361, 3ª ed., 1987, RT; MICHEL TEMER, “Elementos de Direito Constitucional”, p. 165/170, 7ª ed., 1990, RT; JOSÉ FREDERICO MARQUES, “Elementos de Direito Processual Penal”, vol. 3/375, Forense; JOÃO BARBALHO, “Constituição Federal Brasileira – Comentários”, p. 133, 2ª ed., 1924; CARLOS MAXIMILIANO, “Comentários à Constituição Brasileira”, vol. II/105-106, item n. 332, 5ª ed., 1954, Freitas Bastos; AURELINO LEAL, “Teoria e Prática da Constituição Federal Brasileira”, Primeira Parte, p. 480, 1925).
Por entender, Senhor Presidente, que a natureza jurídica do “crime de responsabilidade” permite situá-lo no plano estritamente político- -constitucional, revestido de caráter extrapenal, não posso deixar de atribuir a essa figura a qualificação de ilícito político - administrativo , desvestido, em consequência , de conotação criminal, o que me autoriza concluir – embora diversamente da orientação jurisprudencial prevalecente nesta Suprema Corte (RTJ 166/147 – RTJ 168/729, v.g.) – que o impropriamente denominado “crime de responsabilidade” não traduz instituto de direito penal, viabilizando-se , por isso mesmo, a possibilidade de o Estado-membro sobre ele legislar.” (AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE 4.764 ACRE)
7 Embora o Decreto-Lei nº 201/1967 seja silente quanto à aplicação subsidiária do Código de Processo Penal – ao contrário do que faz a Lei nº 1.079/1950 – poderia até ser sustentada a sua aplicação analógica em casos omissos, na medida em que o processo jus-político de impeachment reveste-se, na visão do STF, de natureza penal quanto aos seus efeitos. Seguindo essa lógica, s.m.j., não faria sentido a aplicação subsidiária do Código de Processo Civil.
8 Sérgio Henrique Hudson de Abranches, em sua obra PRESIDENCIALISMO DE COALIZÃO: O DILEMA INSTITUCIONAL BRASILEIRO , assim explica como são constituídas as coligações políticas de governo: “A formação de coalizões envolve três momentos típicos. Primeiro, a constituição da aliança eleitoral, que requer negociação em torno de diretivas programáticas mínimas, usualmente amplas e pouco específicas, e de princípios a serem obedecidos na formação do governo, após a vitória eleitoral. Segundo, a constituição do governo, no qual predomina a disputa por cargos e compromissos relativos a um programa mínimo de governo, ainda bastante genérico. Finalmente, a transformação da aliança em coalizão efetivamente governante, quando emerge, com toda força, o problema da formulação da agenda real de políticas, positiva e substantiva, e das condições de sua implementação.”
9 Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que:
I - tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
II - ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha;
III - tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;
IV - ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consangüíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.
Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser rec
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ado por qualquer das partes:
I - se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;
II - se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
III - se ele, seu cônjuge, ou parente, consangüíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;
IV - se tiver aconselhado qualquer das partes;
V - se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
Vl - se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo..
Em 04/04/2019
JORGE FELIPPE - Presidente
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