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DECISÃO DO PRESIDENTE
Cuida-se o presente expediente da irresignação do Senhor Vereador Dr. Marcos Paulo à resposta da questão de ordem levantada por S.Exa. no decurso da 14ª Sessão Extraordinária, realizada no pretérito dia 22 de abril.
Naquela ocasião, o Senhor Vereador Marcio Santos, na presidência dos trabalhos, esclareceu que a solicitação de coautoria no Projeto de Lei nº 2031/2016, de autoria do Vereador João Mendes de Jesus, foi negada porque, à época da apresentação da propositura legislativa, o nobre recorrente ainda não exercia o mandato de Vereador a esta Casa de Leis.
Na sua peça de recursão, o Vereador Dr. Marcos Paulo alega, fragilmente, que “não há fundamento regimental para o indeferimento do referido pedido de coautoria ao PL nº 2031/2016.”
Para deslinde dessa demanda, reproduza-se a seguir a orientação regimental a respeito dos termos autoria e apoiamento:
”Art. 196. Considera-se autor da proposição seu primeiro signatário.
§1º As assinaturas que se seguirem a do autor serão consideradas de apoiamento, implicando a concordância dos signatários com o mérito da proposição subscrita.
( ... )”
Observe-se que a redação originária do diploma interno faz, tão somente, alusão à autoria, individualizada, do primeiro subscritor da propositura. Dessa forma, os demais signatários são considerados meros adjuntores de apoiamento.
Ocorre que, nem sempre, uma proposição legislativa possui apenas um único autor. Por diversas vezes, essas mesmas matérias contêm um ou mais Vereadores com indigitação de seus nomes políticos no preâmbulo, indicando que, quando foram apresentados, não continham autores singulares, mas sim outros Vereadores, ou seja, autoria múltipla.
Ora, para resolver essa impropriedade foi lançado o Precedente Regimental nº 30, de 2005, que ofereceu espectro regimental extensivo ao conceito de autoria, na forma que se segue:
“( ... )
2. É admitida a coautoria nessas matérias ( proposições legislativas ), conquanto
que as assinaturas estejam adjuntas ao primeiro signatário e os respectivos nomes sejam assinalados no preâmbulo da proposição legislativa,
( ... ).”
Todavia, essa admissibilidade de coautoria não deve ser interpretada como instrumento de autoria por desiderato próprio. Claro que não, pois como veremos, se assim fosse, cometer-se-ia o pecado abominável de desconstrução léxica, dos vocábulos autoria/coautoria.
Mas antes disso, diga-se aqui por oportuno que a motivação do Precedente Regimental nº 30, ao se referir à coautoria, tinha por fito salvaguardar a noção substantiva de autoria múltipla na apresentação da propositura legislativa, removendo assim qualquer interpretação regimental equivocada no sentido que, afora o primeiro signatário, todas as demais subscrições sejam apenas de apoiamento, ou melhor, de mera concordância e não de construção intelectual do projeto.
Retornando ao assunto da desconstrução lexical, cabe nessa temática de perquirição regimental dos vocábulos autoria e coautoria se reportar à hermenêutica do conceito gramatical dessas palavras. Vejamos, então, semanticamente, a definição desses vocábulos, à luz do dicionário Caldas Aulete:
“autor - criador de obra literária, artística ou científica.
pessoa que faz, realiza, comete, um ato ou fato "
.........................................................................................................................................
“ coautor - a pessoa que faz, cria ou produz algo juntamente com outros.
a pessoa que realiza uma obra,trabalho, em cooperação ou parceria
com outrem.”
Muito embora a redação oficial de projetos legislativos não seja propriamente de criação literária, mas sim não literária, porque não se utiliza de recursos estilísticos, de linguagem estética, a elaboração formal dos atos normativos é idealizada por alguém, por um autor do texto, acompanhado ou não de outra pessoa ( coautor ) e que no processo legislativo municipal somente pode ser exercido consoante o disposto no art. 69 da Lei Orgânica do Município, in verbis:
“Art. 69. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer
membro ou comissão da Câmara Municipal, ao Prefeito e aos cidadãos,
nos casos e na forma previstos nesta Lei Orgânica.”
Por corolário, depreende-se que a iniciativa, qual seja, a apresentação originária no processo legislativo, a autoria só é admissível ao Parlamento, ao Chefe do Poder Executivo e aos cidadãos, neste caso, quando se tratar de projetos de iniciativa popular, que depende de expressivo número de assinaturas de eleitores.
Então, como pode o Vereador Dr. Marcos Paulo avocar a autoria do PL 2031/2016, se, no ano da sua apresentação originária, S.Exa. NÃO exercia mandato de Vereador à Câmara Municipal ? E não termina tão somente com essa interrogação, porque para ser coautor do projeto em tela, é necessário, por aplicação SEMÂNTICA do vocábulo, que S.Exa. tenha efetivamente contribuído para seu aperfeiçoamento ou tenha participado da construção intelectual da propositura legislativa. E isso só pode ser feito por Vereador no pleno exercício do mandato, por força do transcrito art. 69 da Lei Orgânica do Município, com arrimo na simetria do postulado do art. 61 da Constituição da República.
Em sendo dessa forma, o autor de um projeto é aquele que concebe e planeja, intelectualmente, determinado ato de criação legisferante, que no processo legislativo municipal indica o Vereador que o apresenta e seja seu primeiro signatário. Como coautor, entende-se o Vereador coadjuntor que cooperou e participou da gênese normativa e não apenas como concorde da proposta legislativa ( apoiamento ).
Desse modo, haverá coautoria quando o projeto legislativo for criado em comum, por dois ou mais proponentes no exercício do mandato. Embora a coautoria originária seja a mais comum, pode ser também decorrente de forma derivada, quando uma criação intelectual nova resultar na transformação do projeto primígeno por emenda de aperfeiçoamento, porquanto, neste caso, o autor da emenda terá contribuído para o aprimoramento da proposta originária e, assim, poderá solicitar coautoria depois da aprovação, em Plenário, da sua emenda e desde que obtenha a anuência do autor e coautores da proposta primitiva.
Por derradeiro, como visto, o conceito de coautoria deve ser aplicado com rigor semântico, sob pena de se reverter em profanação regimental por sua trivialização.
Diante do exposto neste conciso comentário, a Presidência desta Casa de Leis, à luz da melhor interpretação, DENEGA provimento ao recurso interposto pelo Senhor Vereador Dr. Marcos Paulo.
Publique-se. Encaminhe-se à douta Comissão de Justiça e Redação nos termos do art. 289, §1º, do Regimento Interno.
Em 27/04/2021
CARLO CAIADO - Presidente
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