Não obstante a nobre intenção dos Ilustres Vereadores a matéria foge de sua competência legislativa, de forma que o Projeto padece da mácula insanável da inconstitucionalidade pelas razões abaixo expostas.
Inicialmente, cabe registrar que a Constituição federal através do seu art. 216, impõe ao Poder Público o encargo da promoção e da proteção do patrimônio cultural brasileiro, prevendo diversas formas de acautelamento e preservação, dentre elas o tombamento.
O art. 350 da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro - LOMRJ, por sua vez, esclarece que integram o patrimônio cultural do Município os bens móveis, imóveis, públicos ou privados, de natureza ou valor histórico, arquitetônico, arqueológico, ambiental, paisagístico, científico, artístico, etnográfico, documental ou qualquer outro existente no território municipal, cuja conservação e proteção sejam de interesse público.
Neste diapasão, o art. 196 da Lei Complementar 111, de 1º de fevereiro de 2011, o denominado Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Sustentável do Município do Rio de Janeiro, dispõe que o Patrimônio Cultural do Município é integrado por bens que constituem referência à identidade e à memória dos diferentes grupos e manifestações culturais da Cidade.
No que tange à proteção de bens de natureza imaterial, objeto da proposta em apreço, o art. 141 da sobredita Lei Complementar dispõe que esta deverá ser promovida mediante registro. Tal poder de decisão é privativo do administrador, não competindo ao Poder Legislativo pretender fazê-lo por ato legislativo.
Deste modo, o reconhecimento e/ou a declaração de bens de natureza material, móvel ou imóvel, ou de bens de natureza imaterial como sendo patrimônio cultural do povo carioca ou como sendo de especial interesse histórico, arquitetônico, arqueológico, ambiental, paisagístico, científico, artístico, etnográfico, documental encerra um juízo de conveniência e oportunidade, havendo para o administrador a liberdade para escolha de efetuá-lo ou não, embora o exercício do direito estatal esteja sujeito aos parâmetros da ordem jurídica.
Portanto, o Projeto denota notória interferência legislativa, não autorizada pela Constituição federal, em atividade típica do Poder Executivo, qual seja, a de tombamento de bens, uma vez que esta pressupõe um juízo de conveniência e oportunidade que depende da análise privativa do Prefeito.
A atividade legiferante da Câmara Municipal, no que concerne ao tombamento, está adstrita à proposição de normas genéricas, sendo o ato de tombamento propriamente dito, específico e de efeitos jurídicos concretos, afeto à análise reservada do Chefe do Poder Executivo local.
Assim, ao imiscuir-se em seara que não lhe é própria, o Legislativo municipal ofendeu o princípio da separação e harmonia entre os Poderes estabelecido no art. 2º da Constituição federal, e repetido com arrimo no princípio da simetria, nos arts. 7º e 39 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro e da Lei Orgânica do Município do Rio de Janeiro - LOMRJ, respectivamente.
Pelas razões expostas, sou compelido a vetar integralmente o Projeto de Lei nº 486, de 2021, em função dos vícios de inconstitucionalidade e de injuridicidade que o maculam.
Aproveito o ensejo para reiterar a Vossa Excelência meus protestos de alta estima e distinta consideração.
Texto Original: Legislação Citada Atalho para outros documentos Informações Básicas
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