Comissão Permanente / Temporária
TIPO : AUDIÊNCIA PÚBLICA

Da COMISSÃO ESPECIAL DO PLANO DIRETOR

REALIZADA EM 03/24/2022


Íntegra Audiência Pública :

COMISSÃO ESPECIAL DO PLANO DIRETOR

ÍNTEGRA DA ATA DA AUDIÊNCIA PÚBLICA REALIZADA EM 24 DE MARÇO DE 2022

(Aplicação de instrumentos de gestão do uso e ocupação do solo, ambiental e de patrimônio cultural)

Presidência do Sr. Vereador Rafael Aloisio Freitas.

Às 10h13, em ambiente híbrido, sob a Presidência do Sr. Vereador Rafael Aloisio Freitas, Presidente, com a presença dos Srs. Vereadores Tainá de Paula, Vice-Presidente; Tarcísio Motta, Sub-Relator; Jorge Felippe, Sub-Relator; e Pedro Duarte, Membro Suplente tem início a Audiência Pública da Comissão Especial do Plano Diretor, com o tema: “Aplicação de instrumentos de gestão do uso e ocupação do solo, ambiental e de patrimônio cultural”, com a presença de representantes da Secretaria Municipal de Planejamento Urbano.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Nos termos do Precedente Regimental nº 43/2007, dou por aberta a Audiência Pública, em ambiente híbrido, da Comissão Especial do Plano Diretor com o tema: “Aplicação de instrumentos de gestão do uso e ocupação do solo, ambiental e de patrimônio cultural”.
A Comissão Especial está assim constituída: Vereador Rafael Aloisio Freitas, Presidente; Vereador Alexandre Isquierdo, Vice-Presidente; Vereadora Rosa Fernandes, Vice-Presidente; Vereadora Tainá de Paula, Vice-Presidente; Vereador Dr. Rogério Amorim, Relator-Geral; Vereador Jorge Felippe, Sub-Relator; Vereador Tarcísio Motta, Sub-Relator; Vereadora Tânia Bastos, Membro Efetivo; Vereador Átila A. Nunes, Membro Efetivo; Vereador Dr. Gilberto, Membro Suplente; Vereador Pedro Duarte, Membro Suplente; e Vereador Vitor Hugo, Membro Suplente.
Para constatar o quórum necessário à realização desta Audiência Pública, procederei à chamada dos membros presentes.
Vereadora Tainá de Paula.

A SRA. VEREADORA TAINÁ DE PAULA – Presente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Vereador Jorge Felippe.

O SR. VEREADOR JORGE FELIPPE – Presente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Vereador Tarcísio Motta.

O SR. VEREADOR TARCÍSIO MOTTA – Presente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Vereador Pedro Duarte.

O SR. VEREADOR PEDRO DUARTE – Presente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Há quórum para a realização desta Audiência Pública.
Esta Audiência Pública conta com a presença dos seguintes Senhores Vereadores: Chico Alencar; Dr. Rogério Amorim; Marcio Santos; Rocal; Rosa Fernandes; Tânia Bastos; Teresa Bergher; Vitor Hugo; Welington Dias; Zico.
A Mesa está assim constituída: Vereador Rafael Aloisio Freitas; Vereadora Tainá de Paula; Vereador Tarcísio Motta; Vereador Pedro Duarte; Vereador Dr. Rogério Amorim; e Senhora Valéria Hazan, Gerente de Macroplanejamento da Secretaria Municipal de Planejamento Urbano (SMPU).
Esta Audiência conta ainda com as seguintes presenças: Senhor Flavio Andrade de Carvalho Britto, Subprocurador-Geral da Câmara Municipal do Rio de Janeiro; Senhor Lucas Alencar Faulhaber Barbosa, Vice-Presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Rio de Janeiro (CAU/RJ); Senhora Tarcyla Fidalgo, representando o Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico (IBDU); Senhor Henrique Barandier, Coordenador de Projetos da Área Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do Instituto Brasileiro de Administração Municipal (Ibam); Senhora Isabel Tostes, Presidente da Sociedade de Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro (Seaerj); Senhor Fabricio Leal de Oliveira, representando o Diretor-Presidente do Instituto de Pesquisa  e Planejamento Urbano e Regional (Ippur), o Senhor Martim Oscar Smolka; Senhora Bernadete Montesano, da Rede Carioca de Agricultura Urbana; Senhora Bruna Miceli, da Associação de Macroplanejamento da Prefeitura; Senhora Viviane Santos Tardeli, Defensora Pública do Núcleo de Terras e Habitação (Nuth) da Defensoria  Pública do Estado Rio de Janeiro; Senhor Manoel Ribeiro,  representando o Senhor Igor de Vetyemy, Copresidente do Instituto de Arquitetos do Brasil do Rio de Janeiro (IAB RJ); Senhor Frederico Price Grechi, Presidente da Comissão de Direito Urbanístico e Agrário do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB); Senhor Victor Carvalho Pinto, Professor e Coordenador do Núcleo Cidade e Regulação do Laboratório Arquitetura Futuro de Cidades do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper); e Senhor Martim Oscar Smolka, Diretor do Programa para a América Latina e o Caribe do Lincoln Institute of Land Policy (LILP).
Só para a gente passar um comunicado, a Comissão do Plano Diretor fez uma reunião entre seus vereadores para a gente sempre tentar organizar da melhor forma essa metodologia das audiências para a gente conseguir ser mais, cada vez mais, eficientes nessas apresentações.
Todas as audiências aqui na Câmara começarão com uma apresentação do representante do Poder Executivo, que terá 15 minutos para a fala. Depois, um representante do Ibam, que também terá até 15 minutos para a sala.
Algumas pessoas que nos solicitam fazer apresentações por slides, que vão mostrar apresentações, a gente vai dar 10 minutos para essas apresentações. Quem for fazer as falas da Tribuna ou on-line, sem apresentação, serão cinco minutos de fala.
A gente também meio que terminou de fazer o planejamento, o cronograma, das audiências que vão até o final desse primeiro semestre, até junho.
Além das audiências temáticas que hoje a gente vai fazer dessa parte de instrumentos de política urbana, a próxima também vai ser com esse mesmo tema. Depois, vai ter uma de parcelamento do solo, duas de uso e ocupação do solo. Depois, três setoriais com o setor de indústria, comércio e serviços.
Depois, aproximadamente, dia 25 de maio, começaremos com as audiências territoriais, começando pela Área de Planejamento (AP) 1; depois, AP- 2.1, AP-2.2; aí vai passar para a AP-5, lá na Zona Oeste: AP-5.1, AP-5.2, AP-5.3, AP- 5.4. Depois, a AP-4: AP-4.1, AP- 4.2, e se for preciso fazer uma terceira também. Então, até o final de junho, essa é a programação das audiências da Comissão do Plano Diretor.
Com a palavra, a Senhora Valéria Hazan, Gerente de Macroplanejamento da SMPU, que dispõe de 15 minutos para fazer a sua apresentação.

A SRA. VALÉRIA HAZAN – Senhor Presidente, senhores vereadores, senhoras e senhores, estou aqui, hoje, representando o Secretário de Planejamento Urbano, Washington Fajardo que, por motivos de compromissos anteriormente agendados, não está presente, mas que estará aqui na próxima audiência.
Enquanto estão ligando aqui para passar a apresentação, como Poder Executivo, a gente se sente na obrigação de ser um pouco didático na apresentação. Por isso, assim, peço desculpas aos especialistas presentes aqui no Plenário se parecer um pouco básica a apresentação; mas nós estamos aqui à disposição para tirar quaisquer dúvidas mais objetivas e detalhadas sobre os instrumentos...

(Inicia-se a apresentação de slides)

A SRA. VALÉRIA HAZAN – Bom, primeiro, eu quero explicar que tanto eu quanto o Secretário Fajardo já explicamos um pouco sobre esse encadeamento entre os Títulos do Plano Diretor. Mas para quem começa a nos acompanhar, é importante registrar que no dia 10 de março nós discutimos aqui o Título I, que representa os desejos que se têm para cidade nos próximos 10 anos.
No dia 17 de março, semana passada, nós discutimos aqui a territorialização desses desejos a partir do macroordenamento territorial. Hoje e na semana que vem, nós vamos discutir as ferramentas para se atingir esses objetivos. E, nas semanas seguintes, vamos discutir o Título IV e o Título V, Parcelamento, Uso e Ocupação do solo, que são as normativas que, juntamente com essas ferramentas, nós estamos trazendo para atingir esses desejos expostos no Título I. Ao final das audiências, segundo o cronograma da Câmara, em agosto, nós vamos trazer o Título VI, que é como vamos fazer essa implementação com uma gestão democrática e participativa nos próximos 10 anos.
Nesse sentido, eu tenho que fazer um breve retrospecto sobre a dinâmica imobiliária na cidade na última década.
Ainda está em vigorando a Lei Complementar nº 111/2011, que é o Plano Diretor em vigor. Embora apresentasse a região do Porto e da Zona Norte como macrozona incentivada de ocupação, onde há décadas a gente entende – e foi bastante discutido na semana passada – a necessidade de retornar com os investimentos e ampliar o adensamento construtivo residencial nessa região, a gente não conseguiu, com os mecanismos do Plano em vigor, fazer com que isso ocorresse.
Nós temos que – por coleta das informações dos projetos licenciados –, na última década, a cidade cresceu efetivamente para onde a gente não queria, para a AP-4, que é a região da Baixada de Jacarepaguá e para AP-5, na Zona Oeste da cidade.
Com isso, o gráfico mostra que nós já temos um desequilíbrio fiscal contínuo porque crescemos onde ainda precisamos investir muito. Como vemos aqui, por dados disponíveis no Data Rio, enquanto temos, na AP-1 e na AP-3, mais de 80% das áreas com infraestrutura e urbanizadas, nós temos, nas AP-4 e AP-5, menos de 40%. A continuidade desse espraiamento gera esse desequilíbrio fiscal constante com a expansão da cidade, a necessidade de rede de saneamento básico, transporte, além dos equipamentos sociais como sabemos.
Portanto, a gente vê esse quadro refletido no ordenamento territorial vigente, com índices de aproveitamento do terreno do Plano Diretor de 2011, em que a gente demonstra, nas cores mais escuras de vermelho, onde os índices são mais altos; e os tons de amarelo mostram onde os índices de aproveitamento do terreno variam entre 1 até 5. A gente vê que, tanto na ÁP-3 como na região de Jacarepaguá e no entorno de Campo Grande, eles têm praticamente a mesma possibilidade de ocupação em relação aos coeficientes de aproveitamento sem nenhum tipo de desestímulo efetivo.
Nesse ordenamento territorial proposto pelo Poder Executivo que aqui está em debate – e foi bastante debatido desde 2018 entre equipes técnicas e, depois, em grupos mais ampliados –, a gente traz as sete macrozonas de ocupação. A gente cria, então, esse conceito do Supercentro, também já tão explicado pelo Secretário Fajardo: de ampliar e, realmente, incentivar esse adensamento na região que vai do Centro, passa pela Zona Norte e o corredor da Avenida Brasil, numa faixa mais reduzida.
É claro que esse macrozoneamento, quando detalhado no zoneamento urbanístico que a gente vai ver nas próximas... Vocês vão verificar que todas os bairros na Zona Norte, nos seus miolos, estão bastante preservados nas suas ambiências, mas o grande desenho macro é essa expressão que nós queremos passar. Com a proteção ambiental, principalmente na AP-4, como já foi inclusive decretado pelo Prefeito Eduardo Paes, nessa semana, com a APA de Vargens.
Então, chegando, para tentar ser mais breve, mas eu tinha que fazer esse retrospecto, chegando ao Título III, esse título é muito extenso, bastante complexo, então a gente vai tentar ser bastante didático sobre ele, trazendo aqui um pouquinho de cada capítulo. São 10 capítulos, sendo 75 artigos. Ele foi bastante debatido no grupo de trabalho realizado no passado, então, com diversos especialistas, que trouxeram contribuições muito interessantes para a redação da lei.
A gente tem o primeiro capítulo, que é a introdução; no Capítulo II, a gente vai tratar dos instrumentos de planejamento urbano; no III, a gestão do uso e ocupação do solo; no IV, da função social e ambiental da propriedade; no V, acesso à terra e moradia; no VI, os instrumentos de estruturação urbana; no VII, de gestão ambiental; no VIII, gestão do patrimônio cultural; no IX, os instrumentos financeiros orçamentários; no X, regularização urbanística, edilícia e ambiental. Alguns desses instrumentos, eles aparecem como num cardápio, com um glossário para que possam ser utilizados ao longo da próxima década.
Outros já são detalhados e autorregulamentados aqui na lei. A gente vai começar com os instrumentos de planejamento urbano, de uma forma bem básica, mas explicar quais são e para que eles funcionam. Então, a gente tem os planos regionais, que são os planos dedicados à articulação das políticas setoriais nas 16 regiões de planejamento que existem na cidade.
São planos que devem vir a ser coordenados pelo escritório de planejamento da Secretaria de Fazenda, trazendo então esse detalhamento da articulação das políticas setoriais. Os planos setoriais detalham os programas e ações das políticas públicas. Nós já temos vários desses planos em vigor, como o Plano Municipal de Cultura, Plano de Mobilidade Urbana Sustentável, Plano da Mata Atlântica.
O Projeto de Estruturação Urbana (PEU) ganhou uma nova característica. Então, quando a gente traz toda a normativa de uso e ocupação do solo, que hoje vigora em cerca de 40 leis e decretos na forma de PEUs, e a gente traz isso para o Plano Diretor, o PEU ganha uma característica de projeto urbanístico para os espaços públicos, de desenho urbano na escala da quadra e a indicação das ações estruturantes fundamentadas em políticas setoriais mais próximas ao que a sociedade civil precisa na sua vizinhança.
Passando para os instrumentos de gestão do uso e ocupação do solo, no Capítulo III, eles estão aqui elencados para subsidiar a gestão pública do solo urbano com as ferramentas de redistribuição dos ônus e bônus da política urbana para uma cidade mais justa. E aí, sim, eles estão mais detalhados, em geral, do que os outros instrumentos.
A gente traz aqui a outorga onerosa do direito de construir e alteração de uso, a transferência do direito de construir, a readequação do potencial construtivo no lote, o direito de superfície e as áreas de especial interesse. Importante dizer que esses instrumentos têm seu suporte teórico desde o Estatuto da Cidade, de 2001. Eles já estão presentes no Plano Diretor de 2011. Alguns deles já foram utilizados parcialmente pelo Poder Executivo nos últimos anos, mas a gente traz aqui, a partir dessas experiências, tanto da Cidade do Rio como experiência de outras cidades, uma revisão e uma autorregulamentação deles.
Eu vou tentar ser um pouco mais breve. Então, a outorga onerosa do direito de construir é um conceito bastante antigo, vem da ideia do solo criado, já vigora há décadas em outros países.
Como vai ter uma fala do Martim Smolka, eu vou passar um pouco mais rápido, porque, provavelmente, ele vai explicar bem melhor do que eu essa teoria, mas a base é a separação do direito de propriedade do direito de construção, em que o proprietário do terreno pode utilizar o coeficiente básico, sem contrapartida, e o coeficiente máximo, mediante contrapartida.
Isso dá uma mudança bastante intensa na prática para a cidade. E, por que esse instrumento? Para dar equidade nas ações de planejamento urbano e a distribuição dos ônus e bônus da urbanização, levando recursos para habitação de interesse social, equipamentos públicos, preservação do patrimônio histórico e ambiental.
A outorga onerosa já vigora em quase todas as capitais do Brasil, salvo algumas capitais no Norte do Brasil e em Vitória que, no seu Plano Diretor, aponta, mas não regulamenta, da mesma forma que o Rio de Janeiro fez em 2011. Então, é uma normativa que tem funcionado já bastante bem no Brasil, não só nas capitais, mas também em inúmeras cidades de porte médio por todo o Brasil.
Porto Alegre, que tem um mercado imobiliário talvez similar ou um pouco menor do que do Rio de Janeiro, arrecadou R$ 144 milhões com outorga de 2014 a 2016 e São Paulo, onde teve a primeira normativa sobre outorga onerosa no Plano Diretor de 2004 e que, depois, foi revisto no Plano de 2014. Pelos dados da plataforma gestão urbana, arrecadou de 2004 a 2021, R$ 4,590 bilhões.
No caso do Rio de Janeiro, como o Plano Diretor de 92, bem antes do Estatuto da Cidade, já trazia a prerrogativa do Índice de Aproveitamento do Terreno (IAT) para toda cidade com uma regulamentação posterior foi feito um projeto de lei que veio para essa Casa e nunca foi aprovado.
Portanto, não vigorou, mas está lá no Plano de 92, Lei Complementar nº 16/92. Então, veio o Estatuto da Cidade, em 2001, trazendo subsídios para os municípios. Em 2009, foi aprovada aqui pela Câmara a operação urbana consorciada do Porto Maravilha que já fez as modificações no Plano 92 e cobra outorga na forma de Certificado de Potencial Adicional de Construção (Cepac), trazendo coeficientes básicos de aproveitamento 1 para toda região do porto e chegando até 15 mediante pagamento.
O PEU das Vargens também aprovado aqui em 2009, Lei Complementar nº 104, agora parcialmente deixou de vigorar em função da Área de Proteção Ambiental (APA), mas também traz a cobrança de outorga onerosa e não com coeficiente 1, com coeficientes variados por setor, mas já vigora desde 2009 e já arrecadou mais R$ 300 milhões para os cofres públicos.
O Plano de 2011 não houve um consenso em função da outorga e foi definido então, nessa lei complementar, que os IATs eram variados, basicamente repetimos da legislação que já estava em vigor e a cobrança poderia ser feita por outorga em área de operação urbana como no porto ou em área de especial interesse urbanístico. Na prática, a outorga no Rio de Janeiro só vigora no Porto Maravilha, no PEU das Vargens e na Área de Intervenção Urbana (AIU), área de especial interesse urbanístico, do Engenhão, mas que arrecadou quase nada, porque, quando foi regulamentada, perdeu o boom imobiliário.
Na verdade, nós estamos bastante atrasados na implementação da outorga onerosa e aí, no Plano de 2021, Projeto de Lei Complementar nº 44, a gente traz da proposta do Coeficiente de Aproveitamento Básico nº 1 para toda cidade com a variação dos coeficientes de aproveitamento máximos que vão ser discutidos posteriormente já autoaplicável.
Em função de discussões internas entre as equipes da Prefeitura, com a participação da equipe da Secretaria de Fazenda e também com a discussão com o mercado imobiliário, é proposto então um período de transição bastante extenso em que a gente faz a diminuição progressiva do coeficiente de aproveitamento básico ao longo dos anos.
Como é que vai funcionar? Esse outro slide é um pouco mais didático. Então, o empreendimento, por exemplo, na Zona Sul que hoje tem um IAT em vigor de 3,5, que é o índice de aproveitamento do terreno que permite ele utilizar três vezes em meia área do terreno que ele tem, a partir do primeiro ano o coeficiente básico passa a ser 3, depois 2,5, 2 até chegar ao coeficiente 1. O que significa? Que, na prática, vai ser paga outorga onerosa sobre essa diferença.
No primeiro ano, vai ser o 3,5 menos 3; no segundo ano, a diferença sobre 1 que é o 3,5 menos 2,5 e assim progressivamente. Essa foi uma proposta mais conciliatória, mas que claro vai ser discutida aqui pelos senhores vereadores. As finalidades da outorga são as mesmas que estão previstas no Estatuto da Cidade, que é exatamente para a aplicação dessas demandas que a cidade tem sobre a política urbana, para regularização fundiária, implantação de equipamentos públicos, proteção de áreas de interesse histórico, projetos habitacionais.
A fórmula de cálculo é bastante simples. Ela, na verdade, é baseada no IPTU e é uma diferença sobre essa área total edificável que você tem com o coeficiente básico e sobre o coeficiente que vai vigorar. Esse índice de 0,80 é o fator de desconto, porque tem que ser mais interessante para o proprietário pagar uma outorga onerosa para ampliar o coeficiente do seu terreno do que comprar um terreno vizinho pelo que ele teria, no caso, de adicionar o coeficiente.
O fator de interesse social é para algumas situações em que não se deseja cobrar a outorga e tem um desconto no valor. Pode passar, por favor. Não incide outorga, então, para habitação de interesse social, para hospitais, escolas públicas, unidades administrativas públicas, enfim, instituições de cultura, esporte e lazer, para habitação do mercado popular até R$ 250 mil. Esse valor pode ser um pouco ajustado, mas o fator é 0,6 e, no caso dos hospitais, o fator é 0,25.
Passando, então, para a transferência do direito de construir, a gente tem que ter certo cuidado. Aí, é um instrumento também que gera bastante discussão. A transferência do direito de construir – se aplicada como em muitos municípios ocorre – gera um mercado paralelo à outorga, que fica nas mãos do privado e que o Poder Executivo perde um pouco o controle. Portanto, a opção desta lei foi permitir a transferência do direito de construir em áreas de operação urbana consorciada, como hoje já é previsto no nosso Plano, uma operação urbana simplificada ou área de especial interesse. Porque requer um estudo prévio, por conta do Poder Executivo, em relação a como esse potencial vai ser utilizado, definindo áreas receptoras e áreas doadoras.
Aqui no Rio nós utilizamos a transferência do direito de construir para o Parque Nelson Mandela, na Barra da Tijuca, em 2013. Para que ela funciona? Quando há um interesse público para implantação de equipamentos urbanos, preservação de imóveis de interesse histórico, regularização fundiária.
Basicamente, explicando um pouquinho rapidamente aqui esses gráficos, se você tem um terreno com imóvel tombado e não pode modificar nada no seu terreno, você ganha esse direito, nessas áreas previstas, de vender o potencial equivalente à área do seu imóvel para outro proprietário que queira empreender em outro lugar, mas isso tudo tem que ser bastante regulado e por isso só nessas áreas especificadas.
Pode passar, por favor. Aí temos um instrumento carioca, que é a readequação do potencial construtivo no lote, que vigora por processo desde o Plano de 2011. Ele funciona bastante bem, principalmente nas situações vinculadas a imóveis preservados, tombados e também no caso de readequação em função dos projetos aprovados de alinhamento. Mas, com 10 anos de aplicação, nós também fizemos algumas revisões em relação à utilização desse instrumento e temos, então, ele também já todo autorregulamentado aqui no Plano Diretor, nos arts. 106 a 110.
A diferença para a transferência, basicamente, é que você faz uma readequação no próprio lote – não pode transferir para outro lote o potencial e ele pode ser utilizado em terrenos com imóveis protegidos, em áreas de preservação de interesse ambiental e nos casos de implantação de projeto de alinhamento.
As áreas de especial interesse são áreas, transitórias ou permanentes, que se sobrepõem ao zoneamento. São instrumentos bastante utilizados pelo Poder Executivo e são declaradas por norma específica, por decreto ou por lei para definir as abrangências, os objetivos e as ações específicas. Elas servem para implementação de políticas setoriais alinhadas à política urbana em territórios específicos.
Tem aí condições específicas para algumas dessas áreas, como as áreas de especial interesse urbanístico, ambiental ou sociocultural, que podem suspender o licenciamento de construções e parcelamento do solo. Foi o caso, por exemplo, em Vargens, que foi feita área de especial interesse ambiental, suspendeu por um período o licenciamento, até que fosse criada, então, a APA.
Temos um detalhamento bastante interessante sobre as áreas de especial interesse social. É importante dizer que eu não vou parar aqui para falar sobre isso, mas todas as áreas de especial interesse social vigentes permanecem vigorando aqui pela proposta do Poder Executivo no Plano Diretor.
Sobre os instrumentos da promoção da função social e ambiental da propriedade no Capítulo IV, eles vêm desde a Constituição de 1988 e já estavam previstos no Plano Diretor de 1992. Temos alguns artigos também na Lei Orgânica do Município e novamente no Plano Diretor de 2011. Eles contribuem para a redução de vazios urbanos em áreas infraestruturadas, para a ampliação da oferta de imóveis. Também tem uma novidade aqui que é voltada para serviços ambientais para a cidade.
Nós estamos falando do parcelamento, edificação e utilização compulsória, chegando ao IPTU progressivo e à desapropriação para pagamentos em títulos e arrecadação de imóveis, que também já está prevista no Código Civil. E também, já vigorando aqui na cidade na forma de decreto, mas que teve uma alteração pela de Lei Federal de 2017 – a regularização fundiária. Então, a gente traz também uma regulamentação para o Plano Diretor e a utilização dos terrenos para a função socioambiental.
A gente traz o Parcelamento, Edificação, Utilização Compulsória (Peuc), que já foi objeto de bastante discussão aqui. Depois do desabamento daqueles edifícios aqui na Cinelândia em 2012, foi montado um grupo de trabalho no âmbito do Poder Executivo, na própria gestão do Eduardo Paes. Nós encaminhamos um Projeto de Lei para a Câmara em que regulamentávamos o que estava previsto no Plano de 2011 e esse Projeto de Lei não foi aprovado. Depois foi feito um substitutivo por um vereador, nós voltamos a rediscuti-lo em 2015, foi feita audiência pública.
Agora a gente fez uma nova revisão e traz, então, todo esse instrumento com a sua regulamentação para o Plano Diretor já adequado às propostas atuais. E a gente já define aqui nas áreas de aplicação, podendo ser aplicado na macrozona de controle da ocupação e na macrozona de estruturação urbana, porque são as áreas mais infraestruturadas da cidade, onde não se deseja ficar com vazios urbanos. Ele vai precisar de um instrumento específico, um decreto, para definir as áreas prioritárias, mas já está todo autorregulamentado.
Passando então para o Capítulo V, dos Instrumentos de Acesso à Terra e Moradia, são instrumentos muito utilizados pela Secretaria Municipal de Habitação que, certamente, vão ter uma reverberação e uma discussão mais aprofundada no Plano Municipal de Habitação que está sendo conduzido pela Secretaria de Habitação. Eles já são utilizados. Como eu falei, muitos deles também já estão previstos em legislação federal. Então, aqui eles aparecem de uma forma geral como um cardápio e contribuem para a democratização do acesso à terra urbanizada e para a titularidade da terra de forma individual ou coletiva.
A gente traz, como novidade, a partir de uma proposta trazida pelo ComCat, que é um coletivo de Comunidades Catalisadoras, o termo territorial coletivo. Eu também não vou me deter nele – temos uma especialista aqui no assunto que trouxe bastante conteúdo para esta sessão, a Tarcyla, que provavelmente vai explicar melhor a vocês.
Passando para o Capítulo VI, a gente vai para os Instrumentos de Estruturação Urbana, que são os instrumentos que viabilizam as intervenções integradas no território, visando transformações urbanísticas, sociais e ambientais. A mais complexa delas é a Operação Urbana Consorciada. Nós temos aqui em vigor a operação do Porto, e, como eu já expliquei, nós fizemos também uma operação em 2013 do Parque Nelson Mandela, com objetivo bem diferente do da operação urbana no Porto. Achamos que são bastante complexos esses procedimentos de operação urbana para uma cidade como o Rio, então temos uma alternativa de operações urbanas simplificadas que vêm inspiradas nos Projetos de Intervenção Urbana (PIUs) de São Paulo.
Consórcio imobiliário e concessão urbanística são instrumentos já bastante antigos. A operação interligada vem atrelada ao Projeto Reviver Centro, que foi aprovado aqui no ano passado. Então, ela vem amarrada à forma de aplicação do Reviver Centro. O reajuste de terrenos é um instrumento bastante interessante também de uma intervenção integrada em parcelamento do solo. Isso deve ser discutido mais no âmbito do Título IV. Ele já é aplicado na Colômbia, no Japão, em diversos outros países, não prevista no Estatuto da Cidade, mas que pode também ser bem interessante para proprietários.
Estou tentando ser o mais breve possível, está terminando. Passando para o Capítulo VII, a gente traz os instrumentos de gestão ambiental que visam à proteção do meio ambiente do município – diversos deles já vigoram. É um texto que foi todo revisado pela equipe da Secretaria de Meio Ambiente, já pensando também nele interligado com o Código Ambiental, que em breve também virá para esta Casa.
É o cardápio dos instrumentos, com todas as suas características. Em alguns casos, a gente tem a definição também muito vinculada ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), que é a legislação federal. E, em outros casos, a gente está revendo de uma forma mais detalhada em outros fóruns, como a questão da medida compensatória, que também está sendo debatida num outro grupo pela SMDEIS e SMAC.
Passando, então, para o Capítulo VIII, os instrumentos de gestão do patrimônio cultural. Os instrumentos de gestão do patrimônio cultural que visam à proteção do patrimônio cultural de natureza material, imaterial e o patrimônio arqueológico, e também tem todo um trabalho revisto e adequado ao trabalho atual pela equipe do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade.
Aqui a gente traz esse cardápio, uma explicação didática de como funcionam esses instrumentos para a preservação do patrimônio cultural da cidade, que é riquíssimo. São mais de dez mil imóveis preservados; temos três sítios do patrimônio da humanidade da Unesco, como a gente já explicou aqui semana passada.
Passando para os instrumentos financeiros, orçamentários e tributários no Capítulo IX, que é o penúltimo: são os instrumentos que servem para a contribuição com fontes de recursos para execução das políticas urbana, ambiental, de habitação e patrimônio. Basicamente, estamos falando aqui dos fundos municipais – a Cidade do Rio tem muitos fundos. Não tratamos de todos aqui, por uma orientação da Procuradoria do Município. Nós tratamos como regulamentação dos fundos que já estão no Plano Diretor de 2011. E, dessa forma, ajustamos.
Foi uma discussão bastante intensa com o grupo que trabalhou também sobre o Título VI em relação aos próximos 10 anos. E nisso a gente teve o desdobramento também com a Secretaria de Meio Ambiente, com o pessoal do Patrimônio, com a Secretaria de Habitação sobre as normativas, as regras em relação aos fundos específicos.
Por último, nós temos, no Capítulo X, os instrumentos de regulação urbanística, edilícia e ambiental. Para que eles servem? Eles instituem as regras específicas para parcelamento e ocupação do solo, construções, reformas, licenciamento e fiscalização. Eles estão previstos, de uma forma mais genérica, na Lei Orgânica do Município. Também estão mencionados e descritos no Plano Diretor em vigor. E as normas de parcelamento do solo já estão aqui no Título IV, sendo autoaplicadas, e as normas de uso e ocupação, no Título V. As normas de edificações estão já no Código de Obras, aprovado recentemente aqui também na Câmara. O Código de Licenciamento e Fiscalização...
Nós trazemos aqui uma normativa que foi toda trabalhada pela equipe da Secretaria da SMDEIS. Ele vai virar como um Código de Licenciamento e Fiscalização por lei específica, conforme exigido pela Lei Orgânica do Município. Por isso não entrou no Plano Diretor.
Em síntese, é isso. Deixo aqui a plataforma Plano Diretor.Rio. Lá tem todo o conteúdo do Poder Executivo. Inclusive essa apresentação também vai pra lá, ficar disponível. Estou aqui à disposição para o debate.
Agradeço. Muito obrigada.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Valéria Hazan, pela apresentação.
Convido agora o Senhor Henrique Barandier, do Ibam, que dispõe de 10 minutos para fazer a apresentação.

O SR. HENRIQUE BARANDIER – Bom dia, Vereador Rafael Aloisio Freitas, demais vereadores, todos os presentes aqui na sala, no Zoom ou no YouTube.
Se puder colocar o mapinha que eu separei...
Eu vou destacar alguns aspectos depois desse panorama que a Valéria conseguiu fazer do conjunto de instrumentos. Eu não tenho a pretensão aqui de tratar de todos os instrumentos, mas selecionamos alguns aspectos. Parece-nos importante aprofundar um pouquinho, marcar a importância conceitual deles para a compreensão do conjunto de instrumentos, buscando também, em alguns momentos, correlacionar com os Títulos que a gente viu nas semanas anteriores,
de Princípios e Objetivos, e de ordenamento do território.
O nosso papel aqui é de sempre fazer esse exercício de tentar marcar, explicar alguns assuntos relevantes do Plano, seja por introduzirem novidades, seja por alterarem a legislação vigente, seja por terem fundamentos que ajudam a gente a compreender o Plano como um todo ou o potencial dos instrumentos previstos.
O primeiro aspecto, muito rapidamente, que eu queria chamar a atenção nesses planos gerais de planejamento do plano setorial, dos planos regionais e dos PEUs... Só para marcar um destaque que a Valéria falou: é importante a mudança do caráter do PEU. Essa sigla PEU está mudando de sentido.
A gente se acostumou, na legislação do Rio de Janeiro, a ser um instrumento para adaptação da legislação urbanística às características locais. Ele deixa de ter esse papel. Ele é agora tratado como um projeto urbanístico e que pode promover alteração da legislação somente enquanto se tratar de operação urbana, consorciada, operação simplificada ou área de especial interesse. Então, essa é uma mudança importante do nosso conjunto de instrumentos.
Eu vou entrar com mais detalhe na questão dos coeficientes e nessa diferenciação entre coeficiente de aproveitamento máximo, básico e mínimo. A gente começou falando disso na semana passada, mas cabem algumas considerações adicionais. Primeiro, do coeficiente máximo, voltando a esse conceito. Ele indica o potencial construtivo máximo que pode ser atingido num terreno em função da zona em que ele se situa, podendo ser limitado por outros parâmetros urbanísticos. A gente diria que esse é um coeficiente estabelecido por critérios urbanísticos, seja pela leitura do território, seja pelo que se deseja para esse território. Ele define o adensamento possível.
Aquele número, que é o coeficiente, representa quantas vezes a área do terreno pode ser multiplicada para dar a área construída máxima de um terreno. A princípio, quanto mais alto o coeficiente de aproveitamento máximo, ele representa um maior estímulo ao aproveitamento do solo. Porém, eu queria fazer uma ponderação: o coeficiente muito alto, em si mesmo, não é suficiente, me parece, para induzir a ocupação de uma área. Existe uma série de outros fatores que devem ser considerados para a implementação de uma estratégia de indução do desenvolvimento maior ou menor, de maior ou menor adensamento de áreas da cidade, embora o coeficiente de aproveitamento máximo seja relevante.
No Rio de Janeiro, que tem uma atuação de mercado muito concentrada, como vimos aqui pela apresentação, na AP-4 e na AP-5, para alcançar os objetivos do plano, nos parece que não basta oferecer índices, ofertar índices. Eventualmente, não basta nem mesmo promover investimentos onde se quer estimular um maior aproveitamento do solo. Talvez, tenha que se pensar se não seria necessário desestimular o aproveitamento do solo em determinadas áreas, por exemplo, com a introdução de restrições mais importantes aos parâmetros urbanísticos.
Outra questão que é importante quando a gente analisa os coeficientes... achei que já estava no mapa.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – A apresentação está pronta?

O SR. HENRIQUE BARANDIER – É só passar o slide.

(Inicia-se a apresentação de slides)

O SR. HENRIQUE BARANDIER – São as macrozonas com os coeficientes de aproveitamento indicados, que são esses números que estão distribuídos. A discussão de indução do adensamento não se resume a uma simples comparação numérica dos índices de aproveitamento. Por que estou dizendo isso? Porque em algumas áreas, por exemplo, onde tem terrenos muito grandes e glebas muito grandes, um índice, mesmo comparativamente menor, por exemplo, um índice 2, pode representar a possibilidade de grandes construções, porque você está tratando em cima de uma base de terreno bastante grande.
A estratégia tem a ver também com o padrão de parcelamento do solo, enquanto que a área com o parcelamento mais subdividido do solo, com parcelas pequenas, mesmo com o índice alto, pode ser também uma espécie de contenção ao adensamento. Então, esse é outro aspecto conceitual importante pra gente analisar se os coeficientes lançados estão respondendo às estratégias previstas lá nas diretrizes e no ordenamento.
Antes de falar do coeficiente básico, a gente está falando de um índice que indica o direito de construir, que poderá ser exercido de maneira não onerosa, ou seja, sem custo ao proprietário. Acima desse índice básico, só poderá ser construído mediante pagamento de contrapartida financeira. Essa é a grande introdução feita nesse capítulo muito importante. Ela é central para a compreensão dos instrumentos da forma como estão propostos.
Embora não seja propriamente novo, como a própria Valéria destacou, uma vez que isso já está previsto no Plano de 1992 do Rio de Janeiro, que não foi implementado, foi tratado de modo diferente no de 2011, agora volta a esse conceito. Ele é amplamente aceito na literatura da área, aplicado em diversas cidades: a introdução do coeficiente básico e o coeficiente básico igual a um ou menor que 1.
Eu arriscaria dizer que esse instrumento – é importante compreender – não é definido por critério urbanístico, diferentemente do coeficiente máximo. Eu diria que é quase um critério jurídico. Eu arriscaria dizer também que não se trata nem sequer de uma opção do município escolher se vai ou não ser 1. Tenho praticamente a convicção de que isso está dado, de que ele só pode ser 1 ou menor que 1, que é igual a uma vez a área do terreno, que seria aquilo que o proprietário teria possibilidade de exercer sem nenhum pagamento de contrapartida. Podendo ser limitado por outros fatores, por exemplo, critérios ambientais etc., que limitem esse coeficiente 1.
Embora não seja um critério exatamente urbanístico, logicamente ele pode ter efeitos diversos na cidade. Ele fundamentalmente permite que o município possa capturar parte da valorização fundiária decorrente do próprio processo de urbanização e da aplicação da legislação urbanística. E, por isso, que ele é absolutamente legítimo. Tendo como finalidade a captura dessa mais valia, o financiamento do próprio desenvolvimento urbano.
Como é proposta essa cobrança de contrapartida, quer dizer, qual é o critério? Qual é a fórmula? É outra discussão que a gente vai fazer aqui também, ali é uma fórmula que vai estabelecer então quanto dessa valorização o município vai capturar, mas, do ponto de vista conceitual, me parece que está colocado corretamente a introdução do coeficiente 1.
O plano também traz a noção do coeficiente de aproveitamento mínimo. Esse também é outro aspecto importante para entender alguns dos instrumentos. O coeficiente mínimo diferentemente do máximo, que ele estabelece até onde o proprietário do terreno pode construir, quer dizer, ele pode, mas ele não está obrigado, ele pode construir até um, dois, três, quatro, cinco conforme for o índice aplicado na zona que ele se situa. O coeficiente mínimo, por sua vez, estabelece a obrigação do proprietário. Quer dizer, onde tem o coeficiente mínimo fixado quer dizer que o proprietário está obrigado a construir, não é uma opção dele.
Esse é um instrumento forte de indução do desenvolvimento urbano. Mas aí vamos ver com é que ele está tratado no plano e aí eu acho que cabem ponderações, tá? O coeficiente mínimo equivalente a 50% do coeficiente básico da área, normalmente vai ser 0,5; porque na grande maioria da cidade o coeficiente básico é 1, na macrozona de estruturação urbana, na macrozona de desenvolvimento estratégico e na macrozona de controle da ocupação. Mas os imóveis residenciais, uni e bifamiliares ou de interesse ambiental, não ficam sujeito ao CA mínimo.
O que isso quer dizer? Eu vou compartilhar aqui ponderações que a gente está fazendo para gente avaliar junto. Talvez haja alguma contradição com as diretrizes, porque a macrozona de controle da ocupação, que é essa em amarelo clarinho, que vem lá da Zona Sul, atravessa, vai até a o final do Recreio, é a área, que a própria definição estabelece, composta das áreas de melhor qualidade de ambiência, a melhor infraestrutura, indicadores socioeconômicos etc. Tudo bem, é razoável a gente pensar que não cabe numa área melhor infraestruturada da cidade, que tenha terrenos vazios.
Porém ela vai até lá no final do Recreio, aí eu acho que cabe uma ponderação, porque justamente estamos discutindo que se deve buscar, direcionar, não é? O desenvolvimento urbano lá para área central e a AP-3 e não continuar a expansão na AP-4 e na AP-5.
É uma ponderação, porque, se você está obrigando que se construa nessas áreas, você está obrigando que se realize onde em tese pelas diretrizes a gente está dizendo que não seria a prioridade de ocupação. Então, há de haver alguma combinação aí entre a definição da macrozona e a localização dela.
Na macrozona de estruturação urbana, que é essa grande área em vermelho, lá é o supercentro, também tem a incidência do coeficiente mínimo. Eu entendo que se tenha em alguma medida, mas é preciso ter cuidado, porque uma das diretrizes dessa macrozona é justamente recuperar o tecido urbano degradado. Ora, então a gente vai obrigar que se construa onde a gente reconhece que tem o tecido urbano degradado?
Quer dizer, tem uma lógica, porque a obrigação pode levar a contribuir para a própria recuperação da área. Por outro lado, quando se coloca como obrigação, ainda mais numa área tão vasta, e que também atravessa lá para a AP-4 chegando à AP-5, também cabe ponderar se ele deve ser aplicado em toda extensão dessa área – embora a própria Valéria tenha falado da importância de estabelecer as áreas onde vai ser aplicado, efetivamente, o instrumento. Aqui ele está colocando como possibilidade, mas acho que cabe ponderação.
Na macrozona de desenvolvimento estratégico, que é a área em rosa claro, atravessando lá da AP-4 chegando lá em Santa Cruz, na AP-5, é composta pelas áreas – segundo a definição – estratégicas para a construção e manutenção de complexos produtivos e polos econômicos, e áreas sem infraestrutura adequada para ocupação residencial. Portanto, não queremos uma residência lá.
Ao mesmo tempo, se você tiver unidade residencial unifamiliar ou bifamiliar, a obrigação de aproveitamento mínimo não se impõe. Então, você pode estar abrindo a possibilidade de se cumprir essa exigência pela reprodução de unidades residenciais unitárias de baixa densidade nessa ocupação. Seria, me parece, um pouco o inverso da estratégia geral.
Acho que cabe olhar essas definições, porque é importante o coeficiente mínimo. Ele pode ser a base para implementação do instrumento que é o IPTU progressivo no tempo, importante em várias áreas da cidade para colocar terrenos para a boa utilização. Mas acho que tem que ter um ajuste aí dessas correlações com as macrozonas.
Não sei se ainda tenho algum tempo, Vereador Rafael Aloisio Freitas.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Mais um pouco.

O SR. HENRIQUE BARANDIER – Só vou falar duas ou três coisas sobre a outorga onerosa, não vou entrar em grandes questões. Acho que ela está correta, tendo como índice 1. Existe a regra de transição que, no fundo, é uma decisão política de acomodação de transição de um regime para o outro. Acho que cabe avaliar se está bem dimensionada essa transição ou não. Mas, enfim, acho razoável que tenha alguma transição.
E me parece adequado quando o projeto de lei diz que é somente contrapartida financeira. Eu acho isso fundamental. Acho que é isso mesmo: é pagamento em dinheiro a contrapartida. A forma de cálculo, eu não vou me deter sobre ela, mas também é quase que uma decisão política de quanto se vai arrecadar da valorização. E tem uma série de isenções previstas. Claro, tem que haver algumas situações de isenção que têm que ser previstas – os usos públicos, habitação e interesse social. Talvez coubesse avaliar se para determinadas tipologias em algumas áreas não caberia também isenção, mas isso eu vou deixar em aberto.
Um aspecto que eu acho que merece chamar a atenção é com relação à destinação dos recursos arrecadados com a outorga. O plano simplesmente adotou... quer dizer, o PL adotou a previsão geral do Estatuto da Cidade, mas não fez nenhuma reserva, não definiu tantos por cento para um determinado uso ou outro – deixou em aberto como pode ser aplicado. Também deixou em aberto regiões da cidade onde pode ser aplicado. Na verdade, ele pode ser aplicado em qualquer lugar. Não definiu nenhum tipo de priorização. Poderia ter dito: “As outorgas vão ser, prioritariamente, em tal região”. Ou, pelo contrário, vai dizer: “Não pode ser aplicado em determinada região ou macrozona”.
Na melhor qualificada de controle da ocupação me parece meio incoerente que se aplique a outorga nela, porque já é área infraestruturada. Mas o plano não está fazendo. Poderia fazer uma restrição a isso. E sobre a outorga onerosa de alteração de uso, que também é uma coisa importante, mas me parece que o que está colocado ali não é alteração de uso.
Na verdade, está tratando de uma questão muito específica, que é de quando um terreno está em duas zonas. Então, há uma possibilidade de utilizar os índices mais favoráveis. Isso poderia estar, a meu ver, lá nos critérios de uso e ocupação do solo.
Tudo bem. É uma questão, não acho que esse conteúdo tenha problema em si. Mas alteração de uso, no meu entendimento, tem a ver com a possibilidade que a legislação admite de transformar uso rural em urbano, de transformar um uso menos rentável, como o residencial, num uso mais rentável, como o comercial ou de serviço, por exemplo. É nessa possibilidade de alteração, então, que incidiria o instrumento da outorga.
Para finalizar mesmo, Transferência de Direito de Construir. Acho um instrumento muito difícil, que tem muitos riscos na sua aplicação – ele envolve questões conceituais. Assim que, vendo como são tratados no Brasil, tem um monte de confusão aí, mas acho que, se decidiu colocar dentro do Plano. Pelo menos se decidiu com bastante limitação, o que me parece correto, com bastante cuidado, aplicando somente dentro de área de operação urbana, de operação urbana simplificada, que é uma coisa que a gente tem que entender melhor – eu ainda não compreendi exatamente do que se trata – e de Área de Especial Interesse. Acho que se é pra ter um instrumento, que seja com bastante restrição na sua aplicação.
Esses pontos que eu queria levantar. Desculpe se já passei do tempo.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Henrique. Foi excelente.
Só para fazer uma rápida complementação, acho que quando se bota “prioritariamente” não amarra. Está aqui no art. 99: “Os recursos das contrapartidas da outorga onerosa serão utilizados prioritariamente para as seguintes finalidades [...]”, e ele lista as finalidades. Só que fica em aberto, porque não define exatamente o percentual ou não define que é para aquilo. Aí fica ainda muito em aberto.

O SR. HENRIQUE BARANDIER – Por exemplo, tem uma das finalidades, não sei exatamente o texto, mas que é do desenvolvimento urbano. Qualquer coisa pode caber ali. Existem outras, são mais focadas. Habitação e interesse social é patrimônio histórico. Poderia ter tido essa preocupação.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Perfeito.
Obrigado, mais uma vez, Henrique.
Com a palavra, a Senhora Camila Maleronka, do Lincoln Institute, em nome do Senhor Martim Oscar Smolka.

A SRA. CAMILA MALERONKA – Oi, bom dia.
Estou on-line, mas quem vai falar é o Martim. Ele vai começar falando.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Ok. Então, Martim, obrigado. Seja muito bem-vindo. Passo a palavra ao senhor.

O SR. MARTIM OSCAR SMOLKA – Bom dia todos e todas.
Eu não vou utilizar nenhum PowerPoint ou nada disso, vou simplesmente falar. Eu recebi um convite, mas não me disseram quanto tempo teria para falar. Só para me organizar aqui minimamente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – De cinco a 10 minutos.

O SR. MARTIM OSCAR SMOLKA – Tudo bem, vamos lá.
Bem, quero começar com um comentário muito rápido para simplesmente situar. O Lincoln Institute é uma fundação privada, sem objetivos de lucro, que está consagrada, enfim, que está festejando esse ano a rigor 75 anos de existência. Ela foi fundada por um industrial americano, que fez fortuna com suas 55 patentes, e algumas delas bastante importantes. Inclusive, são a base das indústrias Lincoln, que é uma, enfim, indústrias globais.
Esse industrial do final do século passado, início desse século, aliás, século retrasado e início do século XX, ele se inspirou... Ele, apesar de um industrial, sempre esteve muito preocupado, por razões éticas... Tinha, enfim, princípios bastante fortes na sua formação, com uma ideia muito prevalente no final do século passado, mas que ainda é bastante presente nos tempos de agora. Inclusive é algo que inspira também alguns dos instrumentos no Plano Diretor, que é essa ideia básica de que a ação pública a rigor gera valorizações fundiárias que deveriam, portanto, por elas terem sido geradas pela ação pública, retornar ao público e não aos beneficiários, proprietários de terras, que, a rigor, não foram responsáveis por essa valorização.
Esse é um princípio elementar que é compartilhado por economistas das mais variadas formações, desde os economistas mais conservadores até os mais progressistas. É um dos poucos temas que os economistas convergem, que a valorização da terra, ou a chamada renda da terra, ou mais valia, como se queira – tudo isso, na verdade, é a mesma coisa no final do dia – constituem uma forma de enriquecimento sem justa causa. Ele é um enriquecimento indevido porque o proprietário de terra não é o responsável pela valorização do seu próprio patrimônio. Toda valorização da terra, toda valorização e não deixo de enfatizar, é decorrente de ações externas ao lote do terreno.
Eu, se eu puder fazer uma provocação, alguém possa comprar um terreno de 1.000 m², paga, não sei, R$ 100 mil e pretende, daqui a dois anos, vender isso por R$ 200 mil. O que é que o proprietário de terra pode fazer com seu próprio terreno para valorizá-lo ao longo do tempo? Nada! Nada! Zero! Toda valorização que vai acontecer nesse terreno resulta de coisas que acontecem fora do terreno. Os economistas se referem como “externalidades”. Isso aí é uma praça que se coloca em frente, é uma pavimentação que foi realizada; é, inclusive, um vizinho. Se o Roberto Carlos compra o terreno ao lado do seu, vai valorizar o seu terreno. Mas o seu o proprietário não fez nada.
Na verdade, a valorização decorre daquilo que o terreno dá acesso. Vocês podem imaginar, podem contra-argumentar: “Ah, não! O proprietário compra um terreno num declive, ele apanha num terreno...”. Bem, isso é investimento de capital. É da mesma forma que construir uma casa etc., que é o valor do investimento de capital. Isso não altera em nada as qualidades intrínsecas do terreno, que é essencialmente a localização na cidade.
Agora bem, qual é a ideia que está por trás disso? Deixa eu só deixá-los saber, tranquilizá-los, que o Instituto Lincoln não é nenhuma instituição radical que seja nesse sentido. Inclusive, no seu corpo diretivo, a gente, ao longo dos anos, tivemos vários prêmios Nobel de economia; inclusive participando do conselho diretor do instituto.
Enfim, é bastante conhecido no mundo inteiro. Ele está presente na América, nos Estados Unidos, na América Latina, na China. Está agora na Ásia, na África. No Leste Europeu tem uma ação bastante forte também. É uma instituição bastante reconhecida mundialmente e que tem como lema, se querem, encontrar as respostas na terra.
Em outras palavras, fazer uma melhor investigação, uma melhor atenção ao que acontece na terra pode lhes dar algumas respostas interessantes. Algumas delas têm a ver, inclusive, por exemplo, com a importância que hoje em dia se tem de como financiar esse passivo acumulado de investimento, déficit de infraestrutura e serviços e em habitação social que se acumula no mundo inteiro. Essas grandes agências colocam isso em trilhões e trilhões de dólares que devem ser financiados em algum momento sem aumento de impostos.
Como fazer isso sem aumentar os impostos? Hoje em dia, enfim, existe essa bandeira também de que não há como seguir aumentando impostos, né? Então, essa necessidade de buscar fontes alternativas não tributárias para financiar esse imenso déficit acumulado de habitação social e infraestrutura e serviços é que entra um pouco essa popularização recente, essa maneira pela qual muitos desses instrumentos estão se tornando, não só no Brasil, mas, em diferentes áreas do mundo, tão populares e estão merecendo tanta atenção. Eu posso falar aí sobre vários desses instrumentos e o Brasil de certa forma tem uma posição de destaque pela criatividade e pela forma como vem utilizando alguns desses instrumentos que, inclusive, estão sendo aí incorporados no Plano Diretor do Rio de Janeiro, né?
Devo dizer também que essa não é nenhuma ideia nova e não é nada mirabolante. Isso já está na agenda desde as Ordenações Filipinas, se vocês quiserem. Nas Ordenações, já se havia previsto a contribuição de melhoria que se aplica na Colômbia desde há muito. Esse ano eles estão celebrando 100 anos de aplicação de contribuição de melhoria na Colombo. É algo muito exitoso, no sentido de que em algumas cidades, como Medelín, eles chegaram a financiar 68% do seu orçamento local com a contribuição de melhoria.
Então, esse é um instrumento perfeitamente viável, cada vez mais viável com as novas técnicas de geoprocessamento, de como se calculam essas valorizações realizadas por investimentos públicos que são uma forma bastante saudável e bastante viável de financiar também.
Agora, as cidades, desde meados do século passado, começaram a crescer para cima. O que quer dizer isso “crescer para cima”? O que quer dizer se verticalizar? É que antes as cidades eram construídas com você aproveitando o terreno mais ou menos pelo que ele era para um imóvel de um, dois andares, três andares e assim por diante. Hoje em dia, se constroem 20, 30, 50, e até mais do que isso, andares.
O que representa isso? Isso quer dizer o seguinte, que para que se possa densificar em qualquer lugar, você deve, antes de tudo, viabilizar a sustentação dessa maior densidade. Um edifício maior vai gerar maior carga, por exemplo, de automóveis em circulação. Vai exigir um provimento de água e esgoto etc. com maior capacidade e assim por diante.
Quem é que investe nisso? Quem investe nisso é o público através dos investimentos públicos e melhorias em infraestrutura e serviços em geral. Isso quer dizer que o proprietário de terra que dispõe de um lote de 1.000 m2, se um promotor imobiliário quer construir 5.000 m2, eles teriam que comparar cinco lotes, um ao lado do outro, iguais de 1.000 m2 para construir um edifício de 5.000 m2. Com a densificação, o que é que se está concedendo? Que esse mesmo proprietário pode vender cinco lotes, um em cima do outro, para esse mesmo promotor imobiliário construir os seus 5.000 m2.
Isso aí é um regalo. Isso aí é um presente que o público está dando, concedendo a esse proprietário de terra para construir cinco andares em cima do seu lote que são viabilizados por um investimento que não foi esse mesmo proprietário de terra que realizou ao ampliar a rua, iluminá-la, ampliar o saneamento, enfim, a rede de esgoto, de águas e assim por diante. São esses cinco lotes com esses quatro lotes adicionais que é o objeto de atenção, quando se fala em outorga onerosa.
Quando se cobra, quando o poder público diz: “Você agora quer construir cinco andares em cima desse terreno? Você tem que pagar por esses quatro andares adicionais”. Pagar para quem? Bem, para quem produziu isso. Quem produziu isso? Foi o público. Então, esse terreno é patrimônio público. Se você quer incorporar esse terreno, esses quatro terrenos adicionais no seu patrimônio, que compre de quem é de direito. Quem é de direito? O público, em geral, que gastou o dinheiro público para construir, para urbanizar essa área, que viabiliza esses cinco terrenos adicionais.
É importante dizer que essas contrapartidas não são nenhuma forma de tributo, não são nenhuma forma de imposto e nada disso. É simplesmente uma transação de compra e venda. O público é detentor de um patrimônio, que se você quer incorporar o seu patrimônio privado, você deve comprar antes.
Isso, incidentalmente, foi a forma como o Supremo Tribunal, no Brasil, respondeu a uma demanda que foi feita há algum tempo, sobre essa carga que estaria sendo imposta sob a forma de outorga onerosa. Seria mais um imposto colocado nas costas dos empresários imobiliários. Nada mais errado do que isso, e o Supremo Tribunal foi claríssimo em explicar porque isso não é um imposto, não é um tributo, é simplesmente uma transação de compra e venda.
Enfim, esse é o primeiro ponto que eu gostaria de chamar atenção para essa discussão. Para concluir, cinco ou seis grandes temas contenciosos que, de certa forma, permeiam ou afetam esse debate sobre a outorga onerosa. Eu gostaria de chamar atenção a eles, porque são cinco grandes falácias que, na verdade, por vezes, jogam por terra um instrumento extremamente beneficiário, extremamente vigoroso por razões absolutamente espúrias.
Quais são esses cinco grandes temas contenciosos nesse debate? O primeiro deles é que essas supostas cargas sobre as maiores edificabilidades serão transferidas entre os preços finais, nada mais equivocado do que isso. A outorga não é transferida para os preços dos produtos finais, ela é absorvida para trás. Isso é algo que não é bem entendido e essa falácia, de certa forma, é um dos principais argumentos que tem sido levado para detonar ou impedir a aprovação desses instrumentos.
Segundo, que era um imposto – eu já expliquei que não é. Terceiro, que há direitos adquiridos. Esses direitos adquiridos existem quando as regras de transição são feitas exatamente para dar conta desses supostos direitos adquiridos. Um promotor imobiliário compra terrenos e mantém no seu portfólio de terrenos que vão ser construídos ao longo do tempo.
Comprou com determinado índice e, agora, tem um índice menor que ele tem que pagar. Então, para acomodar essa situação, você faz uma regra de transição, que, de certa forma, faz uma aterrissagem suave para esse instrumento que será aplicado.
Os direitos adquiridos não são eternos, eles são decididos, os limites deles são definidos pelo interesse social. Em algum momento, você diz: “do ponto de vista social, esse direito já não deve ser mais assegurado”. Por exemplo, existem vários direitos que já foram revogados, urbanísticos, aí no Rio de Janeiro e em várias outras áreas também.
Outros princípios, que isso não é mensurável, diz que não vale a pena, que os recursos não são suficientes. Bem, nós estamos falando de milhões e milhões de dólares que o Rio de Janeiro está deixando de incorporar, utilizar e aproveitar por estar, de certa forma, deixando essa possibilidade de mobilizar esses recursos solta, vamos dizer assim.
Bem, eu já falei demais, eu já estou vendo caras fechadas me olhando. Se alguém quiser continuar essa conversa e tiver alguma pergunta, com todo o interesse, com toda a boa vontade, eu gostaria de poder responder.
Muito obrigado pela atenção e seguimos aí esse debate.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Senhor Martim. Só para dizer que como semana que vem a gente tem novamente uma audiência sobre o mesmo assunto, está convidado para continuar os nossos debates aqui.

O SR. MARTIM OSCAR SMOLKA – Com muito gosto.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Gostaria, agora, de convidar, representando o Ippur, Fabricio Leal de Oliveira que está aqui representando o Senhor Orlando Alves dos Santos Junior. Tem slide, Fabricio?

O SR. FABRICIO LEAL DE OLIVEIRA – Não, mas eu preparei uma fala de 10 minutos, dá para diminuir um pouquinho, mas...

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Não, está certo! As pessoas que a gente fez o convite até formal pela comissão não podem chegar aqui para falar só três ou cinco minutos. Com a palavra...

O SR. FABRICIO LEAL DE OLIVEIRA – Olá! Bom dia a todas e todos. Uma saudação aí para Martim que foi meu orientador no mestrado, saudade dele, já faz uns 20 anos, não é, Martim?

O SR. MARTIM OSCAR SMOLKA – Grande Fabricio!

O SR. FABRICIO LEAL DE OLIVEIRA – Tudo bem. Eu quero agradecer o convite da Câmara para falar aqui sobre o instrumento do plano representando o Ippur e a primeira coisa que eu gostaria de destacar é que o projeto de lei que a gente está discutindo hoje aqui teve entre suas referências iniciais um diagnóstico muito frágil, produzido sem nenhuma participação popular e um projeto de lei preliminar muito parecido com esse que está sendo discutido aqui, mas com algumas diferenças pontuais importantes, o projeto preliminar que foi elaborado também às pressas, apresentado por uma discussão muito restrita ano passado, basicamente pela internet, no auge da pandemia de Covid, e isso tudo, é claro, tem consequências no conteúdo do projeto.
Esperamos que essa discussão aqui liderada pela Câmara dê pelo menos visibilidade ao que está sendo construído para o Rio e, assim, dê instrumentos para que os diferentes movimentos, articulações, grupos sociais, associações de moradores se organizem em torno de suas pautas, demandas, desejos, tentem interferir nesse processo pensando na sua relação com a cidade, seu local de moradia ou de vida etc.
Nesse projeto de revisão do Plano Diretor, foram incluídos uma série de instrumentos que simulam a realização de parcerias público-privadas, instrumentos como operações urbanas, concessões urbanísticas, parcerias etc. e, como a gente sabe, a partir da experiência carioca e brasileira, podem envolver a privatização de bens públicos e quase sempre reforçam a segregação socioespacial e racial.
De fato, esse projeto de lei não prioriza redução das igualdades sociais nessa sociedade, nem a redistribuição de recursos no sentido de diminuir as abissais diferenças entre os diferentes bairros da cidade, quanto à quantidade e qualidade dos equipamentos e serviços públicos.
Os instrumentos de gestão, uso e ocupação do solo aqui propostos não garantem a redistribuição de recursos com vistas à diminuição das desigualdades da cidade, não se dirigem à redução da segregação social e racial e também não garantem e nem priorizam como deveriam a promoção do acesso à moradia da população de baixa renda. Em áreas centrais, ocupam ofertas de equipamentos e serviços, ou seja, eles não são endereçados para resolver as nossas questões principais, parecem atender a outros interesses.
Há, assim, aspectos interessantes e bem desenhados no plano, como é o caso da utilização do índice 1 como coeficiente de aproveitamento básico em toda a cidade, mas, inclusive como o Henrique já falou um pouco aqui, não há uma orientação que priorize recursos, iniciativas, projetos para redução da desigualdade e da segregação social e racial na nossa cidade. Isso não é prioridade do plano e, se não é, não é o plano que nós precisamos.
Quando não combatermos as desigualdades nem agregação, reforçamos as dinâmicas que as pessoas produzem e que estão aí impulsionadas pelos interesses financeiros ancorados no mercado imobiliário e nas iniciativas da Prefeitura para atrair investimentos a qualquer custo, que não vem de hoje.
Não basta incluir entre os princípios a universalização da sua moradia, os objetivos de garantir a equidade social, territorial, se não há nenhuma priorização nesse sentido ao longo do projeto de lei ou no desenho dos instrumentos de política urbana.
Outra coisa que eu queria destacar é que a orientação do desenvolvimento orientado ao transporte sustentável não poder ser utilizada como justificativa para ampliar coeficiente de aproveitamento do terreno a níveis estratosféricos propostos nesse projeto de lei, onde os coeficientes de aproveitamento máximo da centralidade em corredores de transporte pode chegar a cinco, sete ou nove na AP-3, cinco na AP-2, sem falar nos tradicionais coeficientes altíssimos existentes no Centro e na região portuária, onde chegam a 15. Em São Paulo, chegam a quatro.
Quais os impactos desses possíveis adensamentos? Quem se beneficia desses aumentos de índices? Não adianta ter como objetivo fomentar a justa distribuição da valorização do solo urbano, possibilitando novos investimentos em áreas carentes de infraestrutura, se os recursos da outorga onerosa do direito de construir não forem obrigatoriamente direcionados para essas áreas ou, pelo menos, priorizados com uma parte expressiva dos recursos para as áreas mais vulneráveis.
A regulamentação da outorga onerosa do direito de construir nesse projeto não obriga, nem prioriza, nada disso, ao contrário, como já disse inclusive o Henrique. Os recursos da contrapartida financeira podem ser todos utilizados, por exemplo, para o ordenamento e direcionamento da expansão urbana, inclusive se reaplicados na mesma área onde foram arrecadados, sem gerar nenhum efeito redistributivo.
Mas vamos a alguns pontos mais específicos nessa discussão. Eu só tenho 10 minutos e vou tentar ser bem breve e falar de alguma outra coisa.
Primeiro eu queria pontuar que o tema das áreas e zonas de especial interesse social tinha que ter alguma seção específica sobre isso, é um tema complexo, não vai dar para ser tratado aqui como ele merece, mas eu faço essa sugestão, especialmente tendo em vista as remoções realizadas nesse século, que foi algo muito grave que aconteceu.
O plano deveria ter uma orientação clara, uma referência decisiva quanto a não remoção de favelas e assentamentos precários, sobre urbanização de assentamentos populares e uma série de ambiguidades aqui. É importante, claro, a referência a Áreas de Especial Interesse Social (Aeis) e Zonas Especiais de Interesse Social (Zeis). Aliás, não vejo a necessidade de essas duas categorias no mesmo plano, mas, por exemplo, por que as favelas com 500 ou menos domicílios não podem virar Zeis? A quantidade de domicílios é parâmetro suficiente para a definição do que fazer com relação às favelas? Claro que não. O que vai ser feito com as pequenas favelas? Isso não aparece aqui.
É claro que eu gostaria de pontuar também a importância da inclusão da política de locação social no plano, ainda que a meu ver essa política devesse priorizar as classes de renda mais baixas, mas tudo isso merece uma discussão muito maior, que eu espero que vocês conduzam aqui.
Eu vou falar um pouco sobre o PEU, que eu concordo com muita coisa: parcelamento de edificação compulsória, que o Henrique pontuou; a ideia central do PEU, que é induzir a ocupação dos vazios urbanos das áreas centrais, com melhores condições de ocupação da cidade e, sendo assim, não há justificativa para a gente incentivar a ocupação em Campo Grande, Bangu, Realengo, Barra da Tijuca, Recreio dos Bandeirantes. O objetivo aqui deveria ser impor um vetor de desenvolvimento que atue no sentido contrário da expansão da malha urbana e não a seu favor, que é o que aconteceria se você incentivar a ocupação, por exemplo, no Recreio.
Quanto à operação urbana consorciada aqui, o que não deixa de ser um avanço com relação à operação urbana Porto Maravilha, a proposta de revisão no Plano Diretor segue a linha paulistana de tentar domesticar a operação urbana consorciada, como se fosse possível uma boa parceria público-privada no contexto patrimonialista do Estado Brasileiro. Aqui é importante a gente se lembrar da experiência das operações urbanas brasileiras, que só acontecem nas áreas de interesse do capital imobiliário, que sempre exigem investimentos públicos e projetos-âncoras, capazes de estimular o investimento privado, que envolvem incentivos fiscais e, principalmente, sempre envolvem estratégias de valorização fundiária, com todos os seus impactos e processos de gentrificação e segregação.
A valorização fundiária é o combustível das operações urbanas consorciadas. Uma vez lançados os leilões de estoque construtivo, a Prefeitura passa a zelar pela valorização fundiária, pela viabilização de enclaves valorizáveis que sistematicamente exigem a erradicação de tudo o que ameaça os negócios.
Quanto à operação urbana simplificada, aqui uma novidade também voltada para flexibilizar a legislação e beneficiar investidores privados, ficam algumas questões preocupantes porque o projeto de lei não especifica as referências para o cálculo da contrapartida financeira, deixa as definições a cargo do Poder Executivo e a gente já sabe no que isso pode dar quando a gente lembra do caso das operações interligadas dos anos 90, quando as liberações de uso eram enormes e as contrapartidas mínimas. Dito isso, eu nem preciso dizer o que eu penso a respeito das operações interligadas.
Finalmente, para concluir, eu quero dizer que não é possível avaliar a adequação da regulamentação da aplicação desse instrumento que estamos falando aqui sem uma discussão e uma reflexão profunda sobre a conjuntura política, sobre as coalizões entre Governo Municipal e empresariado, especialmente no ramo imobiliário, sem avaliar as complexas relações do Governo Municipal com empreiteiras de obras públicas que se associam com promotores imobiliários em grandes negócios que envolvem concessões urbanísticas, alterações de parâmetros urbanistas etc. Essas não são questões externas aos instrumentos, elas é que produzem a justificativa para eles, elas influenciam nos detalhes, estão lá dentro, e a gente precisa considerar essas questões para deliberar sobre a adequação da regulamentação deles.
Enfim, já devo estar no fim do meu tempo. Agradeço novamente à Câmara pelo convite ao Ippur. Um abraço a todos vocês.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Fabricio.
Com a palavra, o Senhor Frederico Price Grechi, Presidente da Comissão de Direito Urbanístico e Agrário IAB, para fazer uso da palavra.

O SR. FREDERICO PRICE GRECHI – Bom dia, Vereador Rafael Aloisio Freitas. Eu tenho uma apresentação. Se puder, peço a gentileza de colocá-la em exibição para os colegas.

(Inicia-se a apresentação de slides)

O SR. FREDERICO PRICE GRECHI – Bom dia a todos, meu nome é Frederico Price Grechi. Eu gostaria de iniciar cumprimentando o Parlamento, na pessoa do Vereador Rafael Aloisio Freitas, que conduz com maestria os trabalhos. Cumprimento o Poder Executivo, na pessoa da Valéria Hazan aqui presente, e o Poder Judiciário, na pessoa dos advogados, o Procurador da Casa Flávio Britto e a Doutora Larissa, meus colegas. E, sobretudo, o mais importante, cumprimento o povo carioca, na pessoa dos senhores aqui presentes e dos participantes aqui no ambiente virtual.
Eu, como advogado, o exercício da profissão do advogado é indispensável à administração da justiça e a justiça não se realiza apenas no Poder Judiciário, mas também nesse processo democrático da discussão do Plano Diretor. O advogado, não sei se os senhores sabem, integra a Ordem dos Advogados do Brasil, portanto o advogado é, antes de mais nada, um cavalheiro das leis.
O Plano Diretor é de suma importância para a ordenação, para o desenvolvimento e para a expansão da nossa cidade. É um instrumento de planejamento do nosso município que deve, em última análise, cumprir a sua finalidade, que é promover as funções sociais da cidade, com vistas à melhoria da qualidade de vida, à justiça social e aos direitos fundamentais sociais: a moradia, o lazer, a alimentação, enfim, todos aqueles encartados no art. 6º da nossa Carta Magna. E que cidade nós queremos? Digo eu, Frederico. Queremos uma cidade inclusiva, uma cidade solidária, uma cidade plural, uma cidade segura, uma cidade justa, ou seja, com todos os nossos valores e assegurada, portanto, a ampla participação da sociedade civil.
Aproveitando o ensejo, não sei se os senhores sabem, mas foi de autoria do Vereador Rafael a Lei nº 6.913 de 2021 que incluiu no calendário municipal o Dia da Ética e o Dia da Cidadania. A ética começa em casa, começa com a sociedade civil, e os valores da República devem ser promovidos no âmbito da sociedade civil.
Bem, eu aqui falo, como disse anteriormente, na qualidade de advogado, mas também como Presidente da Comissão de Direito Urbanístico do IAB, como Vice-Presidente da Comissão de Direito Urbanístico da OAB, da Ordem dos Advogados, e nesse momento, eu faço um registro do meu respeito e admiração ao Presidente Luciano Bandeira e ao nosso Presidente da Comissão, José Ricardo Pereira Lira, e também represento o capítulo regional do Rio de Janeiro da Federação Internacional Imobiliária (Fiabci).
Senhor Presidente, feitas essas breves considerações introdutórias, eu gostaria, por gentileza, que a gente passasse para o próximo slide.
Sabemos que toda obra humana é imperfeita, e esta é a oportunidade do seu aperfeiçoamento. Eu preparei três breves destaques que eu reputo relevante para este aprimoramento. O primeiro destaque diz respeito ao art. 99, que disciplina a outorga do direito de construir.
Eu peço atenção dos senhores para a palavra que foi utilizada no art. 99. O texto do projeto de lei complementar, os recursos auferidos com as contrapartidas financeiras oriundas da outorga onerosa do direito de construir serão utilizados prioritariamente para as seguintes finalidades. Nós temos os incisos que elencam essas finalidades. Note-se que a expressão, a palavra “prioritariamente” significa primazia, não exclusividade. Este preceito guarda simetria com os arts. 26 e 31 do Estatuto da Cidade, da Lei nº 10.257.
Para facilitar as minhas considerações, eu apresento uma fundamentação legal para minha sugestão de alteração da expressão “prioritariamente” para “necessariamente”. Por que isso? A diretriz do art. 2º no Inciso IX determina que, nesse processo de urbanização, seja observada a justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes de tal processo. Essa justiça distributiva revelada no Inciso IX do art.  2º, ela necessariamente deve ser vertida para a cidade, para estas finalidades e não apenas como primazia, não apenas como preferência, mas, sim, como obrigatoriedade.
A hipótese aqui, contida no art. 26 combinado com o art. 31, que trata da outorga onerosa, está como mandamento imperativo. O tempo verbal, o futuro do presente “será”, serão aplicadas, não é? O modo imperativo é mandatório, ou seja, de sorte que o art. 99 merece essa pequena correção semântica no sentido de substituir a palavra “prioridade” por “necessariamente”, em vez de “prioritariamente”, “necessariamente”. Isso é relevante, inclusive com vistas a tutelar, a proteger o nosso Prefeito.
Por quê? O art. 52 do Estatuto da Cidade aplica sanção de improbidade administrativa quando o Prefeito não aplicar os recursos auferidos com a outorga onerosa do direito de construir em conformidade com o art. 31, que guarda simetria, repito eu, com o elenco das finalidades do art. 99 do projeto de lei complementar.
Então, essa é a primeira consideração a ser feita e que eu coloco para reflexão aqui dos presentes e daqueles que estão no ambiente virtual.
Pois bem, o segundo destaque que julgamos relevante: o art. 424, muito oportuno, que promove, em última análise, uma gestão democrática da cidade, estabelece que: “Fica garantido o acompanhamento pela sociedade das atividades de competência do Sistema Integrado de Planejamento e Gestão Urbana (SIPLAN), através do amplo acesso às informações e da participação no processo de planejamento municipal, através dos Conselhos Municipais, das audiências públicas e dos demais instrumentos estabelecidos neste Título”.
Bem, a proposição aqui é a seguinte: prestigiar, dentro da diretriz da gestão democrática da cidade, aquelas minorias; a população carioca que, porventura, tenha dificuldade de acesso ao debate das audiências públicas, das consultas públicas, sobretudo naquela localidade dos bairros. Propõe-se, portanto, o acréscimo do § 9º ao art. 424, de maneira que as subprefeituras, hoje em número de sete, “que administram as regiões administrativas na cidade, promoverão, com a periodicidade mínima de um ano, debates, audiências e consultas públicas junto à população local para acompanhamento e avaliação da execução do Plano Diretor e elaboração de propostas de revisão e alteração futuras, cujos resultados integrarão o Sistema Integrado de Planejamento e Gestão Urbana, Ambiental e da Paisagem Cultural (Siplan)”.
Reputamos relevante que seja assegurado esse debate no âmbito também das Regiões Administrativas, sobretudo, senhores, num ambiente hoje virtual... aliás, aproveito aqui para parabenizar o nosso coordenador da Cidade Inteligente, Felipe Peixoto, pelo trabalho que tem sido desenvolvido no ambiente virtual. É importante a utilização dos sistemas e mecanismos que são postos à disposição no ambiente virtual, mas também presencial, como está acontecendo aqui, neste momento, uma audiência híbrida.
A nossa fundamentação, senhores, para que possamos implementar esse acesso efetivo no âmbito das subprefeituras encontra guarida no art. 2º, II, e art. 43, do Estatuto da Cidade.
Por fim, senhores, o nosso terceiro destaque. O terceiro slide, já praticamente no final, nos Atos das Disposições Finais do Projeto de Lei Complementar, do novo Plano Diretor, há uma proposta de alteração para substituição de algumas palavras em apreço à técnica jurídica, e um acréscimo que reputamos relevante, sobretudo para acomodação dessa transição deste regime jurídico. Aliás, não só regime jurídico, pois sabemos que o Plano Diretor é um ato normativo de efeito concreto e complexo. Ele também contém, necessariamente, normas administrativas, jurídicas, que são oriundas desse debate político.
Pois bem, o art. 461 do projeto de lei complementar estabelece que: “Os processos autuados até o dia anterior à edição desta Lei Complementar, cujos projetos observem a legislação em vigor à época, ficam isentos da aplicação da presente Lei Complementar”. Bem, sobre o aspecto de técnica jurídica, propomos a substituição de “processos autuados” por “processos protocolados ou apresentados”. E também sugerimos a substituição de “à edição” por “publicação”. Isso é importante, senhores, na medida em que o processo administrativo, a lei de processo administrativo geral, federal, por exemplo, estabelece que o processo administrativo se inicia ex officio, de ofício ou por iniciativa do interessado, ou a pedido do interessado.
A autuação é um ato exclusivo, interna corporis, da própria Administração Pública, do seu setor. Não seria justo ou razoável que o regime jurídico ao qual o particular, o administrado venha a se sujeitar, dependa exclusivamente de um ato da Administração Pública sem que ele possa influenciar. O protocolo, sim. O protocolo, o recebimento, a apresentação do pedido depende, exclusivamente, do particular. Aliás, há estudos jurídicos sobre, inclusive, o direito ao protocolo. A figura do direito ao protocolo é muito interessante porque, em última análise, tutela a chamada legítima expectativa do direito, ou seja, segurança jurídica.
Não é apenas o direito adquirido, a coisa julgada, o ato jurídico perfeito que prestigiam a segurança jurídica, mas também a legítima expectativa tanto da Administração Pública como do particular. Aliás, o processo administrativo é caracterizado por essa processualidade, essa dialética processual. Processo, em última análise, é procedimento em contraditório.
Sugerimos, portanto, a alteração dessas duas palavras: de “autuação” para “protocolo” e, por fim, de “edição” para “publicação”, como um comparo da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Ou seja, é a publicação que, em última análise, promoverá ou caracterizará o termo inicial da vigência plena da nova lei.
Derradeiramente, uma proposta de acréscimo. E dentro do que a gente já havia sinalizado anteriormente, é imprescindível que a tutela da legítima expectativa do particular seja assegurada no tocante a esse regime de transição do atual vigente Plano Diretor, a Lei Complementar no 111/2011, para o próximo Plano Diretor. Propomos a inclusão do art. 461-A. Portanto, a letra A permite, é uma técnica de processo legislativo em que conseguimos manter toda a estrutura dos artigos, acrescentando aquele que guarda alguma pertinência com o artigo antecedente. Se os senhores preferirem, até mesmo a possibilidade de utilização de parágrafos.
Pois bem, esse artigo, que foi inspirado no Plano Diretor de São Paulo, na revisão de 2014, confere a possibilidade ao particular de optar pelo regime jurídico aplicável. Ele prestigia, sim, a legítima expectativa, o regime jurídico ao qual ele tem, portanto, essa possibilidade de seguir. Mas também confere a ele a faculdade de optar pelo novo regime.
A leitura, o enunciado proposto é o seguinte: “os processos de licenciamento de obras e edificações protocolados até a data da publicação desta lei, sem despacho decisório, serão apreciados integralmente de acordo com a legislação em vigor à época do protocolo, ou do recebimento do pedido, exceto nos casos de manifestação formal do interessado, a qualquer tempo, optando pela análise integral ou parcial, no que couber”.
Aí o administrador fará esse juízo de admissibilidade nos termos desta lei. Esta faculdade deve ser, portanto, assegurada ao particular, até porque o princípio tempus regit actum é um direito assegurado, portanto, a este particular que tem a faculdade, a opção de submeter ao regime anterior, de acordo com a sua legítima expectativa, ou ao novo regime. Essa opção obviamente será decidida de forma motivada pelo administrador.
Eu gostaria de agradecer o tempo que os senhores me ouviram com paciência, com atenção. Parabenizo a Cidade do Rio de Janeiro por esse futuro novo Plano Diretor. E que tenhamos uma cidade mais justa, mais participativa e que o novo Plano Diretor possa ser a virada de Copérnico da Cidade do Rio de Janeiro para construção dessa sociedade e o desenvolvimento social e econômico.
Muito obrigado a todos. Bom dia.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Frederico.
Com a palavra, o Senhor Victor Carvalho Pinto, representando o Insper, para também fazer uso da palavra.

O SR. VICTOR CARVALHO PINTO – Bom dia a todos. Muito obrigado pela oportunidade. É com um grande prazer que uso da palavra aqui para me dirigir aos senhores vereadores do Rio de Janeiro.
Eu preparei uma colocação em três etapas. Primeiro, uma colocação mais geral sobre o Plano Diretor, alguns comentários específicos sobre alguns instrumentos e, depois, algumas sugestões de acréscimos ao texto.
Inicialmente, gostaria de cumprimentar o Secretário Washington Fajardo e toda a sua equipe pelo bom trabalho na elaboração desse plano. A gente vê que é um trabalho muito coerente, atualizado com relação ao Estatuto da Cidade, e incorporando a experiência de muitos municípios que foram verificados na última década. Agora, no nível mais conceitual, eu tenho uma visão um pouco diferente do uso, da abordagem que foi adotada. Eu defendo a simplificação dos planos diretores. Inclusive, tenho um artigo que se chama justamente “Pela simplificação dos planos diretores” – está disponível na internet, os senhores podem acessar.
No Brasil inteiro, Plano Diretor é de extrema complexidade, agregando diversos assuntos, cada um deles de enorme dificuldade de compreensão. E eu verifico que isso acontece aqui também no caso do Rio de Janeiro. Então, especificamente, com relação aos instrumentos, que é o nosso assunto aqui hoje, na minha visão, isso deveria ser objeto de uma lei em separado, que eu até chamo de código de urbanismo, que são os instrumentos abstratos. E o Plano Diretor deveria ser concreto, tratando exatamente dos coeficientes, dos índices, das macrozonas, dos investimentos na cidade. Esses instrumentos, a meu ver, deveriam ser pensados de maneira abstrata antes de se elaborar o próprio plano. Mas, enfim, isso é apenas um detalhe metodológico.
Entrando aqui já na proposta colocada, também ainda em um nível muito geral, acho que existe certo excesso de instrumentos – eu contei 53 instrumentos. Acredito que muito deles sejam próximos entre si e poderão também estar reunidos numa mesma denominação. Entrando aqui nos instrumentos de planejamento urbano, eu verifico que foi reunido o zoneamento no próprio Plano Diretor, revogando-se aquele decreto de 1976, coisa que eu considero uma excelente providência.
Tenho defendido isso também há muito tempo. É uma prática que tem acontecido em vários outros municípios também. Acho que isso facilita muito o entendimento de qual é a norma em vigor. Quando você tem um zoneamento separado do Plano Diretor, você acaba tendo duas normas aplicadas simultaneamente ao mesmo território, e isso, em geral, dá problema.
Agora, eu verifico que as áreas de especial interesse podem alterar esse zoneamento. Não está claro qual é o instrumento jurídico que as aprova – se um decreto, uma portaria, outra lei etc. Então, parece-me que ficou uma incoerência aí. A meu ver, isso tem que ser equacionado, porque, na verdade, a gente está criando um plano completo, mas que pode ser alterado de maneira não muito clara na definição dessas áreas de especial interesse.
Outra observação que eu faria sobre o PEU, que eu considero um instrumento importantíssimo, e já é uma tradição no Rio de Janeiro, está muito claro que ele atua no desenho urbano. É muito importante que fosse vinculado ao PEU o instrumento da desapropriação. Os municípios fazem muitas desapropriações sem um bom respaldo urbanístico.
Na verdade, isso é um grande problema para as cidades brasileiras em geral. Vincular a desapropriação a um plano urbanístico que define o desenho urbano é uma grande providência de institucionalização do urbanismo no Brasil e, também, de proteção dos próprios desapropriados que vão poder ter oportunidade de participar da elaboração do PEU antes de sofrer a incidência de um decreto de desapropriação.
Outra medida que eu considero muito boa, mas que poderia ser mais bem organizada, é a flexibilização da rigidez do zoneamento. O zoneamento, tal como nós tratamos no Brasil, é extremamente rígido. Nós teríamos que ir aos anexos do Plano Diretor para encontrar toda essa complexidade dos tipos de zona, as atividades que podem existir em cada zona etc.
É muito comum, e se verifica na prática, que determinadas normas não são necessárias e bloqueiam determinados usos úteis para a cidade. Então, eu vejo na operação interligada uma oportunidade de corrigir esses problemas mediante adequada contrapartida. Concordo com o que foi colocado anteriormente que a outorga de alteração de uso, de certa maneira, poderia ter esse papel também – não aquele que está colocado ali, que é muito mais restritivo.
Com relação ao coeficiente básico, acho que esse coeficiente 1 tem sido um padrão adotado em vários municípios brasileiros, e tem um respaldo teórico muito bom como o Martim Smolka apresentou aqui. Mas eu destacaria algumas coisas: primeiro, em determinadas regiões da cidade que tenham sido loteadas para uma baixíssima densidade, o coeficiente 1, talvez, seja excessivo. É muito comum que se adote um zoneamento em defesa do meio ambiente, com lotes grandes e pouca edificabilidade.
Se agora entender que esse coeficiente passa a ser 1, estaria gerando um benefício injustificado para esses proprietários. A meu ver, então, a definição do coeficiente básico tem a ver com o parcelamento do solo. Eu acho que, talvez, fosse o caso de analisar esse assunto quando a Câmara for analisar a questão do parcelamento do solo.
Quer dizer, você pode ter parcelamento originário em que o 1 seja muito e, talvez, em tese, você pode ter algum tipo de parcelamento em que o 1 seja pouco. Por exemplo, se você tiver um parcelamento na origem para uma alta densidade em que existiram contrapartidas do loteador em grande volume, talvez não seja justo depois cobrar novamente uma outorga onerosa em torno de um coeficiente 1.
Sobre a outorga onerosa – que, como foi dito também, é uma medida extremamente necessária –, eu teria algumas observações sobre a fórmula de cálculo que está lá no anexo. Há um dos elementos: o valor unitário padrão. Pelo que eu entendi, é definido mediante remissão a uma lei que define o IPTU do município.
Eu não tive acesso a essa lei, então, pode ser que eu esteja cometendo alguma impropriedade aqui. Mas tem a ver com a tipologia construtiva, ou seja, com a edificação que existe ali naquele terreno ou que vai ser construída no terreno.
Parece-me um equívoco. Quer dizer, o valor fundamental é o valor do terreno, não o valor da edificação ou da tipologia da edificação. É o valor do terreno. Normalmente, o IPTU tem esses dois componentes: o predial e o territorial. Então, a meu ver, o correto é você usar como base de cálculo o valor venal do terreno, o componente territorial e não o componente predial. E, também você tem o fator de multiplicação 0,8, que já foi explicado aqui pela Secretaria, mas, dentro da fórmula, tem outro valor multiplicador de 0,3. Eu não sei se compreendi corretamente, mas, na minha leitura, esse fator 0,3 também seria multiplicado dentro da fórmula, o que levaria junto com o 0,8, a 0,24.
Nós teremos uma outorga onerosa de apenas 24% do valor venal do terreno, que seria um valor muito baixo. Talvez seja o caso de revisar essa fórmula com bastante atenção. Além dos fatores de interesse social e econômico que estão presentes na fórmula para se incentivar determinados padrões de edificação, eu sugeriria que se considerassem fatores de planejamento como existem em São Paulo, por exemplo.
O que seriam esses fatores de planejamento? Uma série de propriedades que se deseja que os proprietários adotem nas suas edificações como, por exemplo, o que em alguns municípios se chama de gentileza urbana. A edificação que é amigável para a cidade, a edificação que oferece, por exemplo, espaços públicos e espaços privados de fruição pública, ou edificações que tenham cuidado especial com a água da chuva, de retenção da água da chuva, ou a fachada ativa.
Enfim, uma série de comportamentos que se deseja incentivar e esse poderia ser um elemento a ser incorporado na fórmula de cálculo da outorga. Coeficiente de Aproveitamento Mínimo, a meu ver, 0,50% do coeficiente básico é muito pouco. Realmente, eu considero injustificado.
Vamos considerar, eu apelo aqui para os nossos urbanistas presentes, quando se fixa um coeficiente máximo, na verdade, claro, existe uma preocupação com excesso de adensamento, mas já é o cálculo do que se deseja que seja edificado. Quer dizer, na verdade, nós queremos que a cidade edifique até o coeficiente máximo.
Você fixar o coeficiente mínimo abaixo do coeficiente básico é realmente muito pouco. No cálculo, o básico é 1, seria 0,5, então, me parece um equívoco. É um assunto que nós juristas discutimos pouco. Eu entendo que possa ter havido alguma preocupação aí da Procuradoria do Município, mas é um assunto que deve ser reavaliado.
Também não vejo nenhuma motivação para isentar a edificação unifamiliar ou bifamiliar, como está previsto ali. Na verdade, essa edificação possivelmente, em muitos casos, é de baixíssima densidade e é justamente o que tem que ser alterado para aumentar a densidade. Então me parece que também deveria ser revisto.
Na questão da outorga de alteração de uso, eu concordo com o que já foi colocado aqui, ela está muito restritiva, basicamente por causa de um terreno que pertence a duas zonas ao mesmo tempo. Me parece muito rígido e eu sugeriria fundi-la com a operação interligada num único conceito, aplicar para todo o território do município, sempre mediante contrapartida. Eu destacaria também que a fórmula de cálculo dessa alteração de uso lá no anexo é de extrema complexidade, eu confesso que não consegui entender. Eu acho que também merece uma preocupação específica.
Transferência do direito de construir, eu chamaria atenção pelo seguinte fato: na verdade, nós temos dois tipos de Transferência do Direito de Construir (TDC) no próprio Estatuto da Cidade. Uma em que o município adquire a propriedade do imóvel, que é aquela para equipamentos públicos e comunitários e regularização fundiária. E outra, que é aquela para quando existe uma restrição de uso do imóvel – patrimônio cultural, patrimônio ambiental.
Na verdade, podemos considerar que são duas situações completamente diferentes. Em muitos municípios, tratam diferentemente essas duas situações. Por que eu digo isso? Porque, no caso em que o município vai adquirir a propriedade do imóvel, nós devemos entender como a TDC como uma indenização, quase como uma forma de pagamento por esse bem. Então é perfeitamente correto o critério adotado, que é o do Coeficiente de Aproveitamento Básico. Mas, quando se está procurando fomentar a proteção do patrimônio cultural e ambiental, na verdade, é uma situação completamente diferente, é uma técnica de fomento, de apoio para que os proprietários conservem os seus imóveis, tanto que o próprio protetor diz que o imóvel tem que dar em boas condições para receber essa TDC.
Eu até diria de uma maneira um pouco diferente. Em geral, o proprietário não tem capital para manter o imóvel. A TDC é justamente o capital que vai permitir a reforma, a conservação ou o retrofit do imóvel. O importante é que a destinação dos recursos seja empregada em benefício do patrimônio cultural, mas mediante contrapartida.
Não é uma indenização: é uma contrapartida por um comportamento do proprietário. Nesse entendimento, eu diria que o coeficiente de aproveitamento básico talvez não seja o melhor critério. Você poderia ter vários outros critérios, não é? Em Belo Horizonte, em Curitiba, em São Paulo, há outros critérios para essas situações que permitem que as Prefeituras façam uso dessa proteção, porque, na verdade, pertence a elas como uma técnica de fomento, sempre mediante contrapartida do proprietário.
Eu também diria que poderia ter esses fatores adicionais, de planejamento, como eu mencionei para a outorga onerosa, ou seja, determinado tipo de comportamento poderia ter um benefício na transferência do direito de construir, e isso existe também em vários municípios brasileiros.
Parcelamento, edificação e uso compulsório são medidas extremamente importantes para a Cidade, está no Estatuto das Cidades – na verdade, na própria Constituição. Agora, eu entendi que a regulamentação está muito complexa, muito complicada, digamos assim. A quantidade de critérios, a quantidade de situações é excessiva, não é? Eu imagino que vá criar muito problema para o Município enfrentando os advogados dos proprietários, que vão sempre tentar se enquadrar em uma situação ou outra, de modo que não incida esse instrumento no proprietário, não é? Eu sugeriria uma revisão para simplificar esses critérios.
Também diria que...

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Victor, só para a gente concluir, por favor, por causa do tempo.

O SR. VICTOR CARVALHO PINTO – Pois não.
Considero extremamente oportuna a concessão urbanística, o reajuste de terrenos. Eu sugeriria que, talvez, se houvesse uma consolidação na própria operação consorciada – acho que são todos instrumentos voltados para requalificar as áreas já existentes na Cidade, do tecido do banco – e resolver o problema da propriedade fragmentada, que é quase insolúvel hoje. É extremamente importante.
Por fim, eu diria que acho muito importante que seja incorporado ao Plano Diretor algumas diretrizes que já estão na Lei do Reviver Centro, que é uma lei extremamente original, oportuna, e que trata de um problema que normalmente nós não tratamos bem nas nossas leis urbanísti
cas, que é a Cidade já existente. As certificações já existentes, seja de patrimônio cultural ou não sendo de patrimônio cultural.
Em geral, muito do que nós pensamos em desenvolvimento urbano tem que ser repensado quando nós tratamos da Cidade existente. O Reviver Centro foi muito feliz nisso. Acredito que algumas diretrizes deles devam ser trazidas para o Plano Diretor, para que não haja nenhum conflito de normas.
Muito obrigado pela oportunidade.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Victor.
Com a palavra, o nobre Vereador Dr. Rogério Amorim, Relator-Geral da Comissão.

O SR. VEREADOR DR. ROGÉRIO AMORIM – Boa tarde, Senhor Presidente. Boa tarde, nobres colegas presentes. Boa tarde a todos os participantes, e àqueles que nos assistem.
Eu queria, antes de tudo, parabenizar a Secretaria de Urbanismo e a Prefeitura do Rio de Janeiro pela elaboração de um Plano Diretor de grande complexidade, para o qual eu tenho muitas intercessões e concordâncias.
Concordo que é necessário darmos um passo à frente na utilização do solo na Cidade do Rio de Janeiro, facilitar critérios de edificação, adensar a Cidade, e, sobretudo, desenvolvê-la. Concordo plenamente em muitos pontos com a Prefeitura.
Não vou me alongar muito, até porque nossa obrigação é muito mais ouvir do que falar. Mas também vou só tocar no ponto do nobre colega do Instituto dos Advogados do Brasil, que fez uma menção muito bem colocada em relação à segurança jurídica e às regras que devem ser olhadas com muita atenção no que for previamente ao Plano Diretor serem mantidas, porque nós vivemos um cenário de insegurança jurídica muito grande no Rio de Janeiro.
Com algumas medidas que a Prefeitura até vem tomando nos últimos tempos, essa insegurança jurídica vem se aprofundando e nós já temos reflexos disso que podem causar graves transtornos na Cidade do Rio de Janeiro, como já vem causando. Eu queria fazer essa primeira observação.
Também tenho que coadunar com o nobre colega que apresentou por último, porque ele coloca muito bem que o coeficiente de aproveitamento mínimo de 50% – eu estava discutindo agora há pouco isso com o também nobre Vereador Pedro Duarte – nos parece pouco. Realmente, se nós temos uma mentalidade e estipulamos para uma região em desenvolvimento permitir apenas metade disso, não nos parece ser muito condizente com o que a Prefeitura pretende não apenas na construção, mas com o que ela pretende investir naquela região para que aquele plano possa ser efetivamente colocado em prática. Eu queria deixar essas duas observações inerentes a esse capítulo.
Entretanto, não posso deixar... Toda vez que me dão a palavra e que eu falo sobre isso, eu me sinto na obrigação de chamar a atenção principalmente da Prefeitura, e também da sociedade, para o que a senhora colocou muito bem no início da sua da sua planificação, da sua apresentação. Nós tivemos um Plano Diretor há 10 anos, e o que nós vimos não foi o crescimento para aquelas áreas em que se pretendia de verdade. E eu trago agora o questionamento público para todos nós que estamos aqui. Por que isso não aconteceu? A resposta me parece ser muito simples e não precisamos buscar em cálculos aqui.
É óbvio que não estou aqui menosprezando e não queria dizer que não tem influência a taxa de utilização do solo e como vamos fazer isso. Isso é de fundamental importância. Só que a resposta para essa pergunta majoritariamente não passa por isso. A principal resposta para essa pergunta é porque inexoravelmente as cidades crescem para a desordem ou fogem da desordem. Não existe outro caminho. Ou elas vão para a “desordem” – aí eu boto entre aspas essa desordem, porque não é que a população mais carente queira isso, mas ela acaba se escondendo em regiões em que não há regras e em que a Prefeitura não consegue adentrar – e se estabelece o que nós vemos aí hoje em dia.
Vemos isso muito claramente na região que a senhora menciona ali nas Vargens, no Recreio, onde nós temos claramente uma proliferação de pessoas que cresce a cada dia, invadindo, inclusive, aquelas áreas de proteção ambiental. E por que nós temos outra área que foge da “desordem”?
Por que será que eu coloco aqui como característica muito marcante que a região, por exemplo, ao redor da Avenida Brasil não prospera? Porque não adianta nós mexermos na taxa de ocupação de solo sem nos perguntarmos quem é que vai querer chegar do trabalho às 20h e não poder entrar na sua garagem porque pode atropelar o que se chamou pejorativamente de cracudo.
Se nós temos vazios territoriais – e aí eu não digo vazios territoriais de construção e de edificação, mas locais em que a Prefeitura sequer penetra –, quem vai querer avançar para aquilo ali, por mais que você imponha limites ou facilitações à construção daquela área? A Prefeitura já se perguntou por que São Cristóvão hoje não é uma área muito mais valorizada do que a Tijuca, minha Tijuca, nossa Tijuca, Vereador? Óbvio que nós temos ali dificuldades – o Vereador Pedro coloca muito bem – de edificações, galpões, mas a resposta não está aí. A resposta mais uma vez está nas condições em que a Prefeitura impõe ao bairro de São Cristóvão. Aí se fala de proteção do patrimônio cultural...
Eu visitei o pavilhão, o Centro Luiz Gonzaga de Tradições Nordestinas, em São Cristóvão. É uma verdadeira catástrofe o que nós temos ali. Tem um estacionamento totalmente sem transparência, com um esquema de segurança miliciano, entre outras coisas. O bairro de São Cristóvão, que foi citado aqui, está em frente à Quinta da Boa Vista, uma das áreas mais aprazíveis da cidade. É um ponto histórico de suma importância da Cidade do Rio de Janeiro.
Quem não gostaria de morar em frente à Quinta da Boa Vista? Eu mesmo respondo a essa pergunta. Eu. Porque à noite eu vou ter que lidar com uma zona de baixo meretrício, uma zona mal ocupada urbanamente e uma área em que a Prefeitura não olha com atenção devida. Então, eu não quero morar ali.
Óbvio que meu amor à Tijuca permanece, mas eu respondo à pergunta e vou mais além: quando nós avançamos, a cidade não avança para essas regiões, porque a forma com que está se vendo os novos trabalhadores ambulantes, é pintar as suas barracas de amarelo e não, de fato, procurar situações.
Estão transformando Vila Isabel, por exemplo, um bairro boêmio, histórico da Cidade do Rio de Janeiro, em mais uma zona de comércio popular mal organizado, em que se apenas pintaram barracas de amarelo e que a Prefeitura não olhou para aquilo ali com o cuidado devido. É óbvio que tem que ter o direito ao trabalho, são trabalhadores, são pais de família, mas, definitivamente, não é assim que resolveremos o problema.
Eu persisto nesse discurso, que eu sei que é enfadonho, que é chato, e até foge um pouco do tema, mas, se nós queremos fazer um Plano Diretor que, de fato, cumpra essas metas tão bonitas impostas pela Prefeitura, nós não podemos dissociar da realidade em que nós vivemos, principalmente em relação ao todo, ao macro. Não podemos, de verdade, fazer isso, senão nós vamos viver um conto de fadas, um Plano Diretor que nada mais é do que a Prefeitura no “país das maravilhas”, mas que, na verdade, ele não existe.
Não adianta mudar a taxa de ocupação do solo, se nós não nos preocuparmos efetivamente, por exemplo, com a expansão do poder paralelo na Zona Oeste. Se nós não entendermos por que a Cidade do Rio de Janeiro cresce em progressão aritmética e as comunidades crescem em progressão geométrica. Que não adianta escrever que nós vamos impor ecolimites e não formos, por exemplo, na Comunidade da Formiga e ver que esses ecolimites não funcionam de absolutamente nada. Que não adianta nós, dentro desta Casa, dentro da Prefeitura, olharmos para as comunidades como pontos de cadastro e de curral eleitoral – eu insisto com isso.
Nós não vamos mudar essa realidade trabalhando dessa forma e nós não podemos dissociar isso de um Plano, cujo trabalho foi maravilhoso e imenso da Secretaria de Urbanismo. Nós não podemos, de fato, descolar dessa realidade. Para terminar, eu não posso deixar de falar: há quantos anos a Prefeitura do Rio de Janeiro – anos mesmo, gestões – não investe, de fato, em um programa municipal de moradia?
O que nós vemos hoje em dia é a Prefeitura sendo o gestor. Hoje em dia... Eu usei o termo errado, há muito tempo a Prefeitura sendo gestora de planos de moradia, preferencialmente do Governo Federal, seja o “Minha Casa, Minha Vida”, seja o “Casa Verde e Amarela”. Vai mudando o programa federal, mas, na verdade, a Prefeitura não tem um programa dela.
Hoje em dia, nós vemos – ai, de novo, sempre que eu usar o termo “hoje em dia”, não estou me referindo a hoje, mas a um grande período histórico – que a maior parte do investimento, dos esforços da Secretaria Municipal de Habitação, está em chegar nesses conjuntos habitacionais e reformar praça. Lógico que é necessário, lógico que é fundamental, mas me soa muito mais eleitoreiro pintar uma quadra às vésperas de eleição do que, na Secretaria Municipal de Habitação, se debruçar em um programa que vise criar e incentivar moradias dignas para aqueles que precisam.
Mais uma vez, eu levanto essa reflexão e clamo: a reflexão não ideológica, mas realmente técnica, a cada um de nós, a cada um dos vereadores, ao Executivo, a cada um de vocês, que somos nós também, nós somos parte da Cidade do Rio de Janeiro, não temos diferença nenhuma, e parte das pessoas que estão aí nos ouvindo.
Mais uma vez, parabenizo a Secretaria de Urbanismo, o Secretário Washington Fajardo; a senhora, pela brilhante apresentação; e o Presidente Rafael Aloisio Freitas pela condução desta Audiência.
Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Vereador Dr. Rogério Amorim.
Com a palavra, o nobre Vereador Tarcísio Motta, Sub-Relator da Comissão.

O SR. VEREADOR TARCÍSIO MOTTA – Muito obrigado, Presidente Rafael Aloisio Freitas. Boa tarde, Subsecretária Valéria. Boa tarde, Vereadores Tainá, Dr. Rogério Amorim, Pedro Duarte, Chico Alencar, Marcio Santos. Eu tinha visto o Rocal aqui também, demais vereadores que nos acompanham pelo Zoom. Eu vi a Vereadora Teresa Bergher. Boa tarde também aos técnicos da Prefeitura aqui presentes; e boa tarde especial aos movimentos da sociedade civil organizada que estão aqui acompanhando. Boa tarde, ainda mais especial, aos trabalhadores ambulantes que estão ocupando as nossas galerias, sabendo inclusive que tivemos um ato legítimo acontecendo aqui no Centro da cidade, reprimido, agora, à bomba de gás lacrimogênio, tiros de bala de borracha, é assim que o estado tem tratado trabalhadores ambulantes e, olha, é decisivo Presidente Rafael, que a gente trate dessa questão inclusive na audiência do Plano Diretor que vai tratar sobre o Centro da cidade.
O Reviver Centro segue sendo um instrumento para repressão daqueles que estão tentando ganhar a vida trabalhando e a Prefeitura não está resolvendo esse tipo de situação. Nós estaremos ao lado dos trabalhadores, hoje teremos uma reunião com o Presidente da Casa, Vereador Carlo Caiado, com o Líder do Governo, Vereador Átila A. Nunes, às 15horas, para tentar encaminhar algumas dessas demandas. Vocês são sempre bem-vindos e bem-vindas à Câmara de Vereadores, vamos seguir acompanhando essa discussão.
Eu queria começar citando Paulo Freire. Estamos numa audiência em que a gente está tratando das questões urbanísticas da cidade, mas eu acho que essa frase cabe: “É fundamental diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, de tal forma que num dado momento a tua fala seja a tua prática”. É o debate sobre a coerência de um governo e também é debate da coerência entre aquilo que se diz nos capítulos iniciais das diretrizes, princípios...
A Valéria muito bem colocou ali na apresentação da Prefeitura, os sonhos da Prefeitura para a cidade e aquilo que se faz na prática, os instrumentos que serão aplicados para atingir as diretrizes.
Eu acho curioso, por exemplo, que a fala, nobre Vereador Dr. Rogério Amorim, começou de forma meio confusa eu acho, por exemplo, Rogério, muito difícil quando a gente ouve a expressão “proliferação de pessoas”. Pessoas não proliferam, ocupam espaços, buscam moradia, estão atrás de condições dignas de viver, muitas vezes acabam, para que tenham a mínima condição de sobreviver ocupando áreas de risco, áreas ambientalmente que deveriam ser protegidas, esse é um problema grave, mas tem que tomar cuidado, as pessoas não proliferam, elas estão buscando sua sobrevivência, tentar buscar o mínimo de dignidade, muitas vezes ocupam áreas absolutamente de risco para as suas vidas porque é isso que está mais perto do emprego, isso que vai colocá-las numa situação... É a última chance, a última forma de moradia. Mas o final da tua fala foi absolutamente correta.
Você sabe que ontem na audiência sobre orçamento eu chamei atenção de que... Nós tivemos aqui uma audiência... E orçamento é a possibilidade de que a distância entre o que se faz e o que se fala, do ponto de vista do poder público, aquilo que você promete fazer tem que estar traduzido em recursos, em política pública. E, ontem, aqui eu vi uma audiência sobre a situação do orçamento do ano de 2021, o primeiro ano de gestão do Eduardo Paes, comparado ao último ano de gestão do Crivella.
Portanto, vamos combinar que não era um padrão de comparação muito alto, a gente não estava partindo de um patamar alto para comparar. Só para a gente começar a conversa. E aí, embora o início esteja assim: “olha como nós atingimos excelentes resultados fiscais”. Era inegável aumento de arrecadação, diminuição de despesas...
Do ponto de vista fiscal, olha que maravilha! Mas dentro da apresentação da Secretaria Municipal de Fazenda, tenho uma cópia aqui, estava lá a evolução das despesas empenhadas por função de governo. Aí quando eu olhei habitação, caiu de R$ 77 milhões no último ano do Crivella para R$ 44 milhões no primeiro ano do Eduardo Paes. Quando eu fiz a pergunta, a Secretaria de Fazenda... Ano de pandemia, recurso... Teve uma coisa que foi excepcional do ano passado.
Eu pedi minha assessoria para olhar ao longo do tempo. Ao longo do tempo, os gastos de habitação têm caído sistematicamente no Município do Rio de Janeiro e, portanto, se a gente quer resolver o problema do déficit habitacional, se a gente quer, de fato, resolver o problema da moradia, se a gente quer, de fato, produzir uma cidade mais justa, tem que alocar recursos para isso e isso está no centro do debate desta audiência, que é o debate onde nós estamos incluindo instrumentos que são de arrecadação como outorga onerosa do direito de construir e não estamos dizendo para onde eles vão.
O Barandier apresentou isso aqui agora na hora da análise e isso em minha opinião é o centro da crítica que eu queria fazer algo que está colocado aqui. Outorga onerosa do direito de construir está correta. O Professor Martim estava aqui se apresentando o Martim, de forma absolutamente didática, porque temos que adotar esse tipo de situação sobre quem cria riqueza sobre a renda da terra.
Eu não vou nem tentar repetir isso, mas temos que implementar a outorga onerosa do direito de construir. Vamos discutir esse processo de transição que precisa existir. Ele é mais acelerado, senhores, ou não é? Como a gente vai fazer isso? Perfeito, mas para aonde vamos destinar esses recursos tem que estar coerente com aquilo que a gente definiu como diretrizes e princípios que a gente vai pactuar socialmente aqui, neste debate do Plano Diretor.
Eu não tenho a ilusão de que o Estado é um organismo acima da sociedade ou que ele é neutro. Ele está atravessado por interesses que atravessam e disputam espaço. Isso aqui é o espaço da disputa, o Parlamento é um dos lugares para isso. Aí, temos que ter a clareza de que a racionalidade individual econômica da especulação imobiliária é contrária à racionalidade do bem público da Cidade, e isso significa ter que impor um limite a essa irracionalidade da especulação imobiliária.
Por isso, outro instrumento, que é o Peuc, IPTU Progressivo no Tempo, desapropriação, é outro instrumento que está correto estar aqui. Quero dizer que vamos defender a existência desses instrumentos. Acontece que, por exemplo, no caso do IPTU Progressivo no Tempo, temos que estabelecer prazo para ele estar regulamentado. No final das contas, embora ele tenha avançado em relação ao último Plano Diretor, como a regulamentação dele fica a cargo do Executivo, ele pode virar mais uma vez uma letra morta – e nós vamos passar mais dez anos em que ele não esteja... É decisivo ter uma emenda que estabeleça qual prazo a Prefeitura tem para regulamentar esse instrumento, que nós sabemos que não é de aplicação imediata, tem a notificação pelo parcelamento e uso compulsório, você tem todo o processo para tramitar, mas é preciso regulamentá-lo com alguma agilidade.
Assim como é princípio, e aqui eu sei que vou comprar uma briga com o Vereador Pedro Duarte e o Secretário Pedro Paulo. Pedro Paulo está doido para arrecadar, mas não quer vincular a arrecadação a fundo nenhum, esse é o problema. Nós vivemos essa briga aqui, essa discussão é decisiva também.
Eu quero dinheiro para o Fundo de Habitação de Interesse Social e acho, Valéria, um erro não estar aqui o Fundo de Mobilidade Urbana, porque é isso. No Fundo de Desenvolvimento Urbano, nós temos algumas questões sobre mobilidade. Mas onde as políticas de mobilidade são de fato definidas é no Fundo de Mobilidade Urbana Sustentável, que não está no Plano. Aí, precisamos colocar isso e precisamos discutir da outorga onerosa, desses instrumentos arrecadatórios, e de quanto vai para a Habitação de Interesse Social.
Mais uma vez, não lembro quem falou, se foi Barandier ou Fabricio, que o art. 99 apresenta coisas absolutamente gerais, instrumentos e coisas de desenvolvimento urbano. Tudo cabe no desenvolvimento urbano, de reforma da pracinha com interesses eleitorais até as obras de drenagem e asfaltamento.
A gente precisa definir como vamos inverter nesta lógica, que o orçamento da Habitação cai ano após ano. Como vamos reduzir a diferença entre o que a Prefeitura fala e o que ela faz de fato. Isso é com alocação de recursos e a alocação de recursos está no centro do debate da Audiência de hoje e da semana que vem. Ao mesmo tempo, acho que há alguns instrumentos, e aí vou entrar em outra história porque, por enquanto, aqui eu estou tentando defender algo que a Prefeitura colocou no Plano e dizendo: “Vamos regulamentar mais, vamos até o fim, vamos diminuir a distância entre o que se fala e o que se faz”.
Por outro lado, preocupam-me instrumentos como operação urbana simplificada, preocupa-me a forma como está colocada aqui, porque, às vezes, é interesse do mercado que algumas coisas sejam detalhadas para garantir os interesses deles e às vezes é o inverso. É necessário que determinadas coisas sejam genéricas demais, para que possam ser utilizadas ao bel prazer dos interesses econômicos do mercado. Essa é a lógica do Cidade Balcão de Negócios, que a gente precisa acabar, foi isso o que nos levou à Cidade que temos hoje, injusta, desigual, com desemprego, com porrada para cima de camelô.
Essa lógica precisa ser revertida, o Estado não pode ser um espectador. Aí, a gente não pode ter instrumentos no Plano que sejam mecanismos de burlar o próprio Plano, desde que você tenha dinheiro para pagar e essa história está presente em vários instrumentos. E esse esteve presente ao longo dos últimos anos, todas as vezes que nós, na Câmara, votamos Lei da Mais Valia “para lá”, Lei da Mais Valerá “para cá”. Pagando, pode tudo. Isso está errado, é a antítese do que deveria definir o Plano Diretor – isso está previsto em uma série de instrumentos aqui colocados.
Na verdade, não dá para institucionalizar um lobby do setor da especulação imobiliária, um lobby imobiliário, que é isso que vai acontecer com esses instrumentos que estão ou genérico demais, ou facilitadores demais para que isso aconteça.
Aí, no final, a gente aprova um Plano Diretor e diz: “mas quem pode pagar pode burlar tudo aquilo que a gente está definindo no Plano Diretor”. Isso não é planejamento. Isso é construir, numa lei que obrigatoriamente tem que ter planejamento, institucionalizar esse lobby da cidade, um balcão de negócios sobre o qual a gente não deveria traduzir aqui e repetir erros do passado. Portanto, Senhor Presidente, é um pouco essa a minha leitura geral desses instrumentos.
Estou aqui tentando ouvir. Semana que vem, talvez, ainda chegando a algum detalhamento maior sobre algumas dessas questões, mas esse elemento de “vamos pra cima” na questão da outorga onerosa do direito de construir, vamos vincular esses recursos para as prioridades que a gente está definindo. Vamos claramente dar prazo para a Prefeitura regulamentar o IPTU progressivo no tempo e vamos ter que impedir, retirar, diminuir a forma com que acontece hoje a gestão da cidade – em que tendo dinheiro a gente burla as próprias regras urbanísticas que a gente está definindo aqui.
Esses são os princípios que, em minha opinião, nosso mandato, nossa bancada do PSOL vai defender, e com os quais a gente vai seguir dialogando com os movimentos da sociedade civil. Um grande abraço aos camelôs da nossa cidade.
Muito obrigado, Senhor Presidente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Vereador Tarcísio Motta.
Com a palavra, o Vereador Pedro Duarte, Membro Suplente da Comissão.

O SR. VEREADOR PEDRO DUARTE – Bom dia, Presidente. Bom dia a todos os presentes, amigos vereadores, Valéria, representando o Poder Executivo.
Gostaria de fazer uma fala com relação a alguns dos instrumentos. Temos muitos aqui hoje em debate. Inclusive, quero agradecer as falas que me antecederam. Vou tentar acompanhar alguns dos pontos.
Com relação à outorga onerosa, o Vereador Tarcísio fez uma referência, vereador, mas nesse caso nós não discordamos. Até pudemos acompanhar, ainda em agosto do ano passado, na volta do recesso legislativo de meio do ano, uma apresentação da Prefeitura que previa a existência do fundo imobiliário, do Fundo de Desenvolvimento Urbano. Inclusive já fizemos brincadeiras que, na verdade, quem derrubou foi o próprio Vereador Tarcísio ao apontar a incoerência da Prefeitura, que vinha defendendo a desvinculação de muitos fundos, mas defendia ali, no primeiro momento, a existência do Fundurb.
Depois, pelo que ouvimos, na verdade, numa queda de braço entre a Secretaria de Urbanismo e a Secretaria de Fazenda, prevaleceu a posição do Secretário Pedro Paulo de que os recursos deveriam ir para o caixa único. Eu discordo radicalmente disso, apesar de, no geral, também votar a favor da desvinculação de fundos por alguns motivos. Como já foi pontuado, inclusive pela fala do advogado do Instituto dos Advogados do Brasil – sou advogado também –, temos o ponto da legalidade. O estatuto da cidade prevê esse instrumento e determina a destinação das receitas.
Nós não podemos, por uma lei municipal, dizer que aqui no Rio de Janeiro a receita não será de uso obrigatório, mas prioritário. Sabemos como técnica legislativa que o prioritário é uma forma sutil de simplesmente liberar o uso dos recursos, porque ninguém depois vai fiscalizar o que deveria ser prioritário e o que não deveria. Então, o tema tem que ser obrigatório por determinação do Estatuto da Cidade, pelos argumentos já expostos, com o que eu concordo.
Estamos retirando recursos da terra que devem ser devolvidos à expansão da cidade com qualificação, com ordenamento urbano, com investimento – e essa é a forma com que você captura o valor em alguns pontos da cidade e permite a expansão qualificada em outros.
Por fim, o terceiro argumento é a transparência. Eu fiz minha pós em São Paulo, tive a oportunidade de tratar de instrumentos urbanísticos e acompanhei, tentei ter algum acesso aos dados pelo FMDU, o nosso Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano aqui no Rio de Janeiro, que é esvaziado, não tem recursos, não tem transparência. Inclusive, há vários alertas do Tribunal de Contas avisando que existe lá algum recurso parado há mais de 10 anos que nunca é utilizado.
Enquanto isso, o de São Paulo, o Fundurb, tem muita transparência. Exatamente o que arrecadou, com o que está sendo gasto, o percentual que vai para mobilidade, o percentual que vai para habitação, o percentual que vai para cada área, conselhos, reuniões frequentes. É uma vergonha que o Rio de Janeiro passa quando comparado a São Paulo.
Com a minha experiência recente, apenas aqui 15 meses de mandato, mas na minha experiência com o Executivo, eu prefiro um fundo estruturado, com governança, com conselho, com transparência. Porque depois não adianta dizer: “Não, nós vamos prestar contas, é só mandar um RI. Manda um requerimento de informação, vereador. Você vai ter acesso”. Todos os vereadores aqui sabem a dificuldade que é ter acesso a qualquer informação do Poder Executivo.
Então, que esteja num fundo, com governança, com conselho, com transparência, para que todos nós, cidadãos, sociedade civil, instituições, vereadores, possamos fiscalizar a destinação dos recursos. Prioritário... é balela que o Executivo está querendo passar. Isso com relação à outorga.
Também defendo que a gente possa debater a transição do modelo. Eu estive em São Paulo, na Secretaria de Urbanismo, na Secretaria de Licenciamento. E lá o processo se iniciou em meados de 2000 e só foi ser concluído em 2015. Foram mais de 10 anos para aplicar a outorga onerosa. Não estou dizendo que precisamos demorar todo esse tempo, mas acho que a gente tem que discutir a fórmula de transição.
Lá, por exemplo, em alguns lugares, o coeficiente básico inicial era diferente. Então, em áreas que nós queríamos incentivar, expandir, como é o caso, aqui no Rio de Janeiro, da AP-3, da Zona Norte, talvez o coeficiente básico pudesse começar maior, de forma a incentivar o investimento prioritário nessa região. Nós temos que debater isso, fórmulas de transição, quais são as regiões que... tudo vai começar com coeficiente básico, igual, todas as regiões da cidade?
Não foi assim em São Paulo, acho que a gente tem que olhar as cidades que implementaram o modelo e ver como foi a transição feita lá. Aqui no Rio, me parece que é tudo de uma vez, isso pode causar um solavanco grande, porque ainda que o terreno – e eu concordo, ele vá ser precificado no médio prazo, isso é um médio prazo. No ano seguinte, daqui a um ano, as pessoas não precificaram, elas ainda acreditam que o terreno dela vale R$ 10 milhões.
Daqui a alguns anos, ela vai entender que o terreno dela perdeu valor, porque, agora, a outorga está capturando isso. Mas isso demora alguns anos para acontecer, e em São Paulo teve um pico para baixo do investimento imobiliário, e é muito importante que nós suavizemos isso, porque no Rio de Janeiro precisamos de geração de emprego, precisamos de geração de renda e a cidade já não está nos seus melhores anos. De 2016 para cá, nós sofremos muito. Então, eu só quero que a gente aprofunde esse debate ao longo das próximas audiências.
Com relação ao déficit habitacional, eu concordo 100%, parece que a Prefeitura não quer assumir o papel dela, fica querendo resolver o déficit habitacional com cota de solidariedade, por meio de obrigações, incentivos, mas a realidade é que, assim como nós investimos em Saúde, investimos em Educação, a Prefeitura tem que assumir o papel dela de investir no déficit habitacional. São Paulo acabou de anunciar, vai comprar unidades da iniciativa privada. “Produzam imóveis”, ele deu a regra, a Prefeitura de São Paulo está dando a regra, “Eu quero imóveis até determinado valor, que tenham dois quartos e determinada metragem mínima”, e ela vai comprar. E aqui, a Prefeitura foge, não quer gastar o dinheiro com habitação e fica tentando resolver isso com obrigações dentro da legislação que apenas oneram quem está querendo investir, obriga uma conta de solidariedade que depois se transforma em centenas de lotes públicos sem destinação.
Relacionando esses imóveis públicos abandonados com o tema do IPTU progressivo, ao qual, eu adianto, sou contrário, por não ver nele um instrumento eficaz, e temos um paper de um Professor muito atuante no debate do urbanismo, em que ele aponta como o instrumento não funcionou no Brasil. Primeiro, qual problema nós queremos resolver? “Ah, existem lotes que não são edificados, existem imóveis que não são vendidos”. Em quais regiões da cidade? Nós sempre lembramos do Centro. Quando nós vamos olhar o Centro, os principais problemas são de regularização fundiária, titularização de imóveis, invasão, nós não temos uma situação de segurança jurídica sequer aqui, no Centro, e por isso muitos dos imóveis não são vendidos.
Hoje, a gente joga no Google, o Globo, várias matérias apontam: 40% de vacância, 30% de vacância. Então, como é que a gente vai cobrar IPTU progressivo em áreas que têm extrema vacância, que têm grande vacância, o que está acontecendo? Esse instrumento não resolve o problema. E aí, nós temos que entender, primeiro, qual problema nós queremos resolver. O segundo é se nós temos mapeados, quais são as regiões, porque aqueles imóveis não são vendidos e o que acontece, e se o IPTU progressivo é a forma de resolver esse problema.
Eu venho na questão dos imóveis públicos. Eu estou desde o ano passado, eu, meu gabinete, nosso mandato, atuando diretamente nisso. A Prefeitura tem 7 mil imóveis públicos. E aí, nós fomos a campo, no Centro da cidade, mais de 50% deles são estacionamentos, a própria definição de subutilização, estão abandonados, sem destinação. Nós vamos a vários bairros da cidade, Cascadura, Méier, Zona Sul, nós rodamos toda a cidade e, na maior parte dos casos, os imóveis da Prefeitura estão abandonados e sem destinação. Sobre eles, não vale IPTU progressivo, sobre eles não tem coeficiente mínimo, não tem regra nenhuma. A Prefeitura simplesmente tem o direito de deixar centenas, milhares de imóveis sem destinação.
Quando a gente fala aqui de coeficiente mínimo, a GEO de Irajá super bem posicionada, próxima ao metrô, um área enorme, com construção de um andar. Se fosse um terreno privado, a gente estaria reclamando que é um absurdo, não cumpre sua função social, não faz acontecer, mas a Prefeitura quer fazer IPTU progressivo, quer ir em cima do privado, mas ela própria não dá o exemplo na gestão do seu patrimônio. Então, nós temos que entender o que leva a iniciativa privada hoje a não dar destinação nos seus imóveis e também cobrar que a Prefeitura, que o poder público, a Prefeitura, o Governo do Estado e a União tenham o papel de dar, no mínimo, exemplo na hora da gestão dos seus imóveis.
Para finalizar, a transferência do direito de construir. Aqui até apontar uma divergência. A Valéria pontuou, em sua fala, da rivalidade que acaba tendo a transferência de direito de construir com a outorga onerosa, mas eu acho a transferência um instrumento muito justo, porque nós do poder público nós fazemos uma intervenção na iniciativa privada, pego o imóvel e falo: “Esse imóvel está tombado”, o que eu acho correto. Imóvel tem valor histórico, tem valor cultural, tem que tombar, tem que preservar.
Às vezes, nós vamos decretar uma área de proteção ambiental e é justo que o dono daquela propriedade, se ele não vai ser indenizado, que ele possa pegar o direito de construção, o básico pelo menos, o direito de construção que ele tinha ali e que ele possa vender para que esse direito de construir seja utilizado em outro lugar. A Prefeitura diz que o instrumento vai existir, mas coloca tanta regra, limita tanto, e o motivo é muito simples: a Prefeitura não quer que concorra com a outorga onerosa.
Aí é uma visão de caixa. Nós estamos tombando, nós estamos fazendo proteção ambiental, o que é muito justo, mas que o dono daquela propriedade possa, pelo menos, vender, transferir o seu direito de construir para outra região e que isso seja descontado da outorga onerosa. É assim que funciona em Curitiba, um exemplo de proteção do patrimônio histórico. E é muito justo que o dono da propriedade...
Se não, ele começa a trabalhar contra o tombamento. Ele começa a trabalhar contra a proteção. E nós temos vários casos de que o dono do imóvel sabe que está tendo a discussão de um tombamento e ele coloca abaixo seu prédio porque ele sabe que ele não vai ganhar nada em cima daquilo. No mínimo, a transferência do direito de construir tem que ser um instrumento mais valorizado por todos nós aqui do poder público.
Muito obrigado, Presidente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Vereador Pedro Duarte.
Com a palavra, a Vereadora Tainá de Paula, Vice-Presidente da Comissão.

A SRA. VEREADORA TAINÁ DE PAULA – Depois do Pedro, nobre Presidente. Primeiro, boa tarde. Saudar os trabalhadores volantes presentes. Saudar a sociedade civil que nos acompanha pelo Zoom, os técnicos da Prefeitura, os técnicos da Casa, planejadores, ativistas urbanos e, claro, todos aqueles que me antecederam.
Eu quero colocar e fraternalmente dialogar com a Prefeitura, e espero que a Valéria retome em sua fala, e, claro, todos que quiserem contribuir com esse diálogo que eu quero estabelecer aqui, é minha profunda preocupação com o sentido e os fundamentos que nós queremos colocar e marcar neste Plano Diretor. Desde nossa primeira audiência, nós temos falado muito sobre o diagnóstico da pobreza profunda da cidade do Rio de Janeiro, que nós temos um histórico de sermos coniventes com uma leviandade institucionalizada sobre o Plano Diretor.
Nós tivemos o Plano Diretor de 1992, onde perdemos algumas oportunidades de regulamentar instrumentos já suscitados e já desenhados de forma inicial naquele momento de Brasil. Tivemos a oportunidade de regulamentar em 2011 e deixamos esse debate correr nesta Casa. Nós não fizemos uma discussão profunda sobre IPTU progressivo, nós não fizemos uma discussão profunda sobre outorga onerosa e vários outros instrumentos que retornam em 2022.
E me entristece, de certa forma, e ao mesmo tempo me instiga, de certa forma, porque finalmente no movimento histórico esta Casa de Leis pode reparar esta ausência, e não transformar um plano diretor em folhas de papel que não aprofundam o debate, que nem regulamentam. Discordo, nobre vereador Tarcísio Motta, nós temos que indicar prazo em todos os instrumentos que estão colocados aqui no Plano Diretor, não apenas no IPTU progressivo. E aí quero dialogar diretamente com o Vereador Pedro Duarte.
Vereador Pedro Duarte, gostei muito da sua fala que defende o Estatuto da Cidade, e é importante que, sim, a gente analise quais cidades o IPTU progressivo, e qualquer outro instrumento que funciona no Brasil, e por que ele não vem funcionando. Os instrumentos não estão desarticulados e não serão aplicados em forma desarticulada.
Ele precisa estar vinculado ao direito de preempção, que, por sua vez, precisa estar dialogado e articulado com o parcelamento compulsório e com todos os outros instrumentos dessa cadeia, que precisa ser contínua e que precisa ter instrumentalização para acontecer na esfera pública.
A Secretaria Municipal de Urbanismo e a Prefeitura do Rio de Janeiro precisam se preparar para aplicar os instrumentos. Quero aprofundar ainda mais o debate quando a gente fala dessas aplicações porque a Cidade do Rio de Janeiro vem se acomodando. Quero aprofundar e recortar uma fala do Vereador Tarcísio, que não é apenas em um instrumento e em uma prática num determinado bairro. A Secretaria de Planejamento e Urbanismo da Cidade do Rio de Janeiro perpetuou a prática do balcão.
Nós reforçamos essa prática no Reviver Centro. Os ambulantes que estão aqui sabem, dialogaram muito sobre isso. As operações interligadas, da forma que foram implantadas, nada mais são do que a nossa chancela em determinar o diálogo a varejo, a toque de caixa a partir das oportunidades ou do senso de oportunidade que o mercado está apontando para o Executivo, e não ao contrário.
O sentido do Plano Diretor é: nós precisamos apontar os rumos da cidade para onde ela se desenvolve e deve se desenvolver em 10 anos. E aí, a discussão da pobreza territorializada que a gente consegue apontar a partir do Índice de Progresso Social que o próprio IPP instituiu, deve ser replicado na aplicação dos instrumentos. Quero retomar a fala do arquiteto e urbanista Sérgio Magalhães na audiência anterior. Nós temos problemas graves no processo de espraiamento da Cidade do Rio de Janeiro e, infelizmente, esse capítulo dos instrumentos não reflete sobre isso.
Anteontem, perdão, foi o Dia Mundial da Água. Nós fizemos nossa audiência anual sobre o debate do saneamento – em que pese, a maioria das empresas concessionárias veio aqui na Câmara de Vereadores. E por que estou dividindo esse diálogo? Não há nenhum debate sobre o Fundo de Saneamento da Cidade do Rio de Janeiro. Mesmo o Fundo de Saneamento tendo que receber R$ 6,7 bilhões só nos próximos três anos. Dividindo isso ao longo dos próximos anos, seriam 2,23 alguma coisa em cada ano.
Estou fazendo um recorte do Fundo de Saneamento porque nós precisamos apontar no Plano Diretor não só o Fundo de Saneamento, mas o Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb), o Fundo Municipal de Habitação e, com esses fundos, serão preparados, inclusive com participação popular e intervenção popular, nobres ambulantes, a partir desse momento.
Não é nenhum mérito do Executivo Municipal, não é nenhuma doação desse Executivo. Existe um debate constitucional sobre a aplicação dos recursos para melhoria e investimento nas áreas vulneráveis da cidade. E isso não está refletido ainda nesse capítulo e nos outros capítulos. Na teoria, é tudo muito fácil.
Quero reforçar que, para além de nós não termos um planejamento para as novas unidades habitacionais, quero parabenizar a Secretaria de Planejamento por ter vislumbrado alternativas para além da produção, exceto... nobre Professor Martim Smolka pontua muito sobre o impacto do valor da terra na produção da moradia e fico feliz desse executivo falar sobre locação social, falar sobre melhoria habitacional, falar sobre as favelas.
Nós somos a cidade do Favela-Bairro e do Morar Carioca. Mas, afinal de contas, de onde sairá o dinheiro para dar conta da realidade que é o Rio de Janeiro ser uma das cidades recordistas em vulnerabilidade territorial em favelas? Temos uma das maiores favelas mais adensadas do mundo! Está aqui e o Rio de Janeiro precisa dar conta disso.
O dinheiro vai sair de onde? Temos que aguardar um próximo Governo Federal que veja a Cidade do Rio de Janeiro? Temos que orar, fazer oferenda para que não tenhamos outros pastores, bispos, ou qualquer outra conivência narcomiliciana nos territórios? Ou nós vamos ter que cobrar que Eduardo Paes faça, finalmente, não uma análise da profunda tragédia que foi Marcelo Crivella, mas diga e aponte qual é a cara da gestão que ele tem, o compromisso que ele tem com os mais pobres vulneráveis das favelas.
Afinal de contas, a agenda que aconteceu na Cidade do Rio de Janeiro até hoje, nos mais de 10 anos, mais de uma década que Eduardo Paes esteve à frente da Prefeitura do Rio, veio de outros recursos, seja pelo programa Somando Forças do Governo Estadual, seja pelo PAC Mobilidade, PAC Grandes Favelas e Minha Casa Minha Vida, todos do Governo Federal. Mas, afinal de contas, qual é a agenda para mitigação do déficit habitacional que o Município do Rio de Janeiro sob a gestão de Eduardo Paes irá tomar?
Para finalizar, eu quero ressaltar dois grandes problemas que esta Casa de Leis está se debruçando e já temos audiências convocadas para discutir, que não deveriam estar deslocados desta discussão aqui, que são a ampliação da Companhia de Desenvolvimento Urbano da Região do Porto (CDURP) para a Companhia Carioca de Parcerias e Investimentos (CCPAR). Uma empresa pública nova, com caráter ampliado, Vereador Tarcísio Motta, que não só irá dizer sobre e rezar sobre operação urbana do Porto Maravilha, mas estará disposta a elaborar outras operações urbanas sem passar pelo debate do Plano Diretor.
Eu preciso puxar a sua orelha, nobre Vereador Pedro Duarte, que me fez um projeto de lei que reza sobre a alienação dos próprios municipais, descolada dessa discussão aqui. Precisamos inserir a discussão dos próprios municipais e dos vazios impelidos e construídos pela iniciativa privada.
Venho discordar de novo do senhor. A propriedade, a iniciativa privada da Cidade do Rio de Janeiro precisa ser responsável pelo estoque fundiário que faz e escolhe, escolhe explorar e alimentar o aumento do valor de terra para lucrar mais no curto, médio e longo prazo. Isso precisa ser falado e refletido. O clube do America, que sempre trago à tona para dialogar com o nobre Vereador Dr. Rogério Amorim, que gosta tanto da Grande Tijuca, é um exemplo claro do que a iniciativa privada faz: derruba um patrimônio histórico da cidade, não constrói as unidades habitacionais, que devia construir, porque “há a condicionante do mercado, há uma variante colocada na mão de obra colocada”, dá uma série de explicações para não construir e estabelece um vazio urbano por mais de sete anos na Cidade do Rio de Janeiro.
Esse é um retrato extrato do que foi feito na Barra da Tijuca, do que foi feito em Jacarepaguá, do que foi feito na Grande Tijuca e, se nós não formos contundentes na avaliação disso, também fará nos próximos 10 anos na Cidade do Rio de Janeiro.
Obrigada.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Vereadora Tainá de Paula.
Vou fazer algumas observações também, até pegando o gancho das falas como um todo. Acho que em primeiro lugar todas as pessoas vão concordar que todos nós aqui queremos como objetivo final do texto que seja realmente um plano diretor que na prática funcione. Temos a visão clara que o de 2011 é só o papel.
A gente quer trabalhar junto com o Poder Executivo, os vereadores, a sociedade civil para que seja um texto realmente prático, que possa fazer valer. Então, fazer só algumas observações mais específicas, Valéria, em relação ao texto, com tudo que foi falado. Por exemplo, realmente os instrumentos, eu acho que eles precisam ter uma aferição mais clara do monitoramento dos prazos. Talvez alguns, até na minha opinião, estão com o prazo alongado, pode começar mais cedo.
No artigo, esse artigo que fala do Plano de Estruturação Urbana (PEU), que é lá no início. Realmente esse PEU que está aqui o nome parece ser diferente daquele PEU que a gente está acostumado a lidar aqui na Câmara, seria mais um PEU ligado a intervenções urbanas, não uma estruturação de alterações mais profundas. Então, não sei se esse nome é um nome talvez ideal para se chamar esse Plano de Intervenções Urbanos ou Estruturações Urbanas. Então, fica essa observação. E também qualquer projeto que seja um pouco mais específico em relação a essas alterações não pode ficar só a cargo do Executivo, sempre tem que ter alguma lei complementar na Câmara para consolidá-la e aprová-la. Vamos lá.
No art. 93, que fala dos coeficientes de aproveitamento mínimo. Diz aqui que “os imóveis residenciais uni e bifamiliares ou de interesse ambiental não ficam sujeitos ao coeficiente mínimo”. Pergunta: os grupamentos de uni e bi também estão incluídos aqui? Ou só aleatório? Se os grupamentos também estão incluídos? Ok? Esse é um questionamento.
Agora, pegando o art. 95. Também é parecido com aquela questão da “prioritariamente”, não é? Porque ele fala do monitoramento do impacto ali da outorga onerosa, mas também não dá um prazo de monitoramento, não é? Essa avaliação.
No art. 96, aí algumas questões em relação ao próprio mercado em si, porque há algumas situações que o pagamento da contrapartida tem que ser total logo de cara, mas há algumas construtoras menores, por exemplo, que precisam do financiamento, pagam uma parte, faz o financiamento para pagar o restante. Se não cabe fazer uma avaliação em cima disso para não ficar somente com os grandes, não é? No art. 99 essa questão da “prioritariamente”...
No art. 100, que fala da outorga onerosa de alteração de uso. Ninguém ainda comentou, mas em caso da reconversão de edificações tombadas ou preservadas? Então, está aqui dentro da subseção de outorga onerosa de alteração de uso; ou seja, quem quer realizar esse ato tem que pagar. Mas a gente aprovou aqui o Projeto de Lei Complementar nº 136, que virou a Lei Complementar n° 232, que pode fazer essa reconversão sem a contrapartida, não é? Então, como ficaria essa dicotomia entre o Plano Diretor e essa Lei Complementar n° 232? Se quiser comentar.

A SRA. VALÉRIA HAZAN – Desculpe. Muito rapidamente só esse assunto.
A Lei Complementar n° 232 estava tramitando aqui no Poder Legislativo quando nós estávamos finalizando a redação aqui do Plano Diretor. Há lá nas disposições finais um artigo que menciona a questão de que para a reconversão vigora a lei específica, até porque a gente não sabia a numeração que seria. Mas isso vai ter que ser um pouco mais adequado, ok? Há várias adequações, na verdade, que eu queria explicar. Só que estamos anotando tudo, e checando tudo, e compilando tudo para fazer, depois, sugestões de alteração.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Exato.
Valendo a lei específica, a gente conseguiria fazer essa reconversão das edificações tombadas ou preservadas sem a outorga, correto? Seria, assim, o meu entendimento inicial, não é? Aí o Executivo e o Legislativo vão depois brigar por essa situação.
Aí também, mais embaixo, há a mesma palavra ali usada no art. 101, na outorga onerosa da alteração de uso, que é o “prioritariamente” com as mesmas finalidades do outro. Aí também ter que fazer um ajuste, não é?
No art. 103, fala na transferência do direito de construir. Também, talvez, falte dar uma aprofundada em relação a como esses locais serão definidos, porque em alguns momentos do projeto fala que o Poder Executivo vai definir, mas por várias vezes a gente sabe que tem que passar pelo Legislativo através de lei complementar.
No art. 116, há alguns termos aqui que são meio que novos, por exemplo, gabarito rodoviário, ou quando fala da edificação do espaço aéreo, da via metroviária e ferroviária equivalente ao seu gabarito respectivo. Acho que ainda fica um pouco no ar, não é? Tinha que dar também uma detalhada em relação a isso. Por exemplo, pode haver locais onde a altura máxima, considerando essa questão metroviária ou ferroviária permitida, seja menor do que o muro que está separando ali a linha de trem, por exemplo, não é?
Acho que a gente precisa dar uma detalhada em relação a essa questão de gabarito rodoviário e o espaço aéreo de via metroviária e ferroviária, até porque não depende só do município, não é? Existe uma dificuldade hoje na secretaria, na parte de licenciamento da secretaria de urbanismo, sobre quem dá esse licenciamento final nesses terrenos que não são particulares especificamente. Se o urbanismo pode “canetar”, passa por CET-Rio, por estado, por quem?
Acho que tinha que dar uma detalhada melhor nesse aspecto. E o art. 121, que fala “A concessão do direito de superfície poderá ser gratuita ou onerosa”, também eu não me aprofundei, mas para saber em que casos ela seria gratuita e em que casos seria onerosa. E para a audiência que vem, eu deixo mais observações sobre a segunda parte desse título todo. Então, são essas as minhas considerações.
Eu vou chamar alguns inscritos agora para fazer o uso da palavra. Começando pelo Senhor Mauro Salinas, representante da Funrio. Só para registrar aqui antes, Mauro, a gente tem alguns inscritos. Se não der tempo de todo mundo falar, eu lembro que na próxima audiência é o mesmo tema, aí a gente vai começar pelos inscritos que estão aqui e não vão conseguir falar hoje, em vez de começar pela Mesa falando.

O SR. MAURO SALINAS – Boa tarde a todos.
Eu vou retomar alguns temas das reuniões anteriores que não foram devidamente finalizados. Então, nesse sentido, a transversalidade nos temas do Plano Diretor, o próprio secretário, se não me engano, afirmou, e é fato, faz com que assuntos de grande importância aqui tratados nas reuniões anteriores vão e voltem. E, nesse sentido, lembro também o pronunciamento do professor Sérgio Magalhães, da FAU/UFRJ, que fez um apelo importante e grave aos vereadores e ao próprio Executivo: “Não construam nada em áreas não ocupadas”.
Lembro que o município já atingiu, e em muitas áreas já ultrapassou, a capacidade de suporte de seu território para novas ocupações. Edificar e adensar, mas de forma comedida nas áreas onde isto ainda é possível, ou seja, nas áreas onde há infraestrutura já instalada sem a necessidade de mobilizar investimentos que o poder público não teria condições de arcar. Entretanto, bairros como Zona Sul e Grande Tijuca não suportam mais adensamento. São bairros que estariam fora disso, isso é bom que se diga.
Nesse sentido, o Henrique foi muito preciso ao sugerir que os índices urbanísticos para esses bairros sejam rebaixados para que haja o estímulo, a ocupação das áreas adequadas para o adensamento, como os bairros da Central e da Leopoldina. O índice dos bairros da Zona Sul e da Tijuca, por exemplo, podiam baixar para até 2 ou 2,5. A ocupação de espaços vazios, sem infraestrutura de abastecimento de água, esgotamento sanitário, equipamento de saúde, educação, transporte e serviço, levam à criação de espaços sem cidadania, formando verdadeiros territórios inadministráveis para o poder público. A Valéria até tocou nesse ponto hoje.
Outro pronunciamento importante foi da assessora parlamentar Rose Compans, profunda conhecedora da matéria que envolve o planejamento territorial urbano. Ela foi precisa ao apontar a vulnerabilidade das encostas para o adensamento urbano acima da Cota 100, região que já apresenta legislação específica exatamente pelo seu elevado grau de fragilidade ambiental. A grande vulnerabilidade das encostas da cidade é tão flagrante que os cuidados já observados no Decreto nº 322 para sua proteção, em vez de serem flexibilizados como estão sendo no atual Plano Diretor, deveriam ser estendidos, inclusive para as cotas acima de 60 metros.
As conclusões da colaboração da SMAC para os estudos do PEU Joá, lá nos idos de 2010, corroboram um alerta de Rose. As conclusões apontaram para esta região encostas instáveis com gradientes críticos que não suportariam sequer um grupamento com número mínimo de pequenas edificações sem que tal intervenção gerasse danos e riscos ambientais significativos para a região.
Quero lembrar que a Estrada do Joá situa-se abaixo da cota 100, entre as cotas 60 e 100. Além do risco que isso representa para o conjunto fisiográfico das encostas do município, tais intervenções degradam o maior ativo da Cidade do Rio de Janeiro, que é a sua natureza e paisagem.
Flexibilizar parâmetros urbanísticos para o adensamento das ocupações nas encostas aumenta criticamente o passivo ambiental da cidade, que transforma paisagem, sua razão de ser. Ainda nessa linha da transversalidade dos temas, eu gostaria de reforçar a importância da preservação e ampliação das áreas agrícolas, que ganham dimensão estratégica no planejamento territorial da cidade.
Em todo o mundo, em todas as economias e, principalmente, nos países centrais, desenvolvidos, há um entendimento de que áreas agrícolas são vitais na composição do uso do território, inclusive nos domínios territoriais urbanos, em suas áreas de influência imediata.
O valor intrínseco das áreas agrícolas para as populações, para a segurança alimentar e para a sociedade ultrapassa, em larga margem, o sentido da comparação economicista pura e simples entre a atividade agrícola e os demais setores da economia. E, a partir dessa certeza e dessa compreensão, não faz sentido comparar o valor financeiro agregado entre o produto agrícola e um bem durável, ou seja, comparar o valor agregado de um quilo de feijão com o valor agregado de um celular não faz o menor sentido.
Digo isso porque muitos alegam que o valor da terra para o uso agrícola não pode competir com o valor da terra para uso residencial ou de serviços. E não pode mesmo! Não pode e não deve! E para isso é que existe o estado: para disciplinar essa questão. É função básica e indelegável do estado, da Prefeitura, agir nesse sentido. É assim no mundo inteiro nos locais onde a Administração Pública protege o território e cuida do abastecimento alimentar da população. Não há espaço protegido, nem população adequadamente assistida sem a definição de uma política agrícola séria para o território.
O Município do Rio não pode fugir de sua missão de promover e garantir a política agrícola em um território. Isso começa na definição do zoneamento, garantindo os espaços agrícolas e para a expansão agrícola, assim como a formulação de parâmetros adequados para a ocupação desses espaços.
O Plano Diretor é claro em seus princípios, objetivos e diretrizes ao indicar as áreas potenciais para expansão agrícola como estratégicas e, portanto, fundamentais para o planejamento territorial. Entretanto, essas áreas foram ignoradas no zoneamento do município. Surpreendentemente, áreas com potencial agrícola e, portanto, destinadas à expansão dessa atividade, aparecem no mapa do zoneamento com indicação de uso residencial urbano, com lotes variando de 360 m² a 125 m² e taxas de ocupação de até 70% do lote, numa inversão total dos princípios, objetivos e diretivos do plano, permitido a expansão da malha urbana sobre uma área destinada exatamente a sua contenção.
Reforço que áreas agrícolas, no caso de Santa Cruz, Campo Grande e Guaratiba, existem não para competir com outros setores da economia na região, como o imobiliário e o de serviço, por exemplo; mas para garantir o abastecimento da população com melhor custo e com melhor qualidade, assim como a segurança alimentar e a ocupação racional e equilibrada do território – função básica e indelegável da administração municipal.
Essa questão grave do território agrícola tem que ser revista no Plano Diretor. Isso é um pedido da sociedade aos vereadores e ao próprio Poder Executivo, como já demonstrado em várias intervenções de seus representantes ao longo da série de audiências públicas.
Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Mauro.
Antes de passar de passar, a Valéria gostaria de fazer algumas observações sobre as falas...

A SRA. VALÉRIA HAZAN – Bom, eu agradeço a oportunidade de falar novamente. Na verdade, são muitas questões que eu acho que carecem de um debate mais ampliado para a próxima semana. Mas eu queria, como é um assunto anterior, só responder ao Mauro Salinas.
Primeiro, sobre as áreas agrícolas, a agricultura tem uma política própria. Somos defensores – e quando eu digo que somos, não sou só eu, é a equipe toda da SMPU, da Secretaria de Agricultura e, principalmente, o Secretário Fajardo. – e por isso nós expandimos as zonas agrícolas nesta proposta do Plano Diretor em área equivalente a três bairros da Urca.
Essas áreas estão sendo acrescidas em zonas agrícolas nessa proposta. Além disso, a agricultura está presente em todos os títulos. Inclusive, está prevista a participação do Conselho Rural junto com o Conselho de Planejamento Urbano, lá no Título VI. Do Título I ao Título VI, nós temos a agricultura ampliada, reverberada em todos os aspectos e sendo permitidas práticas agrícolas em qualquer lugar da cidade, coexistindo com qualquer tipo de uso e em qualquer andar da edificação. Isso está escrito em todos os títulos, mas, como é uma história que se desenrola, tem que ler a história inteira. Mas em termos de zoneamento, foram acrescentados mais “três bairros da Urca” em zonas agrícolas.
Outro ponto que é fundamental – e eu já expliquei para a Rose, em particular – mas eu não posso de deixar de mencionar aqui sobre a preservação total das zonas acima da cota 100. Todas as áreas acima da Cota 100 permanecem íntegras, como elas têm que ser, como Zonas de Conservação Ambiental 1, mas quais nada é permitido, apenas a conservação ambiental.
Todas as regras que estão no Decreto 322, abaixo da Cota 100, elas surgem como Zona de Conservação Ambiental 2, com os parâmetros preservados, mantidos e somente transcritos para a nova linguagem. Isso é um aprofundamento que pode ser apresentado nas audiências sobre a o zoneamento urbano, mas a Mariana Barroso, que é a Coordenadora de Planejamento Local, me solicitou especificamente que a gente deixasse isso bem claro aqui, e está sendo tudo preservado.
Portanto, quando eu falei de algumas unidades de conservação, foi só uma figura de linguagem. Está tudo mantido e preservado tal como é, foi tudo revisado pela equipe da Secretaria de Meio Ambiente para que não houvesse problemas de entendimento.
Muito obrigada.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Valéria.
Com a palavra, o Vereador Chico Alencar para fazer uso da palavra.

A SRA. VEREADORA TAINÁ DE PAULA – Presidente, Vereador Chico Alencar, permita-me apenas uma breve intervenção?

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Contando com o consentimento do nobre Vereador Chico Alencar, passo a palavra para nobre Vereadora Tainá de Paula.

A SRA. VEREADORA TAINÁ DE PAULA – Valéria, desculpe por chamar assim, de Valéria, mas acho que a gente tem intimidade para isso.
Na verdade, a preocupação dos produtores vai além do imposto, que eu acho que é um debate de fundo que a gente pode retomar no zoneamento, mas impacta diretamente no acesso aos financiamentos e aos subsídios que são muito específicos. A linha de financiamento dos produtores rurais necessita da demarcação como terra agrícola. Eu acho que essa é uma ponderação que a gente precisa avançar nesse sentido, aqui no Rio de Janeiro.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Vereador Chico Alencar, com a palavra.

O SR. MAURO SALINAS – Senhor Presidente, posso fazer um comentário, por favor?

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Pois não. Pode usar o microfone.

O SR. VEREADOR CHICO ALENCAR – Ele vai me dar uma aparte prévio...

O SR. MAURO SALINAS – Valéria, com relação às áreas com potencial agrícola, eu não as vi mapeadas no zoneamento. Elas não estão lá. E os espaços vazios destinados para essa expansão foram parametrizados para a ocupação residencial. É isso.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) –Com a palavra, o nobre Vereador Chico Alencar.

O SR. VEREADOR CHICO ALENCAR – Pois não, gente. Olha, instigando vocês que vêm a essas audiências públicas e trazem contribuições riquíssimas, porque a tarefa final de elaborar o Plano é desta Câmara, quero dizer que a gente precisa muito da contribuição de vocês. Eu vou citar alguns pontos em que o projeto original precisa ser muito melhorado, aperfeiçoado. Vou citar os pontos positivos também.
Essa outorga onerosa do direito de construir, inclusive com esse coeficiente de aproveitamento básico, ou menor que um, para o município todo. Isso é muito positivo, e a gente tem que garantir isso. Ponto dois, que também considero muito importante, aliás, a outorga onerosa já é praticada em alguns municípios, não é? E arrecada também, para quem só tem a preocupação com esse aspecto, até nesse quesito é importante.
O IPTU progressivo é um baita desafio ao longo do tempo. Isso pressupõe um levantamento sério de tudo que existe de terreno ocioso. Não é o terreno pequenininho ou o imóvel que está, ali, como o único meio até de uma família sobreviver; mas há espaços urbanos subutilizados que têm que ser levantados, notificados e, em último caso, desapropriados. O poder público tem que ter essa coragem de enfrentar a especulação que reproduz a desordem na cidade, essa é a grande desordem da cidade.
Outro elemento positivo que o plano enuncia, e precisa ser mais detalhado, é o termo territorial coletivo, que também é um bom instrumento. Agora, há pontos que estão aqui ainda obscuros e indefinidos, e a contribuição da sociedade organizada, que tem acesso a essa discussão, que não é nem a maioria ainda, precisa ficar atenta.
A operação urbana simplificada, ela, inclusive através de estudos da nossa equipe, do mandato do Tarcísio, que é o representante do PSOL nesta Comissão do Plano Diretor, temem muito que seja uma instituição do lobby urbanístico. Os de sempre, não é? A gente precisa avançar nessa direção para conter essa possibilidade.
A transferência do direito de construir está muito genérica no texto. Precisa ser detalhada também, vocês têm que trazer. E a concessão urbanística, que pode significar a negação de princípios do próprio plano. Por fim, há cinco fundos previstos, mas não o que seria muito importante, o da mobilidade urbana, e com algumas coisas complicadas.
Por exemplo, o Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano fala da destinação para implantação de projetos estratégicos na macrozona de estruturação urbana. O que serão projetos estratégicos? Depende da concepção de cidade, depende das forças que a gente quer contemplar.
A cidade é de todo mundo, inclusive dos batalhadores do trabalho do comércio ambulante, tão excluídos. A cidade é desigual e ela reproduz a desigualdade. E reproduzir a desigualdade é agravá-la.
Então, ou o Plano Diretor entende a cidade como um corpo vivo pulsante, onde todos, sem exceção, e não só os donos do capital e da propriedade imobiliária têm direitos ou então vai ser mais do mesmo. Que bom que a gente continua na quinta que vem. Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Vereador Chico Alencar. Convido a senhora Viviane Santos, defensora pública do Núcleo de Terra da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro.

A SRA. VIVIANE SANTOS – Bom dia a todas e todos, cumprimento a Mesa na pessoa do vereador e demais. Primeiro, eu queria pontuar uma questão importante que apareceu na fala e que foi muito bem elucidada pelo Vereador Tarcísio, que a gente precisa destacar: a realização de moradia formal em condições adequadas para a população ainda é uma realidade muito distante para a maior parte.
Dessa forma, os grupos mais fragilizados socialmente, as famílias pobres, moram onde é possível morar, onde as condições lhe permitem e não se afigurando uma escolha, mas, sim, a falta de outras opções, diante de um cenário tão desigual. Então, a gente precisa ter essa diretriz para a gente poder pensar na configuração de Plano Diretor que a gente quer.
E também queria ressaltar a preocupação do Núcleo de Terras e Habitação, que vem sendo apresentada desde dezembro de 2020, quando iniciaram os debates e o retorno dos espaços de discussão do Plano Diretor, que se refere à participação popular. Nós encaminhamos, inclusive, um ofício para essa comissão especial, e temos essa preocupação de garantir a efetiva participação popular, e não ficar apenas um espaço em que nós falamos para nós mesmos, e a população não tem oportunidade, de fato, de opinar. Por conta disso, seria importante a gente pensar na metodologia e na dinâmica que vai ser adotada nas audiências públicas territoriais para que, efetivamente, essa comunicação chegue à população, para que elas possam opinar.
Tem alguns pontos importantes que eu gostaria de trazer, eu vou tentar ser o mais breve possível, por conta do horário. Eu acho que o primeiro é sobre a questão da outorga onerosa, que já foi muito bem apresentada aqui. E aí, eu gostaria de lembrar uma questão importante, porque apesar do art. 99 não trazer percentuais destinados à questão da outorga onerosa, a gente gostaria de lembrar que a proposta inicial, inclusive apresentada pelos movimentos sociais e que foi discutida em um dos grupos de trabalho, era que a outorga onerosa tivesse o coeficiente de 100% destinado para Fundo de Habitação de Interesse Soc
ial.
Não foi uma proposta que foi acatada, mas houve um consenso, e isso é importante que fique enumerado aqui: que houve esse consenso dentro do grupo de trabalho de que seriam 50% destinados ao Fundo de Habitação de Interesse Social, e isso, infelizmente, não se mostra presente no projeto de lei que foi encaminhado para esta Casa, mas é uma importante consideração que eu acho que os vereadores deveriam ter acesso.
A Valéria também falou sobre a questão das Aeis, e nós entendemos que é essencial que haja uma apresentação dos mapas tanto das Aeis como das áreas consolidadas, para a gente poder aprofundar essa discussão. E eu aqui aproveito para destacar que na próxima audiência pública a gente já pretende fazer uma reapresentação do mapeamento que foi a proposta que nós apresentamos sobre as Aeis nos grupos de trabalho, e também gostaria de destacar que todas as nossas propostas de Aeis relacionadas à região central foram rejeitadas em bloco, na época das poucas discussões sobre a questão do Reviver Centro. É importante que se saliente isso, e é inadmissível que a gente pense que na região central, com tantas ocupações, não haja demarcação de Aeis.
Além disso, é importante destacar que tanto o Reviver como uma proposta do novo Plano Diretor trazem as preocupações da redução do déficit habitacional e a oferta de moradia para diferentes faixas de renda, que eu acho que é um consenso aqui de necessidade desse enfrentamento. Mas como que a gente vai pensar em combater o déficit sem que haja uma atuação do poder público para dar proteção a essas famílias da região central que, como bem o Pedro Duarte destacou, ficam sem segurança jurídica, sem implementação de mecanismo de reconhecimento de suas realidades.
Na primeira audiência pública, na qual se debateu o capítulo que tratava das diretrizes, objetivos, observou-se um consenso no sentido de se buscar melhoria das realidades das famílias vulneráveis, e entendemos que a demarcação de Aeis é um importante instrumento que deve ser adotado também na região central. Se temos na proposta do Plano Diretor um princípio que sempre é muito dito aqui, inclusive pelo Secretário Fajardo, da acessibilidade, na caminhada de 15 minutos, não existe melhor local para a gente garantir isso que não seja o Centro do Rio.
Esta Câmara também aprovou, é importante que se lembre de dois importantes projetos de Aeis, que foram propostas que partiram dos movimentos sociais: recentemente, o Horto e Indiana – e em 2020, também, tivemos a aprovação da Aeis da comunidade Trapicheiros. E, então, por conta disso, na região central, onde eu gostaria de concentrar minha fala, a gente precisa pensar nessa demarcação, porque senão a gente vai ter um reviver como a gente sabe, um “reviver de centro” para todos ou vai ser um “reviver de centro” para poucos.
É essencial que a Prefeitura incorpore essas áreas aprovadas por esta Câmara, em sua realidade. Para fechar, além dessa questão das Aeis, da questão da outorga onerosa, do Fundo de Habitação de Interesse Social, a gente também gostaria de destacar que é uma preocupação enorme, e será possível debater isso no momento adequado, relativo à enumeração e a forma como os ciclos foram apresentados dentro do projeto de lei porque, se existe uma preocupação voltada para não remoção das favelas, que está prevista no art. 7º, como diretriz, que não tem uma redação clara, quando você vai para o enfrentamento dos instrumentos que vão ser necessários para regular uso e ocupação do solo na Cidade do Rio de Janeiro.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Dra. Viviane.
Convido Lucas Falhauber, do CAU, para fazer uso da palavra.


O SR. LUCAS FALHAUBER – Boa tarde.
Eu já fui contemplado por algumas falas, mas vou só comentar umas pequenas coisas. Foi importante a apresentação dos mapas, a rápida avaliação que a Secretaria fez no começo da apresentação – aí, eu queria resgatar algumas expressões que foram feitas sobre desordem e que o Plano vigente não saiu do papel. Acho que a apresentação deixou muito claro que não foi muito bem isso que aconteceu. O Plano vigente ordenou o território, planejou para crescer para aquelas áreas, tanto que os índices propostos para Campo Grande e Recreio são os mais elevados e são as áreas que mais cresceram nos últimos anos.
É preciso reverter esse sistema – e reverter esse sistema não é simplesmente botar índices ainda mais altos na AP-3. É importante reduzir os índices que estão no Plano Diretor vigente. Para isso, eu acho que é importante, até o Ibam apresentou o Mapa dos Coeficientes por Macrozonas, mas é muito importante a sociedade ter clareza sobre os índices propostos para a Cidade de forma mais refinada, até porque aquele mapa não representa exatamente a realidade, é uma leitura simplificada. Eu dei o exemplo da área da Barra da Tijuca e arredores, o índice não é dois, o índice são outros estipulados no plano-piloto das décadas de 60 e 70. É importante ter essas informações de forma mais clara.
A questão da Aeis foi muito contemplada pela defensora pública, tem uma Câmara Técnica instalada no Compur para isso. Tem um limbo jurídico, porque tem um artigo que diz que todas as Aeis vigentes permanecerão, ao mesmo tempo revoga-se uma série de leis que instituem a Aeis. É muito importante que o Plano Diretor faça também um mapa para consolidar quais são as Áreas de Especial Interesse Social do Município.
A questão dos fundos, muitos vereadores já trataram. Há concordância em que é importante a vinculação desses recursos e eu queria recuperar, como representante do Conselho de Arquitetura, que esteja presente nos grupos de elaboração desse capítulo dos instrumentos. O texto pactuado entre a sociedade e a Secretaria, que foi para minuta naquele momento, era que os recursos da outorga onerosa iriam 50% para o Fundo Municipal de Habitação e Interesse Social e 50% para o Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano. Esse era o texto que estava na minuta anterior, ele foi alterado para o texto enviado à Câmara. Isso, senhores, é importante ser colocado.
Por último, uma pergunta: nas minutas anteriores tinha uma questão sobre cota de solidariedade? Aí, não sei, confesso que não achei como está sendo acordado nessa nova versão do Plano Diretor.
Obrigado.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Lucas.
Temos no máximo 10 minutos para fechar e estamos com três inscritos aqui, a Tarcyla Fidalgo, o Manoel Ribeiro e a Rose Compans. Eu vou chamar agora Tarcyla Fidalgo do Observatório das Metrópoles.

A SRA. TARCYLA FIDALGO – Boa tarde a todos e todas, eu agradeço pela oportunidade da fala, quero cumprimentar todos os vereadores, todos os integrantes da sociedade civil, todos os que nos acompanham, on-line ou no Plenário da Câmara. Dado o nosso tempo muito restrito e respeitando o direito de fala dos colegas, eu gostaria de comunicar ao Presidente que vou encaminhar um documento com as observações do Instituto Brasileiro de Direito Urbanístico sobre o capítulo que estamos discutindo hoje.
Teria alguns pontos para tratar. Eu só queria destacar um ponto que ainda não foi levantado ainda aqui, e que a gente pode aprofundar na próxima semana, já como apontamento, que é a questão do direito de superfície que vem sendo regulamentado pelo Plano Diretor de uma maneira um pouco confusa, misturando a regulamentação dada pelo Estatuto da Cidade, pelo Código Civil, o que pode implicar que esse instrumento seja inaplicável na prática.
Acho que a gente precisa discutir, vou fazer algumas considerações para consertar de alguma maneira, no âmbito da Câmara de Vereadores, esse instituto, para que ele possa ser aplicado, pois é muito importante. Enfim, mas eu vou aprofundar isso na minha fala na próxima semana.
Eu gostaria desde já de solicitar ao Presidente Rafael que eu possa fazer uma apresentação na próxima semana sobre o Termo Territorial Coletivo, que é um dos instrumentos que faz parte dos capítulos que vêm sendo discutidos, ele é um instrumento complexo, mas ele se mostra, na verdade, como uma grande oportunidade para o Rio de Janeiro se colocar na vanguarda nacional no sentido da aplicação de um instrumento internacionalmente bem sucedido.
Nós temos aqui o Professor Martim Smolka que conhece esse modelo, e é uma oportunidade muito grande para o Rio de Janeiro seguir o caminho de São João de Meriti, município vizinho que já aprovou o termo territorial coletivo no seu Plano Diretor. Então, eu gostaria muito de fazer essa apresentação, na semana que vem, para que eu tenha um pouco mais de tempo para explorar esse instrumento, respeitando, é claro, agora, a fala dos meus colegas nestes minutos que restam.
Fico por aqui, comunicando o envio desse documento e solicitando fazer essa apresentação para que a gente possa discutir um pouco mais esse instrumento especificamente na próxima semana.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Tarcyla, já está registrado. Na semana que vem, a gente começa pela fala do Executivo, depois a do Ibam. Logo a seguir, a primeira fala já vai ser a sua, com a sua apresentação de cerca de 15 minutos, mais a fala que você quiser fazer a respeito do direito de superfície. Certo?

A SRA. TARCYLA FIDALGO – Certo. Eu agradeço, Presidente.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado.
Convido o Senhor Manoel Ribeiro, do IAB.

O SR. MANOEL RIBEIRO – Obrigado. Eu vou ser extremamente breve, acho que dois minutinhos bastam. No trabalho em que a gente está colaborando, eu acho absolutamente extraordinário, não só pelo seu porte, importância e complexidade, mas, sobretudo, porque envolve uma ampla participação de técnicos, acadêmicos e representantes dos interesses das populações do nosso município.
É um trabalho que abarca princípios, objetivos, diretrizes e aí é que pega; instrumentos que devem proporcionar ações efetivas sobre os diversos recortes territoriais estabelecidos em diversas escalas, de modo a poder implementar esses princípios, objetivos e diretrizes. Como um integrante da representação do IAB, quero deixar como colaboração não uma ou duas sugestões pontuais, prefiro oferecer uma proposta de processo.
Já vi propostas muito boas de instrumentos urbanísticos serem mutiladas em suas regulamentações, em geral por decreto; ou pior: nunca serem regulamentadas e, portanto, tornarem-se inócuas, como a Valéria apontou e a Tainá também mencionou, no momento em que disse que o Plano Diretor não é para se constituir apenas num bloco de folhas de papel.
O processo que propõe agora visa a levar esses instrumentos a um grau de detalhamento que prescinda de regulamentações posteriores, tornando-os autoaplicáveis e efetivos. A fala do Henrique, do Ibam, quando acordou detalhes e buscou coerência dentro das diretrizes, em instrumentos, reforça essa visão. Também a palavra do Vereador Tarcísio Motta, que busca vincular recursos da outorga onerosa a determinadas finalidades, está – vamos dizer – dentro desse contexto.
Eu proponho que se criem grupos de trabalho que abordem individualmente cada instrumento com a colaboração do IAB e de outras entidades representativas, inclusive desta Casa, interessadas no dinamismo econômico, na criatividade cultural, na equidade social e nas possibilidades de participação popular na construção conjunta de uma cidade mais justa e segura para todos.
Esses grupos de trabalho não devem se isolar: é preciso que eles dialoguem entre si, estabeleçam correlações entre os instrumentos em pauta, de modo a facilitar a sua compreensão e aplicação. É preciso lembrar que esses instrumentos são as ferramentas que vão construir a cidade idealizada pelos princípios e diretrizes estabelecidas nesse documento. Eu acho que esse será o grande desafio que hoje iniciamos o enfrentamento.
Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Senhor Manoel Ribeiro.
Convido a Senhora Rose Compans para fazer uso da palavra.

A SRA. ROSE COMPANS – Boa tarde a todos, eu vou ser bem breve.
Mais uma vez, parabenizando, na figura do Presidente Rafael Aloisio Freitas, pela iniciativa da Comissão e saudando a todos os que estão aqui até essa hora, não é? Quase duas horas da tarde, para discutir um tema tão importante.
Queria também enfatizar que eu estou representando o gabinete do Vereador Lindbergh Farias e queria já manifestar o nosso apoio incondicional ao instrumento da concessão onerosa do direito de construir.
É um instrumento que o Rio de Janeiro, desde o Plano Diretor de 1992 já propôs. O Rio foi pioneiro muito antes do estatuto da cidade. Só que tinha outro nome, chamava-se Solo Criado e sempre esbarrou no trauma do setor imobiliário, que sempre teve essa tese de que isso ia frear o setor imobiliário.
Hoje, nós já temos a experiência de vários municípios, como São Paulo, só que pelo contrário. Por quê? Porque a retensão especulativa da terra urbana é um elemento anticapitalista. Ela dificulta a vida do setor imobiliário, ela encarece a produção imobiliária. Então, a outorga onerosa do direito de construir, na verdade, vem facilitar, assim como o IPTU Progressivo, o parcelamento compulsório – aí, dialogando com o Vereador Pedro Duarte, que nós também apoiaremos, porque entendemos que são instrumentos importantes para disponibilizar terra. E disponibilizar terra a um preço acessível é fundamental para o setor imobiliário.
Nós discordamos de um princípio que está dentro da fala da Prefeitura e que está no Plano Diretor, qual seja, que o adensamento deve ocorrer nas áreas infraestruturadas, sem que tenha havido qualquer diagnóstico sobre o grau de capacidade dessa infraestrutura. Uma das diretrizes do Plano Diretor vigente, e que foi do Plano Diretor de 92, é que o adensamento tem que se dar em função da capacidade de suporte da infraestrutura urbana. Isso não está sendo observado, não tem nenhum diagnóstico.
Eu moro no Humaitá. Botafogo é um inferno hora de saída de escola, o trânsito, horário do rush. Botafogo, Copacabana, Jardim Botânico e Tijuca são áreas que todos nós sabemos que o sistema viário já está saturado. Nosso investimento de metrô é mínimo para uma cidade do porte do Rio de Janeiro.
A gente considera que esse princípio não pode ser abandonado, do adensamento em função da capacidade do suporte, e o que a Prefeitura faz? A Prefeitura aumenta o potencial construtivo para ter a outorga onerosa. Nós consideramos que é justa a outorga onerosa, pois ela é um instrumento de justiça social, porque ela capta uma parte da valorização que foi acrescida ao terreno, em função dos investimentos públicos.
Ou seja, é o dinheiro da coletividade que, através da outorga onerosa, vai voltar para a coletividade. Mas nós achamos que ela também tem que ser um instrumento de planejamento. Quando a gente acha que ela pode ser um instrumento de planejamento, isso significa ela ser direcionada e contribuir com o direcionamento para as áreas em que a Prefeitura considera que existe uma infraestrutura ociosa, não é? Instalada, que está ociosa, e que são passíveis de adensamento, que é a macrozona incentivada.
Nós achamos que, através da isenção, o coeficiente básico 1 de aproveitamento, ok. Mas naquelas áreas que consideramos que, através de planejamento, nós queremos adensar, como a área da Leopoldina e a área central, em que existe capacidade de suporte da infraestrutura urbana, através da isenção dessa taxação, como foi pensado no Plano de 1992, nós criamos um diferencial de rentabilidade que vai induzir o setor imobiliário para essas áreas.
O setor imobiliário com índice 1 e com índices estratosféricos, como já foi colocado aqui... Gente, índice 9 na Zona Leopoldina é quadriplicar o índice atual do potencial construtivo. Índice 7 na AP-2 é duplicar porque hoje o Índice de Aproveitamento do Terreno (IAT) da Zona Sul é de 3,5; e vai passar para 7 em alguns logradouros. Isso é duplicar áreas que estão saturadas. Isso depois de 210 prédios em Copacabana e Ipanema que foram dados pelo Reviver Centro, prédios com 12 pavimentos.
A gente acha que tem que ter uma análise da capacidade da infraestrutura urbana, e que tem, através da isenção, o poder, a outorga onerosa, de direcionar o setor imobiliário para aquelas áreas que a gente acha que, sim, são áreas adensáveis, é interessante, é próximo do Centro, são 15 minutos, e que, por essa razão, são áreas que devem ser oferecidas a elas um diferencial de rentabilidade, porque o setor imobiliário vai atrás da rentabilidade. Já falei isso na última audiência.
Para o setor imobiliário, não adianta ficar dando índices loucamente. Eles vão para onde existe a maior taxa de retorno do negócio imobiliário. E a maior taxa de retorno do negócio imobiliário é a Zona Sul, disparado, muito mais do que na Zona Norte, muito mais do que na Barra da Tijuca. Então, se nós damos índices estratosféricos para o setor imobiliário na Zona Sul, eles vão continuar na Zona Sul e nada vai acontecer.
Pode botar índice 40 que alguns vão se aproveitar disso e vão fazer clusters; vão fazer enclaves, condomínios como o que foi feito na Penha, o Viva Penha, Clube Penha, que são enclaves territoriais na Penha, que descaracterizam completamente, é a Barra da Tijuca na Penha. Mas a maioria do setor imobiliário vai continuar no que chama de filé mignon, porque o valor geral de venda do empreendimento na Zona Sul é muitas vezes superior ao valor do empreendimento na Zona Norte ou mesmo na Barra da Tijuca. Então, não vai adiantar nada, vai apenas estragar a cidade. Vai complicar ainda mais o sistema viário, que já é caótico nessa região, e não vai resolver nada, como não resolveu o Plano Diretor de 2011.
Então, é essa a contribuição que queríamos dar em relação a esse instrumento que nós apoiamos. Na semana que vem, a gente quer falar de Relatório de Impacto de Vizinhança e de Zonas de Especial Interesse Social, que nós consideramos também instrumentos importantíssimos, que apoiamos para o Plano Diretor.
Obrigada. Desculpem-se eu me alonguei.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Rose. Antes de encerrar, para as considerações finais, Valéria Hazan.

A SRA. VALÉRIA HAZAN – Agradeço. Preciso somente fazer um esclarecimento à fala da Rose: Rose, os coeficientes de aproveitamento máximo, os que vão vigorar mediante outorga onerosa na Zona Sul não foram ampliados em relação à legislação em vigor. Portanto, toda Zona Sul permanece com coeficiente de aproveitamento máximo 3,5, só que mediante cobrança; não existe coeficiente 7 na Zona Sul. Isso tem que ficar muito claro. Os coeficientes estão muito bem detalhados no Anexo 22.
Esse é um ponto que eu tenho que deixar muito claro para evitar mal-entendido como foi o da Cota 100 na semana passada. Enfim, a gente tem que deixar isso bem claro. A gente entende, mas os outros também têm que entender. Portanto, não se propõe aumento de coeficiente de aproveitamento na Zona Sul. Os coeficientes de adensamento estão concentrados, de forma ampliada, apenas na região da Zona Norte e no entorno da Avenida Brasil.
Outro ponto, rapidamente: esclarecer o Estudo de Impacto de Vizinhança e o Relatório de Impacto de Vizinhança (EIV/RIV). Acho fundamental explicar isso. O EIV/RIV está sendo trabalhado por uma comissão do Compur, com participação da sociedade civil. Nós estamos acompanhando isso. É um grupo de trabalho coordenado pela Maíra Barroso. Ele está detalhado no Plano Diretor no Título V, porque ele se relaciona diretamente com o uso e ocupação do solo. Ele ficou deslocado no Título V, porque ele se relaciona diretamente com uso e ocupação do solo, ele ficou deslocado no Título III, por isso ele foi passado para lá.
O último esclarecimento é para o Lucas. O Lucas falou das AISs, as AISs que existem hoje pelos planos de estruturação urbana, elas estão previstas no art. 464, nas Disposições Transitórias, que será feito um grupo de trabalho constituído, que vai ter o prazo de 360 dias para delimitar e mapear essas AISs dos PEUs que estão sendo extintos. Portanto, o Plano Diretor já explica que todas permanecem e esse mapeamento vai ser feito por esse grupo de trabalho já com prazo definido aqui no art. 464.
Eram só esses esclarecimentos, o resto o Secretário Fajardo, na semana que vem trará para o debate. Agradeço a todos pela participação, pela oportunidade de esclarecer um pouco mais aqui o Plano.
Muito obrigada. Boa tarde.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Obrigado, Valéria.
Acho que hoje a gente finaliza a primeira parte desse Título. Semana que vem, a gente continua e... Informe, Tainá? Você tem 30 segundos.

A SRA. VEREADORA TAINÁ DE PAULA – Serão 30 segundos.
Nós disponibilizaremos nas redes do Plano Diretor o Fórum de Acompanhamento do Plano Diretor, onde todas as entidades, organizações da sociedade civil poderão colocar as suas contribuições para além, claro, da Audiência Pública, dos veículos normais.
Nós estamos nos conveniando ao Instituto Lincoln, estabelecendo um curso, que inauguraremos em junho.

O SR. PRESIDENTE (RAFAEL ALOISIO FREITAS) – Perfeito.
Obrigado, boa tarde a todos. Agradeço a Assessoria da Câmara mais uma vez por nos ajudar aqui na Audiência de hoje.
Está encerrada a Audiência Pública.

(Encerra-se a Audiência Pública às 13h55)
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Data de Publicação: 03/25/2022

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